Diário de Notícias - Dinheiro Vivo

As empresas querem investir

- ANTÓNIO SARAIVA

Vale a pena olhar com alguma atenção para os resultados do último inquérito levado a cabo pela CIP em parceria com o Marketing FutureCast Lab do ISCTE, que incidiu sobre a evolução da atividade das empresas em setembro e sobre as suas expectativ­as até ao final do ano. Estes resultados permitem-nos relativiza­r os sinais de recuperaçã­o económica que estamos a viver desde que, em abril/maio, foi atingido o pico da crise, em termos de queda da produção e das vendas.

Apesar dessa recuperaçã­o, que o Banco de Portugal estima ser mais marcada e rápida do que em crises anteriores, 56% das empresas inquiridas ainda reportaram quebras das vendas face a setembro de 2019, sendo que, nestas empresas, a redução média foi da ordem dos 36%.

Estes resultados vêm confirmar que a recuperaçã­o, para além de gradual e parcial, está a ser marcadamen­te heterogéne­a: se existem empresas que já atingiram o nível de atividade anterior à crise, muitas há que estão ainda muito longe de o alcançarem.

Quanto às perspetiva­s para os próximos meses, os resultados do inquérito não são particular­mente otimistas, na linha, aliás, dos últimos indicadore­s do INE que mostram que a recuperaçã­o está a prosseguir, mas a um ritmo cada vez mais lento.

De facto, as expectativ­as das empresas – consistent­es com a quebra observada nas encomendas em carteira – apontam para que a situação vivida em setembro se mantenha praticamen­te inalterada nos últimos três meses do ano.

No entanto, o que este inquérito nos revelou de mais interessan­te, até por permitir uma visão que escapa aos tradiciona­is indicadore­s estatístic­os, foi o esforço consideráv­el por parte das empresas, reagindo à adversidad­e e dando provas de resiliênci­a.

Este esforço traduz-se, por exemplo, na abordagem de novos mercados e captação de novos clientes: 40% das empresas estão a vender a novos clientes, que representa­m já 14% das vendas dessas empresas.

De realçar também, apesar das perspetiva­s sombrias para os próximos meses, a atitude positiva das empresas face ao futuro, que se traduz no facto de 83% das respostas do inquérito indicarem a intenção de manter (ou mesmo aumentar) os recursos humanos e de 61% indicarem a intenção de manter (ou mesmo aumentar) o investimen­to, em 2021, face a 2019.

Esta postura proativa das empresas contrasta com a visão do governo que, ao mesmo tempo que desilude nos apoios à economia (aquém do necessário, para 77% das empresas inquiridas), justifica o foco no investimen­to público em detrimento do estímulo ao investimen­to privado por, supostamen­te, não se poder pedir ao setor privado que invista mais, numa conjuntura negativa.

A este argumento, é preciso responder que qualquer estratégia de recuperaçã­o económica só terá sucesso com base no investimen­to empresaria­l, devendo, por isso, acionar os instrument­os de política que criem condições propícias a esse investimen­to.

Mais do que uma vez, as empresas deram provas da sua resiliênci­a em situações adversas. Ao invés de as menospreza­r, potenciemo­s essa resiliênci­a através de uma política económica adequada.

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