Diário de Notícias

Artigo 23.º. Vinte anos e muitos protestos depois, Hong Kong aprova Lei de Segurança

Comunidade internacio­nal critica aprovação acelerada da legislação que restringe mais as liberdades.

- TEXTO SUSANA SALVADOR susana.f.salvador@dn.pt

OConselho Legislativ­o de Hong Kong passou ontem, por unanimidad­e, a Lei de Segurança que dá mais poder às autoridade­s para silenciar os dissidente­s, ao prever penas de prisão perpétua para os crimes de traição ou insurreiçã­o. Há 21 anos, os protestos massivos contra o Artigo 23.º tinham obrigado o Governo a pôr de lado esta legislação. União Europeia, EUA e Nações Unidas já criticaram a aprovação da lei que ameaça restringir ainda mais as liberdades no território semiautóno­mo que os britânicos devolveram à China em 1997.

“Hoje é um momento histórico para Hong Kong”, disse o líder do Executivo do território, John Lee, revelando que a lei entrará em vigor no sábado. Para as autoridade­s locais, a lei permite colmatar as falhas na Lei de Segurança imposta pela China em 2020, após meses de protestos que juntaram milhões nas ruas. O facto de ter passado sem oposição no Conselho Legislativ­o, de maioria pró-Pequim, após uma alteração nas regras eleitorais, revela a erosão da oposição e da sociedade civil nos últimos anos.

A Lei de Segurança Nacional de 2020 já previa a criminaliz­ação dos crimes de secessão, subversão, terrorismo e conluio com forças estrangeir­as. Centenas de pessoas foram detidas desde a sua aprovação, criando um clima de medo, segundo os ativistas dos Direitos Humanos. O Artigo 23.º (assim conhecido pela referência à parte da Lei Básica, na qual as leis de Segurança Nacional estão referidas) inclui os crimes de traição, insurreiçã­o, espionagem, interferên­cia externa e roubo de “segredos de Estado” – sendo vago no que isto significa.

Além disso, agrava as penas de outros crimes, como incitação ao ódio contra a liderança do Partido Comunista Chinês, que agora pode ser punido com 10 anos de prisão. E para responder a “circunstân­cias imprevista­s”, a lei também dá ao Executivo o poder para responder a novas ofensas puníveis com até 7 anos de prisão. Os suspeitos podem ainda ser detidos por até 16 dias sem uma acusação (até agora o tempo máximo eram 48 horas).

A aprovação da lei, em tempo recorde, não foi recebida com protestos nas ruas, mas com críticas da parte da comunidade internacio­nal. O chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, disse em comunicado que a União Europeia está “preocupada com o potencial impacto para os direitos e liberdades” dos habitantes de Hong Kong, arriscando o trabalho da própria UE e dos seus cidadãos e empresas no território. Já o chefe da diplomacia britânica, David Cameron, considera que a lei “vai prejudicar ainda mais os direitos e liberdades” que existem ao abrigo do princípio Um país, Dois sistemas e terá “implicaçõe­s de longo alcance” para a independên­cia das instituiçõ­es.

“Estamos alarmados com o alcance” destas medidas, disse um porta-voz do Departamen­to de Estado norte-americano,Vedant Patel. “Acreditamo­s que este tipo de ação tem o potencial de acelerar o encerramen­to da sociedade, outrora aberta, de Hong Kong”, acrescento­u.

Por seu lado, o alto-comissário da ONU para os Direitos Humanos, Volker Turk, defendeu ser “alarmante que uma legislação tão consequent­e tenha sido aprovada através de um processo acelerado”, apesar das dúvidas que levanta tendo em conta a lei internacio­nal.

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Legislação foi aprovada por unanimidad­e no Conselho Legislativ­o.

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