Correio da Manha - Domingo

SÃO AMERICANOS, VIVEM EM PORTUGAL E VOTAM TRUMP

Os republican­os não gostam de revelar em quem votam, ao contrário dos democratas. Fomos à procura de americanos residentes em Portugal que admitem admirar o polémico Donald Trump e querem vê-lo mais quatro anos na Casa Branca

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Amissão parecia mais fácil do que se revelou – mas não impossível: encontrar americanos residentes em Portugal apoiantes de Donald Trump, atual presidente e candidato às eleições do próximo dia 3 de novembro. “Normalment­e, os republican­os não gostam de dar entrevista­s. Só os democratas”, respondera­m-nos do American Club of Lisbon. “Sempre foram mais reservados em relação às intenções de voto do que os democratas”, disse-nos ainda uma fonte da Embaixada Americana em Portugal (o embaixador é republican­o e apoiante confesso de Trump, embora tenha invocado, através do seu gabinete de imprensa, um artigo do seu estatuto que não lhe permite falar de política). Há precisamen­te uma semana, Paulo Portas apresentou um estudo sobre quem não diz a verdade nas sondagens e que acaba por ir ao encontro destas reticência­s republican­as. Segundo uma análise recente, 11,7 por cento dos republican­os mente nas sondagens, contra 5,4 por cento dos democratas. Fá-lo por causa do estigma social, sobretudo quando falamos das camadas mais altas e com ensino superior. Poderá ter sido essa vergonha do eleitorado uma das razões para a surpresa que foi a eleição de Trump nas eleições de 2016, quando a maioria das sondagens apontava para uma esperada vitória de Hillary Clinton.

Nas redes sociais de americanos a viver em Portugal, em organizaçõ­es americanas por cá, em clubes variados a resposta foi, quase sempre, negativa. Houve quem se ofendesse (“Está a gozar comigo? A sua intenção é provocar-nos?”) e quem se apressasse a esclarecer: “Definitiva­mente, não sou um apoiante de Trump e também não conheço ninguém que seja”, garantiu Ken. “Não votei Trampa”, disse outro, aproveitan­do o apelido do polémico presidente para fazer uma graçola em português. Um outro expatriado dos Estados Unidos garantiu-nos que

Dizem que Trump tem excesso de peso, que é barulhento e um fala-barato, mas está a guiar o nosso país muito bem BARBARA FRIEDHOFF, 64 ANOS

apenas no Algarve haveria republican­os em Portugal e que pertenciam todos “àquela classe que vem gozar a reforma” à Europa, o que não é de todo a situação de Barbara Friedhoff. Está reformada – sim, está – mas vive em Portugal há 40 anos. A primeira vez que aterrou em Lisboa foi em 1980, por meio de um convite para tocar na Orquestra da Gulbenkian. Fazia 25 anos nesse dia. Depois de uma digressão que passou pela Índia e pela China, fez uma audição para primeira viola e ficou. “Aos 60 anos, quando me reformei, já não tinha vontade de voltar para os Estados Unidos”, conta Barbara, que se sente republican­a “desde os nove anos”. “Sou de uma grande família, a minha mãe teve cinco filhos, somos católicos praticante­s, tenho ideias conservado­ras. Mas se o presidente não é bom eu não voto republican­o. E o Trump é bom, ele é tudo de bom. Se ele fosse um maestro de uma orquestra eu seguia-o sem problemas”, garante a americana, nascida há 64 anos em Portland, uma cidade no estado do Oregon considerad­a um ponto focal do movimento antirracis­ta e da contracult­ura norte-americana.

“Trump sabe gerir a economia muito bem, o problema é que os democratas estão sempre a pôr obstáculos no caminho dele. A América nunca foi tão poderosa como nos primeiros três anos de presidênci­a de Donald Trump. As pessoas ganhavam mais, ele dava 9 mil dólares a cada pessoa em reembolso dos impostos; os negros tiveram mais empregos, muito mais do que com Obama, tanto que as pessoas de cor gostam dele”, diz, convicta, a violetista americana.

O marido, James Ross, um professor de inglês reformado, com quem casou há 20 anos (e que se mudou para Portugal por amor a Barbara depois de a pedir em casamento no Santuário de Fátima), partilha a mesma escolha eleitoral. “Acredito no Trump e não acredito nas fake news (notícias falsas) que o acusam de racismo e de ser um neonazi – a filha Ivanka e os netos dele são judeus! Também acho que ele fez um trabalho excelente na gestão da pandemia – se não fosse pela sua ação imediata, muitas mais pessoas teriam morrido”, acredita Ross, natural da mesma cidade onde a mulher nasceu e onde, em agosto, morreu um apoiante de Trump num confronto entre um grupo de apoiantes do presidente e manifestan­tes contra o racismo. “Detesto a falta de lei e ordem e o desrespeit­o pela polícia na minha cidade natal e apoio os esforços de Trump para restaurar a ordem”, continua o professor, que votou Trump em 2016. “Em assuntos como o ambiente, a defesa nacional, a imigração e outras eu estou muito mais de acordo com ele, embora nenhum desses temas seja uma questão moral absoluta. Boas pessoas podem concordar ou discordar da forma como se implementa­m, mas o direito à vida dos não nascidos, por outro lado, não é negociável. Nunca será lícito matar uma criança no útero – esta foi a primeira razão que me levou a votar Trump em 2016”.

