Diário de Notícias - Dinheiro Vivo

Nómada de carreira

- JOÃO COUTINHO North American Executive Creative Director na VMLY&R NY

Enquanto terminava o curso na universida­de, trabalhou em part-time como vendedor de produtos 3M para o ramo automóvel, na empresa do padrasto. Após terminar o curso de ciências de comunicaçã­o fez estágio na Ogilvy do Porto. Trabalhou como assistente de produção de filmes publicitár­ios. Entrou em videoclipe­s, foi ator (chegou a fazer de narcotrafi­cante sul-americano numa longa metragem realizada por John Malkovich). Foi roadie de bandas que vinham tocar aos Coliseus. Teve a sua própria banda. Escreveu um livro chamado O Poder Manipulado­r da Música Rock, publicado pela editora Chiado, que se encontra à venda na Fnac e noutras livrarias. Apresentou o livro no programa do Álvaro Costa na RTP. Trabalhou para a La Paz, quando a marca ainda dava os primeiros passos. Experiment­ou a construção civil para ajudar a pagar os estudos da filha na École Française. Pelo caminho, tirou um curso de segurança e outro curso de geriatria. Tomou conta de pessoas idosas. Um dos seus clientes, um senhor que estava acamado há muitos anos, voltou a andar (será que foi por causa da revista com material erótico que levou para a casa do cliente?). Há sete anos mudou-se para Londres e começou a trabalhar para o NHS (National Health Service). Lá, trabalhou com autistas e posteriorm­ente especializ­ou-se no acompanham­ento de pessoas tetraplégi­cas. O caos que a pandemia trouxe aos hospitais ingleses e o medo de apanhar covid-19, fizeram-no mudar de carreira mais uma vez. Neste verão comprou uma carrinha Mercedes Vito e desde então dedica-se à distribuiç­ão. A UPS é o seu maior cliente. O negócio corre tão bem que está neste momento a entrevista­r condutores para expandir a frota.

Sei que quando ler este texto o meu irmão vai ficar fulo comigo, porque certamente me esqueci de algum emprego. Como podem constatar, não existe pessoa mais bem preparada para encarar uma altura como a que estamos a viver do que o meu irmão. O Nuno nunca teve medo de nada e sempre fez o que lhe apeteceu. Às vezes diz-me que tem pena de não ter investido numa carreira estável como a minha. E eu pergunto: “O que é uma carreira estável e de que é isso nos vale numa altura destas?”

Em 2020 milhões de pessoas ficaram sem emprego, ficaram sem chão e sem saber o que fazer. Quem souber e não tiver receio de tocar diferentes instrument­os terá mais sucesso a sair desta. Este é o ano ideal para tomar decisões radicais. Por cada negócio que fecha, nasce uma nova oportunida­de. Pessoas como o meu irmão, homens e mulheres dos sete instrument­os, são uma inspiração para mim. A carreira nómada, é tão ou mais nobre do que outra carreira qualquer.

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