I Liga é onde mais treinadores são despedidos entre os principais campeonatos
Esta época já houve 10 saídas de técnicos e na última década houve 120 mudanças. José Pereira, líder da Associação Nacional de Treinadores, não encara a situação com alarmismo.
Esta época já houve 10 mudanças de treinadores na I Liga, aparentemente todas justificadas com os maus resultados. Este número iguala o total de toda a temporada passada e, olhando para as mudanças nas últimas 10 épocas nos principais campeonatos europeus, o português é o que apresenta números mais elevados. Foram 120, à média exata de 12 por ano, seguindo-se Espanha (111, média de 11,1) e Itália (98, média de 9,8). Até ver, em 2023/2024 Itália e Espanha batem Portugal por pouco (11 saídas), com França a registar sete, a Alemanha seis e Inglaterra três.
O principal destaque é o V. Guimarães, que teve quatro treinadores nas primeiras oito jornadas da I Liga de 2023/2024, embora um deles tenha sido João Aroso, de forma interina, que acabou por deixar o clube por não ter aceite ser adjunto. Este carrossel vimaranense começou com a saída de Moreno Teixeira a 13 de agosto, dia em que apresentou a demissão depois da derrota no terreno do Estrela da Amadora, logo na 1.ª jornada, e da dolorosa eliminação na segunda pré-eliminatória da Liga Conferência, frente aos eslovenos do NK Celje. Foi então que Aroso pegou na equipa na vitória caseira sobre o Gil Vicente, numa altura em que o brasileiro Paulo Turra já estava no Minho para assumir a equipa... algo que só durou seis jogos, dos quais apenas venceu dois. Foi então rendido por Álvaro Pacheco, que tinha acabado de deixar o Estoril. Os vimaranenses estabilizaram a partir daí, ocupando atualmente o quinto lugar da I Liga, a apenas três pontos do rival Sp. Braga, que é quarto. O V. Guimarães é um caso particular neste século, pois já teve 26 treinadores, mais dois interinos, sendo que Rui Vitória foi o que mais tempo esteve no cargo, durante três épocas completas.
O Casa Pia também tem tido grande instabilidade no comando técnico, algo que até nem era normal, pois Filipe Martins aguentou 1168 dias no cargo, após um trabalho de assinalável sucesso, que incluiu uma subida de divisão e o tranquilo 10.º lugar na temporada passada. No entanto, pediu a demissão a 12 de novembro de 2023, quando a equipa estava em 15.º lugar, tendo sido rendido por Pedro Moreira, que só durou 87 dias no cargo, não resistindo a cinco jogos sem vencer, entre os quais uma goleada de 8-0 em Alvalade. Seguiu-se Gonçalo Santos, que começou com vitórias diante de Arouca e V. Guimarães, mas só somou um ponto nas últimas três rondas.
Até ao momento foram oito clubes que mudaram de treinador esta época, mas curiosamente os três grandes têm mostrado maior estabilidade, afinal Sérgio Conceição já vai na sétima temporada no comando do FC Porto e Rúben Amorim está na quarta época no Sporting, sendo que ainda fez as 11 jornadas finais de 2019/2020. No Benfica, Roger Schmidt cumpre a segunda época e, depois do título de campeão em 2022/2023, segue na segunda posição, a um ponto do líder Sporting, que tem uma partida a menos, sendo o único dos três que está envolvido em três competições: I Liga, Taça de Portugal e Liga Europa.
Na última década, o FC Porto é o “campeão da estabilidade” nos emblemas nacionais do escalão principal, período em que teve apenas quatro treinadores, com Julen Lopetegui, José Peseiro e Paulo Fonseca a antecederem Sérgio Conceição (Rui Barros foi treinador interino). Já o Benfica, apesar de só ter tido cinco nomes no cargo nos últimos 10 anos, dois deles – Jorge Jesus e Nélson Veríssimo (sempre como interino) – tiveram duas passagens, juntando-se a Rui Vitória, Bruno Lage e Roger Schmidt. Quanto ao Sporting, teve seis treinadores: Marco Silva, Jorge Jesus, José Peseiro, Marcel Keizer, Jorge Silas e Rúben Amorim (Tiago Fernandes e Leonel Pontes foram interinos).
Sem razões para alarme
José Pereira, presidente da Associação Nacional de Treinadores (ANTF), não olha para estes números com preocupação. “Como povo latino, os portugueses têm menos paciência e os dirigentes reagem aos maus resultados com essas trocas de treinadores. Gostaria que houvesse mais estabilidade, e estes dados demonstram alguma irresponsabilidade dos dirigentes, mas a verdade é que estas mudanças permitem muitas vezes o aparecimento de novos valores”, diz ao DN.
O líder da ANTF sublinha que “os principais prejudicados com estas constantes trocas são os clubes, pois não são certamente os presidentes ou outros dirigentes a pagar do seu bolso”. E lembra que “no final da época só um clube é campeão e apenas dois descem diretamente de divisão, mas os responsáveis dos clubes pensam sempre que mais vale mudar alguma coisa quando os resultados não aparecem, e, já se sabe, são sempre os treinadores a pagar, principalmente nos países latinos, como Portugal, Espanha e Itália”.
Ainda assim, destaca o facto de as chicotadas psicológicas estarem a diminuir em Portugal, comparativamente com um passado recente. E, na verdade, assim tem sido, pois em 2021/2022 registaram-se 12 trocas, houve 15 em 2020/2021 e 16 em 2019/2020. O recorde na última década foi em 2016/2017, com 19.
José Pereira tem consciência de que os treinadores continuarão a ser os primeiros a pagar quando os resultados não aparecem, mas realça que eles lidam bem com a situação. “É das profissões mais stressantes e poderá, inclusivamente, levar a alguns problemas de saúde, mas cada vez há mais candidatos nos cursos... Ao escolherem esta profissão, as pessoas sabem bem ao que vão.”