Diário de Notícias

Já não existe desejo entre nós

- Rute Agulhas Psicóloga clínica e forense, terapeuta familiar e de casal

Esta é uma queixa recorrente por parte de muitos casais. No início era a paixão, pautada por um forte desejo sexual e romântico, intenso e excitante. O convívio frequente acaba, depois, por potenciar uma maior intimidade no casal, com vontade em manter a proximidad­e e em conhecer-se melhor a outra pessoa, aumentado a ligação emocional. E, para muitos casais, a relação evolui para um maior compromiss­o – deseja-se permanecer com o outro, partilhar sonhos e conquistas e manter um vínculo afetivo.

O tempo e a rotina e, por vezes, também alguma dose de desilusão face ao outro, podem levar ao desgaste da relação. Os parceiros sentem que a paixão murchou. Alguns sentem mesmo que resta apenas a amizade. Outros, pelo contrário, sentem que resta uma sensação de compromiss­o, mas sem intimidade… o que podemos chamar de “amor vazio”.

Para muitas pessoas, viver um “amor vazio” é manifestam­ente insuficien­te e gerador de uma enorme frustração. Mas é preciso investimen­to para conseguir alcançar – e manter – um amor companheir­o, com intimidade, amizade e compreensã­o mútua.

A intimidade e o desejo não nascem de geração espontânea.

Ser íntimo é pertencer ao mundo do outro, construind­o um espaço relacional seguro onde sentimos que tudo podemos partilhar. Um espaço relacional que apenas é possível com respeito pelo espaço do outro, permitindo a individual­idade de cada um dos parceiros. Falamos de uma relação que possibilit­e a novidade e a surpresa, ajudando a superar a monotonia e a rotina, tão frequentes nos relacionam­entos de longa duração.

E quando os parceiros sentem que a chama do desejo se extinguiu, é possível reacendê-la, com a ajuda preciosa da imaginação e da fantasia. Investir no tempo a dois (sem filhos, nem trabalho), escutar, tocar (e deixar-se tocar), dando asas à imaginação e à aventura e permitindo-se descobrir coisas novas são ingredient­es-chave neste processo de resgate do desejo extinto.

Pensemos, pois, nas relações amorosas como uma verdadeira aventura, inquieta e desassosse­gada, cheia de imprevisto­s, crises e resiliênci­a. Uma aventura onde é preciso nutrir e ser-se nutrido, cuidar e ser-se cuidado, surpreende­r e ser-se surpreendi­do, continuame­nte.

Pensemos, pois, nas relações amorosas como uma verdadeira aventura, inquieta e desassosse­gada, cheia de imprevisto­s, crises e resiliênci­a.”

 ?? ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal