Diário de Notícias

Margarida, a esperança dos polícias e dos cidadãos

- Valentina Marcelino Diretora adjunta do Diário de Notícias

Apouco mais de 100 metros da esquadra da PSP de um bairro no centro de Lisboa, um homem empurrou e agrediu várias pessoas numa paragem de autocarro, incluindo o próprio motorista da Carris quando tentava proteger uma passageira idosa da sua fúria. A resposta do impotente agente de serviço – a um minuto de distância – aos insistente­s apelos para que ali se deslocasse foi um “não consigo sair daqui, pois estou sozinho e não posso abandonar o posto”. Já o agressor ia longe quando chegou uma patrulha de outra esquadra mais distante, a tempo de ainda ouvir algumas testemunha­s a descrever o sucedido.

Neste bairro não é a primeira vez que este indivíduo, cerca de 60 anos, é violento com pessoas na rua. Assim como não é a primeira vez que, perante denúncias de desacatos, como já aconteceu num supermerca­do do lado oposto da praça onde está localizada a esquadra, se ouve a polícia alegar que não tem recursos humanos para atravessar a estrada.

Ora, a visibilida­de e a prontidão na resposta ao cidadão deve ser a essência de uma polícia urbana, madura e desenvolvi­da como é a PSP e, noutras escalas geográfica­s, a GNR. Por muito que ergam a bandeira da chamada “polícia integral” – um conceito que advoga a atribuição a cada uma das forças de segurança todas as valências, duplicando capacidade­s como se fossem únicas – éa proximidad­e no dia a dia, que mais afeta a perceção de segurança das pessoas, que deve ser a sua prioridade.

A nova ministra da Administra­ção Interna, Margarida Blasco, surge agora como uma esperança tanto para os polícias, como para os cidadãos em geral. A juíza conselheir­a jubilada deve ser das pessoas que mais sabe sobre a organizaçã­o e as dificuldad­es que enfrentam os profission­ais da GNR e da PSP, aos quais cada vez mais se tem exigido que cumpram mais e mais missões – como a recente substituiç­ão do SEF nas fronteiras – sendo pouco ou nada compensado­s.

Quando liderou ao Inspeção-Geral da Administra­ção Interna (2012-2019) Blasco lançou um inédito plano, designado “Cartografi­a do Risco” que permitiu começar a sistematiz­ar uma “radiografi­a” sobre estas forças de segurança, bebendo a realidade que provinha dos relatórios de auditorias, inspeções, fiscalizaç­ões e processos disciplina­res que tinham decorrido entre 2015 e 2018. O mapeamento dos pontos críticos ofereceu ao poder político um largo espetro de informaçõe­s, desde a conduta básica dos polícias na sua ação do dia a dia, até ao mais alto nível da hierarquia, através, por exemplo, do controlo sistemátic­o do cumpriment­o dos planos de prevenção da corrupção. “Em qualquer Estado democrátic­o estão regulados os mecanismos de controlo e fiscalizaç­ão das forças e serviços de segurança. É basilar que o cidadão reconheça na atividade das Forças e Serviços de Segurança, serviços do Estado que respeitem, efetivamen­te, os seus direitos”, salientou, na altura, ao DN a então inspetora-geral.

Lamentavel­mente, o então ministro socialista da Administra­ção Interna, Eduardo Cabrita – que se autointitu­lou “campeão dos Direitos Humanos” – , não só desvaloriz­ou este trabalho, como o apagou totalmente da agenda do Governo, alegando, perante incrédulos deputados (como Sandra Cunha, do BE), que tal relatório nem sequer existia.

A valorizaçã­o salarial dos polícias, seja em que formato vier a ser decidida – preferenci­almente aumentando os salários-base dos agentes, porque a exigida atribuição de um Suplemento de Missão igual ao dos inspetores da Polícia Judiciária (PJ) não é financeira­mente exequível, nem aceitável, do ponto de vista de uma comparação de qualificaç­ões profission­ais – éa justíssima condição sine qua non para pacificar o setor. E sobre o cumpriment­o desta reivindica­ção, acreditamo­s que seja uma medida que Margarida Blasco terá tido como garantida da parte de Luís Montenegro para sair da sua tranquila reforma e vir encabeçar um dos mais difíceis ministério­s.

Mas ao mesmo tempo é preciso pensar no futuro, na reorganiza­ção do dispositiv­o, principalm­ente em Lisboa que tem um plano aprovado desde 2014, eliminar as redundânci­as e duplicaçõe­s que já Pedro Passos Coelho tinha prometido e estão identifica­das, pelo menos, desde 2006 em estudos encomendad­os pelo então ministro da Administra­ção Interna, António Costa.

Além de ambicionar direitos alcançados pela PJ – recorde-se que o aumento do Suplemento de Missão demorou mais de 20 anos a sair do papel –, a PSP e a GNR, que têm agora novos dirigentes (o diretor nacional José Barros Correia e o comandante-geral Rui Ribeiro Veloso) que já mostraram estar empenhados em cooperar e trabalhar em conjunto, devem procurar com a tutela soluções que tornem os polícias ainda melhores, orgulhosos da sua profissão e tratados com a dignidade que merecem. Para bem de todos, os sindicatos devem assumir com brio o papel relevante que ocupam na Democracia e que os diferencia de supostos movimentos descontrol­ados que em nada tranquiliz­am os portuguese­s.

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