Diário de Notícias - Dinheiro Vivo

Portugal é o país com maior conflito entre patrões e sindicatos

- —MARIA CAETANO

Quase um terço dos empregador­es e representa­ntes dos trabalhado­res admite atritos e diz que o diálogo social tem pouco impacto na vida das empresas.

Portugal é, com uma larga margem e sem alterações nos últimos anos, o país do bloco europeu onde o diálogo social conhece mais atrito. Pelo menos, na perceção dos intervenie­ntes. Perto de um terço dos gestores das empresas e dos representa­ntes dos trabalhado­res considera ter más relações entre si, e manifesta ainda a opinião de que o diálogo que mantém pouca influência tem nas decisões tomadas nos locais de trabalho.

A indicação é dada pelo mais recente Inquérito Europeu às Empresas produzido pela Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho (Eurofound) e pelo Centro Europeu para o Desenvolvi­mento da Formação Profission­al (Cedefop). A publicação, que avaliou pela última vez as práticas dos locais de trabalho em 2013, volta a apontar os parceiros sociais portuguese­s como aqueles que têm as piores relações na União Europeia nos resultados de 2019, conhecidos no mês passado.

O inquérito do último ano encontra, para a generalida­de dos países da UE (com o Reino Unido ainda incluído na amostra, mas fora da média final), uma correlação entre a existência de estruturas de representa­ção dos trabalhado­res nas empresas e maiores níveis de bem-estar e também de desempenho.

Em termos médios, as empresas europeias evidenciam também um relacionam­ento moderadame­nte estreito com o diálogo social: em 29% dos casos há estruturas de representa­ções de trabalhado­res nas empresas, e em 28% as empresas estão vinculadas a organizaçõ­es patronais. A qualidade do diálogo, por outro lado, aparenta ser boa: 40% dos inquiridos reporta relações de confiança e com impacto; só 12% das partes nas empresas europeias inquiridas consideram que as relações são más.

Mas, neste retrato de médias, Portugal diverge bastante. A presença de estruturas representa­tivas de trabalhado­res nas empresas não vai além dos 4%, sendo a terceira mais baixa do bloco, apenas atrás de Grécia e Letónia. Já países como Finlândia, Suécia, França e Roménia dizem que mais de metade das empresas têm representa­ção de trabalhado­res.

“Na maioria das empresas, se não todas, do Chipre, República Checa, Malta, Portugal e Suécia que reportaram a presença de um órgão de representa­ção, trata-se de uma delegação sindical”, nota o estudo da Eurofound.

A participaç­ão em organizaçõ­es patronais é também baixa, mas bastante mais em linha com a média europeia. Quase um quarto dos gestores, 24%, procuram representa­ção no diálogo social através da confederaç­ão de interesses setoriais com outros empregador­es.

Só um quinto confia

O resultado da participaç­ão neste diálogo é que deixa a desejar, do ponto de vista dos inquiridos. Só um quinto deles confia no parceinas ro social. Em 21% dos casos a interação entre patrões e sindicatos é vista como sendo de confiança e influente nas decisões, aponta o estudo. Pelo contrário, para 30% são evidentes as más relações e também o fraco impacto do diálogo nas decisões que afetam a vida das empresas.

Portugal é, entre os 27, o país com a opinião mais negativa acerca do diálogo social, e a uma distância consideráv­el do segundo país menos otimista, a Bélgica, com 23% de opiniões negativas. No extremo oposto, estão Dinamarca, Roménia e Países Baixos, com apeanterio­r.

Apesar das más relações, o diálogo social mantém-se como o principal instrument­o para fixar salários no país.

2,3%, 3,9% e 4,1% de opiniões negativas, respetivam­ente.

Os resultados de 2019 vêm confirmar uma conflitual­idade manifesta entre os parceiros sociais portuguese­s já atestada no inquérito Há seis anos, Portugal era também o país da UE com mais inquiridos a considerar­em o diálogo social conflituos­o e limitado, numa percentage­m então ligeiramen­te acima dos 30%.

No entanto, as relações entre parceiros sociais portuguese­s são pouco marcadas por posições de força perante o fracasso negocial, como a realização de greves e outras ações coletivas. Só 1% dos inquiridos reportaram a existência destas iniciativa­s ao longo dos últimos três anos. Já o retrato médio europeu aponta 2% de ações coletivas, com França, Hungria e Luxemburgo a terem as percentage­ns mais elevadas do bloco europeu, nos 3%.

Mas, apesar de uma maior perceção de más relações e da baixa presença de representa­ções sindicais nas empresas inquiridas, o diálogo social mantém-se em Portugal como o principal instrument­o para fixar salários, nas opiniões do estudo. Mais de metade dos inquiridos nacionais, 56%, reportaram a fixação de salário em negociação coletiva, apenas ligeiramen­te abaixo da média de 60% nos 27.

O estudo do Cedefop e da Eurofound, a agência da UE onde estão representa­dos governos, empregador­es e sindicatos, foi realizado entre janeiro e julho do ano passado, e ouviu mais de 20 mil inquiridos em 27 países, a grande maioria dos quais gestores de empresas. Em Portugal, foram inquiridos 973 representa­ntes dos empregador­es e 17 representa­ntes dos trabalhado­res.

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FOTO: ANTÓNIO PEDRO SANTOS/LUSA Nas reuniões da concertaçã­o social procura-se o consenso entre patrões e sindicatos.
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