Diário de Notícias - Dinheiro Vivo
Os desafios de uma região a precisar de mais investimento
Setúbal esteve em destaque em mais uma conferência da Ageas Seguros. As empresas revelaram como se reinventaram com a pandemia.
No passado, a península de Setúbal foi uma “zona extraordinariamente importante” para o país, logo atrás de Lisboa e Porto. Tinha capacidade para a criação de emprego e ali se instalaram grandes empresas. No presente, a realidade é outra, como destacou Rui Leão Martinho. O bastonário da Ordem dos Economistas referiu como Setúbal é uma região de grandes assimetrias e como a integração da região na área metropolitana de Lisboa acabou por lhe ser prejudicial. Ficou assim dado o mote para mais um debate do Fórum PME Global Ageas Seguros, em parceria com a Ordem dos Economistas. Setúbal foi o palco e a região em destaque.
Para Rui Leão Martinho é uma zona do país “que merece maior atenção”, recordando como é a quarta mais pobre, sendo que toda a península “representa 28% população total e apenas 9% do valor acrescentado bruto”. Acrescentou que esta situação implica que cerca de 150 mil pessoas se desloquem para a margem norte para trabalhar, o que traz custos económicos e ambientais, com consequências para a competitividade da zona.
O necessário maior desenvolvimento esbarra no acesso aos fundos comunitários. “Há um alerta da Associação Industrial da Península de
Setúbal para que se separe a península da área metropolitana de Lisboa, senão o país está a perder em cada quadro comunitário qualquer coisa como dois mil milhões de euros que não vão para esta região, porque efetivamente está na zona mais desenvolvida do país”.
Nuno Maia da Silva, diretor-geral da AISET - Associação Industrial da Península de Setúbal, reforçou precisamente a existência desse problema de acesso aos fundos, por fazer parte da área metropolitana de Lisboa desde 2013. Salientou a importância de a situação ser revertida (ver texto ao lado).
Filipe Cardoso, sócio-gerente da Quinta do Piloto - Vinhos, e Mário Ramos, CEO da Micromil, duas empresas da península de Setúbal, partilharam os desafios que enfrentam na sua atividade, nesta iniciativa da Ageas Seguros.
O primeiro contou como há uma forte aposta em manter a credibilidade do seu símbolo. A venda a granel cobre as despesas do dia a dia e é uma direção do negócio que há muito mantém. Contudo, um sonho antigo de Filipe Cardoso e de outros familiares, era ter uma marca própria, o que se veio concretizar em 2013. É uma produção mais pequena, não procurando ter os vinhos baratos que se encontram nas grandes superfícies. “Quisemos fazer algo diferente”, salientou, apostando na qualidade e não na quantidade.
A Micromil está numa fase de reinvenção na prestação de serviços para cuidados de saúde na área da imagiologia médica. O CEO, Mário Ramos, realçou como ao longo dos anos a empresa soube reinventar-se num mercado agora dominado por grupos empresariais com muitos consultórios.
No seu nicho de mercado, Mário Ramos explicou que um “fator de competitividade é apresentar soluções que os outros não são capazes de apresentar, mesmos os grandes”. “Eles falham na questão essencial que é o preço. Nós somos competitivos no preço, na versatilidade e numa solução que as marcas não conseguem, porque nós somos multimarca.
Referiu ainda que a empresa tem-se preparado para as ameaças do futuro: “A única constante que temos na empresa é reinventarmo-nos. Fizemos isso na última crise. Passámos de uma empresa de vendas para basicamente de serviços. Os novos desafios passam por servir os mercados mais pequenos que vão subsistindo”.
Abel Aguiar, diretor executivo para Parceiros e PME da Microsoft Portugal, falou de como é necessário a reinvenção em tempos de crise, como aquele que se vive atualmente devido à pandemia.
Para este responsável, estamos perante três fases. “A primeira foi a de resposta à covid-19, basicamente como ter as pessoas em casa de forma segura e garantindo que a empresa continuasse a funcionar”, disse. Contou que chegou a ser “constrangedor ver como as empresas tinham uma dependência da estrutura física de funcionamento”. Porém, considera que esta fase está ultrapassada.
A segunda fase, aquela que vivemos neste momento, é a de resposta, numa altura em que se regressou ao trabalho. “As empresas começaram a fazer a sua adaptação, mal ou bem, a nível do processo, a nível da relação com o cliente.” Esta é uma fase que poderá durar mais um ano, antes da “reimaginação”.
Ou seja, as empresas têm de reimaginar o negócio para ser competitivo quando houver um regresso a uma maior normalidade. “Quem fizer esse caminho agora, vai acelerar projetos e poupar dinheiro”, salientou, alertando que é necessário pensar na digitalização agora.
Abel Aguiar, diretor executivo da Microsoft Portugal; Filipe Cardoso, sócio-gerente da Quinta Piloto - Vinhos; Gustavo Barreto, diretor-geral de Distribuição e Marketing da Ageas Seguros e Mário Ramos, CEO da Micromil (da esq. para a dir.).2 José Gomes, CEO da Ageas Seguros.
Conferência mobilizou empresários locais.
Nuno Maia da Silva, diretor-geral da AISET.
Em tempo de pandemia, novos desafios colocaram-se às empresas. Umas vão suportando as dificuldades melhor do que outras, realçou Nuno Maia da Silva. O diretor-geral da AISET Associação Industrial da Península de Setúbal sublinhou que há empresas mais robustas que têm capacidade para aguentar meses de menor fulgor, mas que há outras que enfrentarão mais problemas.
“No nosso caso, estamos a falar de empresas industriais. As comerciais e de turismo acreditamos que estejam a passar por um mau bocado. As industriais têm alguma variedade”, começou por explicar. “A maior parte são exportadoras, dependerem muito da procura global. Esta arrefeceu no mundo inteiro. Há menos encomendas e um menor nível de produção. Mas as grandes empresas industriais são relativamente robustas e podem suportar durante alguns meses um período de exercício menos favorável”, assegurou ao Dinheiro Vivo.
Entre as que poderão ter maiores dificuldades, Nuno Maia da Silva destacou as que “são mais mono produto ou
que foi possível fazer em dois meses uma transformação digital que provavelmente só aconteceria em dois anos. Isso aconteceu pela necessidade, que foi uma grande impulsionadora desta transformação”, afirma Paula Panarra.
O debate contou com três especialistas do setor: David Afonso, vice-presidente da Primavera BSS, Marco Costa, CEO da UWU, e Rui Henriques, partner da EY. David Afonso entende que a digitalização e a inteligência artificial não vão roubar trabalho aos contabilistas mas antes lhes vão fornecer um mercado potencial, através das toneladas de dados que geram.
No quarto painel da Accounting Summit discutiram-se questões da fiscalidade e dos serviços financeiros. Para os especialistas, os fundos comunitários previstos para a recuperação da economia nacional poderão representar uma oportunidade para a profissão. Daniel Bessa, orador principal, entende que, em termos de contabilidade e fiscalidade, o pós-pandemia não trará grandes alterações, mas os milhões anunciados para apoiar a economia poderão representar uma oportunidade para as empresas de contabilidade. “A entrada desse dinheiro trará mais burocracia e trará mais corrupção seguramente; o essencial deste bolo irá para o Estado, e ficará muito pouco para as empresas. Mas ainda assim, as empresas vão precisar de muito apoio especializado para concorrer a esses fundos”, diz.
Pessoas são investimento