Diário de Notícias - Dinheiro Vivo
As empresas querem investir
Vale a pena olhar com alguma atenção para os resultados do último inquérito levado a cabo pela CIP em parceria com o Marketing FutureCast Lab do ISCTE, que incidiu sobre a evolução da atividade das empresas em setembro e sobre as suas expectativas até ao final do ano. Estes resultados permitem-nos relativizar os sinais de recuperação económica que estamos a viver desde que, em abril/maio, foi atingido o pico da crise, em termos de queda da produção e das vendas.
Apesar dessa recuperação, que o Banco de Portugal estima ser mais marcada e rápida do que em crises anteriores, 56% das empresas inquiridas ainda reportaram quebras das vendas face a setembro de 2019, sendo que, nestas empresas, a redução média foi da ordem dos 36%.
Estes resultados vêm confirmar que a recuperação, para além de gradual e parcial, está a ser marcadamente heterogénea: se existem empresas que já atingiram o nível de atividade anterior à crise, muitas há que estão ainda muito longe de o alcançarem.
Quanto às perspetivas para os próximos meses, os resultados do inquérito não são particularmente otimistas, na linha, aliás, dos últimos indicadores do INE que mostram que a recuperação está a prosseguir, mas a um ritmo cada vez mais lento.
De facto, as expectativas das empresas – consistentes com a quebra observada nas encomendas em carteira – apontam para que a situação vivida em setembro se mantenha praticamente inalterada nos últimos três meses do ano.
No entanto, o que este inquérito nos revelou de mais interessante, até por permitir uma visão que escapa aos tradicionais indicadores estatísticos, foi o esforço considerável por parte das empresas, reagindo à adversidade e dando provas de resiliência.
Este esforço traduz-se, por exemplo, na abordagem de novos mercados e captação de novos clientes: 40% das empresas estão a vender a novos clientes, que representam já 14% das vendas dessas empresas.
De realçar também, apesar das perspetivas sombrias para os próximos meses, a atitude positiva das empresas face ao futuro, que se traduz no facto de 83% das respostas do inquérito indicarem a intenção de manter (ou mesmo aumentar) os recursos humanos e de 61% indicarem a intenção de manter (ou mesmo aumentar) o investimento, em 2021, face a 2019.
Esta postura proativa das empresas contrasta com a visão do governo que, ao mesmo tempo que desilude nos apoios à economia (aquém do necessário, para 77% das empresas inquiridas), justifica o foco no investimento público em detrimento do estímulo ao investimento privado por, supostamente, não se poder pedir ao setor privado que invista mais, numa conjuntura negativa.
A este argumento, é preciso responder que qualquer estratégia de recuperação económica só terá sucesso com base no investimento empresarial, devendo, por isso, acionar os instrumentos de política que criem condições propícias a esse investimento.
Mais do que uma vez, as empresas deram provas da sua resiliência em situações adversas. Ao invés de as menosprezar, potenciemos essa resiliência através de uma política económica adequada.