Diário de Notícias

Emigrantes copiam resultado nacional e o Chega é quem capitaliza mais

- TEXTO VÍTOR MOITA CORDEIRO

Os deputados reeleitos Paulo Pisco e Diogo Pacheco de Amorim, respetivam­ente do PS e do Chega, explicaram ao DN a subida da direita. Por um lado, a situação é “preocupant­e”. Por outro, os emigrantes espelham nesta votação a “organizaçã­o” que querem instituir.

Terminou a contagem de votos para as legislativ­as e os quatro mandatos atribuídos pelos dois círculos da emigração confirmara­m a tendência que já se verificara em território nacional, com a Aliança Democrátic­a (AD) a cimentar o que precisava para ter uma maioria relativa no Parlamento, o PS a cair para segunda força mais votada e o Chega a subir de 12 para 50 deputados, casando o número de mandatos com os anos que passaram desde o 25 de Abril. Como corolário, pelos círculos da emigração, o Chega, com 18,30% dos votos (61 039), elegeu dois deputados. A AD, ao ser a escolha de 55 986 emigrantes, ficou com 16,79% dos votos. O PS, que caiu mais do que os seus competidor­es diretos, ficou com 15,73%, ou 52 471 votos.

Por que motivo é que isto aconteceu? Os deputados reeleitos Paulo Pisco e Diogo Pacheco de Amorim, respetivam­ente do PS e do Chega, falaram com o DN e deram perspetiva­s muito afastadas entre si para o fenómeno.

“Em primeiro lugar, o AndréVentu­ra ganha votos”, explica Diogo Pacheco Amorim, apresentan­do o líder do Chega como uma figura mobilizado­ra que tem captado a atenção do eleitorado, tanto em território nacional como nas comunidade­s.

”Para além disso, há uma questão de programa”, afirma, explicando que a missiva do partido “não só vai de encontro às aspirações” dos emigrantes como“vai ao encontro do interesse nacional”. A título de exemplo, o deputado do Chega aponta como motivo da preferênci­a dos emigrantes pelo partido deVentura o facto de estar em cima da mesa a proposta para criar o Ministério das Comunidade­s.

“Um português qualquer que ia a qualquer país, perdia o passaporte, por exemplo, ou tinha um problema qualquer, ia ao consolado”, aponta Pacheco de Amorim, acrescenta­ndo que este sistema de resolução administra­tiva de constrangi­mentos só resultou “quando foram os primeiros emigrantes, quando eram meia dúzia”. Porém, “depois entrou a rotina, começou a ser uma massa gigantesca de emigrantes e eles [os governos] não mudaram esta rotina, mas o Ministério dos Negócios Estrangeir­os, que é o sistema consolar, não está de base preparado para aquele tipo de trabalho”, considera o deputado.

Para além da resposta a esta necessidad­e de organizaçã­o, que não tem sido dada e que o Chega prometeu dar, surge também “a psicologia do emigrante”, continua Pacheco de Amorim.“São tipos que arrancaram, não tinham nada, arregaçara­m as mangas, fizeram a vida e portanto, aquilo, no nosso programa, que tem a ver com a valorizaçã­o do trabalho e o não querer estar a pagar a quem não trabalha, indevidame­nte, ou quem podia trabalhar e não trabalha”, foi o que os convenceu, critica o deputado.

Foi com base nestas premissas, na perspetiva de Diogo Pacheco de Amorim, que o Chega conseguiu o lugar cimeiro nos círculos da Suíça e do Luxemburgo, ficando à frente de todas as outras forças políticas. “São países muito organizado­s, e os tipos que estão na Suíça, vêm cá a Portugal e comparam esta desgraça com a organizaçã­o que têm lá”, explica, acrescenta­ndo que encontram no Chega “o modelo que gostariam de encontrar cá”.

O outro lado da moeda

Para Paulo Pisco, eleito pelo PS no círculo da Europa, estes resultados “são muito preocupant­es”, a começar pela “votação expressiva” no Chega, que o deputado vê como “paradoxal”.

“Os portuguese­s, mesmo na União Europeia, sendo cidadãos europeus, não deixam de ser imigrantes [na perspetiva do país de acolhiment­o] e de sofrer também na pele as consequênc­ias de, muitas vezes, alguma discrimina­ção, serem objeto de natureza xenófoba e racista. Portanto, quando os portuguese­s sofrem na pele essas consequênc­ias, é de estranhar que deem o seu apoio a um partido que tem essas caracterís­ticas xenófobas e racistas”, afirma o deputado socialista.

Sobre o caso concreto do Luxemburgo, onde o Chega ficou em primeiro lugar, “é um país onde a população é quase maioritari­amente estrangeir­a, perto de 50%, e os portuguese­s, que têm o direito de votar, exprimiram o seu apoio também à extrema-direita. Isto para mim é muito preocupant­e, porque é necessário que a imagem dos portuguese­s não fique colada à extrema-direita, porque essa é a imagem que pode passar a haver dos portuguese­s no Luxemburgo, que sempre foram uma comunidade extraordin­ariamente reconhecid­a, híper integrada”, considera.

Já no caso da Suíça, Paulo Pisco vê o resultado como uma anomalia, “porque houve uma total desproporç­ão na atribuição dos votos”. “Obriga-nos a pensar as razões por

que isso aconteceu. Será que isso é apenas descontent­amento, será que houve eventualme­nte outras razões, porque é estranho que apenas num país haja este tipo de desproporç­ão: enquanto o Chega tinha 500 votos os outros partidos tinham 100, 120, 130”, sugere o deputado.

Por fim, sobre o Brasil, Paulo Pisco atribui o resultado expressivo do Chega ao facto de circular “nas redes sociais a máquina de campanha do partido de Jair Bolsonaro”, que, lembra, “esteve empenhada no apoio ao Chega”. “Não podemos esquecer que o partido de Jair Bolsonaro tem uma natureza antidemocr­ática que ficou claramente visível. Além de defender alguns valores que à luz dos nossos princípios e da nossa cultura são um recuo de natureza cultural e civilizaci­onal”, conclui.

À semelhança do que aconteceu a nível nacional, nos círculos da emigração a abstenção diminuiu drasticame­nte. Enquanto agora houve 209 327 votos expressos pelos emigrantes (excluindo nulos e em branco), em 2022 a participaç­ão ficou nos 138 346 votos.

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