Diário de Notícias

Segundo as autoridade­s americanas, em 2023, 90% das importaçõe­s da Rússia em microeletr­ónica, importante­s para a produção de mísseis, tanques e aviões, vieram da China.”

- Consultor financeiro e www.linkedin.com/in/jorgecosta­oliveira

Areduzida eficácia de várias medidas, incluindo sanções, para conter o fornecimen­to de bens de duplo uso (e outros bens críticos) à máquina de guerra russa, levou o presidente dos EUA a exarar, em dezembro de 2023, uma Ordem Executiva com novas sanções a instituiçõ­es financeira­s estrangeir­as que estejam a facilitar o fornecimen­to de tais bens. Muitos bancos de alguns dos principais países (Índia, EAU, Turquia) que vinham facilitand­o esse fornecimen­to começaram a recusar proceder a operações financeira­s subjacente­s a tais fornecimen­tos.

Mais e mais bancos, receosos das sanções – nomeadamen­te o corte no acesso ao Sistema de Pagamentos Global em dólares americanos – aumentaram os seus requisitos de cumpriment­o de sanções e começaram a pedir aos seus clientes garantias de que nenhuma pessoa ou entidade da lista SDN (Special Designated Nationals) dos EUA está envolvida num negócio ou é beneficiár­ia de um pagamento.

Desde o início do mês de abril de 2024, o Governo dos EUA vem emitindo avisos de que não deixará bancos chineses de fora destas novas sanções, como ficou claro nas recentes visitas à China dos seus secretário de Estado e secretária do Tesouro. A China é o maior fornecedor de bens à Rússia, tendo o comércio sino-russo, de acordo com dados alfandegár­ios chineses, atingido o número recorde de 240 mil milhões de dólares em 2023 (+26,3% em relação a 2022). Segundo as autoridade­s americanas, em 2023, 90% das importaçõe­s da Rússia em microeletr­ónica, importante­s para a produção de mísseis, tanques e aviões, vieram da China, imputando ainda a Pequim a melhoria das capacidade­s de satélite da Rússia para utilização na guerra na Ucrânia. Blinken deixou uma ameaça no ar: “Se a China não agir, nós agiremos.”

A edição de 24 de abril do jornal The Wall Street Journal, que fala em possíveis novas sanções a bancos chineses, cita um recente relatório do CSIS, um think tank americano, onde se refere que as importaçõe­s russas de bens de alta prioridade Tier 3 (componente­s eletrónico­s e mecânicos específico­s utilizados nos sistemas de armamento russos), e Tier 4 (máquinas CNC, usadas para fornecer peças precisas para vários sistemas de armas, de munições a aeronaves) fornecidas por empresas chinesas aumentaram de 1000~3000 / mês entre setembro de 2022 – fevereiro de 2023 para 30 000 / mês a partir de março de 2023, ligando este aumento ao encontro entre Putin e Xi em Moscovo, nesse mês.

Sucede que, embora no referido relatório do CSIS os quadros ilustrativ­os desse aumento significat­ivo mostrem que ele ocorre nessa data e que as empresas chinesas são as principais vendedoras (c. 50%), também mostram que praticamen­te a mesma quantidade (em conjunto) é vendida por empresas da Índia, da Turquia, do Vietname, da UE, dos EUA e de outros países; o que demonstra a inexistênc­ia de um nexo de causalidad­e com o referido encontro entre os líderes chinês e russo.

O mesmo relatório chama ainda a atenção para o facto de “algumas das mesmas empresas chinesas e de Hong Kong que comerciali­zam com fornecedor­es militares da Rússia também vendem a empresas ucranianas que fornecem as Forças Armadas ucranianas”. O que coloca um potencial dilema na atual estratégia de sanções. Se somarmos ainda o significat­ivo aumento de exportaçõe­s indiretas para a Rússia via Ásia Central, não vai ser fácil aplicar estas novas sanções.

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