“É mais do que religião, é a natureza humana”, continua a mulher, Barbara. “Não podes tirar uma criança do ventre da mãe, não podes matar os teus idosos, não podes misturar ciência e natureza para criar bebés em tubos de ensaio, não podes brincar a fazer de Deus. Estas coisas são realmente importante­s e Trump sabe isso. Os europeus adoram Obama, mas não sabem que ele disse ‘eu não quero que as minhas filhas sejam punidas com uma criança que não esperavam ter’. Isto só prova que aquele que era o comandante da nação acha que uma criança é um castigo”. Pouco depois de tomar posse, Trump proibiu o financiame­nto do governo federal às organizaçõ­es não-governamen­tais estrangeir­as que promovesse­m o aborto, revalidand­o uma medida da época do antigo presidente conservado­r Ronald Reagan. “Além disso, Trump também deu ao povo liberdade religiosa”, lembra, referindo-se a um decreto presidenci­al de 2017, com o objetivo de dar ao cidadão liberdade para obedecer à sua consciênci­a e à fé, acima de qualquer determinaç­ão legal.

“Sim, Obama falava bem, apresentav­a-se bem, é cool, é atraente… mas foi uma deceção. Trump é o oposto. Ele não tem bom aspeto, dizem que tem excesso de peso, que é barulhento e é um fala-barato, mas está a guiar o nosso país muito bem”, acrescenta Barbara. “O estilo dos seus discursos não é o de um político, mas ele é um homem de negócios e não mede as palavras. Ele não tem vícios de drogas, de tabaco ou de álcool e só dorme algumas horas por noite. Trabalha muito e impacienta-se com as pessoas à volta dele que não trabalham tanto”, elo

gia James. “Ele nunca pára de trabalhar em prol dos Estados Unidos e a única coisa que quer é que a América seja um bom país com toda a gente a trabalhar e feliz. Ele está a dar o máximo. Tem 74 anos e antes de morrer quer contribuir para o país. Ele não está a ganhar dinheiro, está a perder dinheiro e só recebe críticas vindas de todos os lados”, lamenta Barbara.

“O melhor deles todos”

Jorge Ávila é hoje tão americano quanto português. Quando o pai abalou em 1968 para a América, em busca de uma vida melhor do que a que tinha na ilha Terceira, nos Açores, a família foi com ele e por lá ficou. Jorge, a quem todos passaram a chamar George, tinha 13 anos e por lá fez toda a escolarida­de até começar a trabalhar. “Geri um escritório de advogados, um escritório médico, fui supervisor da Singer, tive uma empresa de construção, mas o negócio que tive mais tempo foi de restaurant­es italianos”, conta este apoiante confesso do presidente americano que encontrámo­s através do Clube de Golfe da Terceira. “Desde que me reformei passo seis meses em Portugal e seis meses na Flórida. Teve sorte em apanhar-me porque dia 30 voo de propósito para a América para ir votar em Donald Trump. Estou lá desde o Nixon e, de longe, o melhor deles todos é o Trump. Conseguiu a melhor situação económica da história americana: quatro meses depois de ser eleito, em 2016, já os centros comerciais estavam cheios de gente a comprar coisas. Ele foi o tipo que deu o maior aumento de salários ao povo americano. Com a redução de impostos que deu ao pessoal, tenho o marido de uma amiga minha, estivador, que leva para casa mais 300 dólares por semana. Dizem que ele é pelos ricos, mas 82 por cento da população beneficiou com tudo o que ele fez”, garante Jorge Ávila, de 65 anos, que começou por ser um imigrante na terra das oportunida­des antes de obter a dupla nacionalid­ade. “A frase correta do Trump é ‘eu não gosto de imigrantes ilegais criminosos’. Só que os média cortam a parte dos ‘criminosos’ e fica ‘eu não gosto de imigrantes’. Eu conheço umas moças que estão lá ilegais e dizem que com elas está tudo bem. O Trump também já recebeu um prémio por ter ajudado nas relações raciais [Ellis Island Award, em 1986, embora segundo a Associated Press tenha recebido a distinção por ter ajudado a desenvolve­r a cidade de Nova Iorque e não por ter ajudado jovens negros, como terá feito crer]. E também criminaliz­ou quem fala mal de gays: os gays gostam dele”. Jorge descreve o presidente que admira de uma forma peculiar, num sotaque que mistura o açoriano com o americano: “Ele leva uma estalada na cara e responde com um murro, é a sua maneira de ser e isso tem sido muito bom para os americanos”.

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Barbara Friedhoff está em Portugal há 40 anos e James Ross há 21. Já votaram Donald Trump em 2016 e agora tencionam repetir
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Jorge Ávila foi para a América na infância e desde que se reformou passa seis meses lá e seis meses cá. Dia 30 voa de propósito para votar em Donald Trump
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