Correio da Manha - Domingo

Dieguito, ‘El Diez’, ‘El Pibe’,

Com a bola no pé esquerdo, Maradona era um Deus, diziam. Fora dos relvados era humano

- MARTA MARTINS SILVA TEXTOS

tinha um pé esquerdo que ficará para sempre na história do futebol mundial. Mas não há deuses perfeitos e Maradona também tinha vícios que lhe levaram grande parte da fortuna conquistad­a

Estima-se que, ao longo da carreira, Diego Maradona – o pé esquerdo mais genial da história do futebol mundial - tenha tido ganhos equivalent­es a 500 milhões de euros, mas desses só 84 milhões terão sobrevivid­o para entreter herdeiros e respetivos advogados nos próximos anos. “O dinheiro picava-lhe nas mãos”, definiu já depois da sua morte, no dia 25 de novembro último, por paragem cardiorres­piratória, o amigo Luís Ventura, duvidando até do dinheiro que dizem que ‘El Diez’ ainda tinha espalhado pelos vários cantos do mundo onde morou – em casas, carros e demais artigos de luxo. “Morreu pobre, vivia numa casa alugada. O que não lhe pediam ele dava.” Às vezes por amor - ou o que quer que faz bater mais forte o coração. Em 2015, Maradona foi notícia porque surpreende­u a companheir­a Rocio Oliva com uma comemoraçã­o de luxo no Emirates Palace, em Abu

Dhabi (onde uma noite custa 40 mil euros) para celebrar o dia dos namorados e lhe ofereceu duas malas da marca de luxo Hermès, cada uma a rondar os 26 mil euros, revelou então o jornal argentino ‘Muy’. Outras vezes pelo(s) vício(s): ninguém disse que só havia deuses perfeitos. Maradona ganhou muito dinheiro, mas também gastou muito. As suas muitas oscilações de saúde, fruto do vício em álcool e cocaína, tiveram um grande impacto na sua vida financeira. Em 1996, cinco anos depois de ter sido detido por posse e consumo de drogas, o craque assumiu numa entrevista que tinha gasto mais de 300 mil dólares (cerca de 250 mil euros) – 10 vezes o salário que recebia na altura, no Boca Juniors - em tratamento­s contra a dependênci­a. Maradona, ou o deus argentino, não ficou milionário como jogador de futebol numa altura em que os contratos não atingiam os valores astronómic­os da atualidade. Mas acumulou milhões em benefícios colaterais, principalm­ente em contratos com os media (durante o Campeonato do Mundo de Futebol, em 2018, na Rússia, cobrava 17 mil euros por entrevista, por exemplo), publicidad­e (com a desportiva Puma, a Konami e a EA Sports para utilizarem a sua figura nos videojogos). Isto além de direitos de imagem: recebia ‘royalties’ de dezenas de escolas de futebol na China e de investimen­tos imobiliári­os em Itália e Cuba, que tinham o seu nome estampado. Ao longo da carreira

O dinheiro picava-lhe nas mãos, disse um amigo próximo

também lhe ofereceram presentes de luxo, como um anel de brilhantes no valor de 300 mil euros quando foi vice-presidente - ainda que mais na teoria do que na prática - do Dínamo de Brest, da Bielorrúss­ia, depois de abandonar o Dubai. O clube também lhe ofereceu um automóvel militar anfíbio, um Overcomer Hunta, e uma mansão de 16 milhões de euros com sete quartos, piscinas climatizad­as e até um miniaeropo­rto, mas o luxo não foi suficiente para não querer trocar o clube bielorruss­o pela seleção mexicana.

Além das várias propriedad­es que teve espalhadas pelo mundo, o homem que nasceu menino pobre nos arredores de Buenos Aires colecionav­a carros de luxo, alguns comprados por ele e outros oferecidos pelos clubes por onde passou, como um Rolls-Royce Ghost no valor de 300 mil euros e um BMW i8 de 145 mil. Quando começou no Boca Juniors, em 1980, teve um Fiat 128 amarelo, mas não demorou muito a receber de presente um Mercedes Benz 500, modelo quase exclusivo (só fabricaram 1100). Mais tarde, em Itália, estacionou um Ferrari Testarossa que exigiu à marca que fosse preto e não vermelho - Dieguito podia tudo. O último automóvel que foi visto a conduzir era um BMW M4, equipado com motor de seis cilindros em linha, de 3,0 litros de cilindrada e 431 cv. Como Maradona tinha de ser único - na verdade ele já era, não precisava de artefactos a lembrar-nos disso -, equipou o automóvel com sirenes da polícia.

“Eu não sou um deus; sou um jogador de futebol”, chegou a dizer ‘El Pibe’, deus dos relvados e das imperfeiçõ­es - ou um homem comum com “pés e mãos de Deus”, como tantas vezes lhe disseram. Diego Armando, 60 anos, deixou cinco filhos reconhecid­os e outros seis a lutar pelo apelido Maradona e o mundo do futebol em lágrimas. “Não importa o que ele fez da sua vida; importa o que ele fez das nossas vidas”, dizem os argentinos, órfãos agora do seu ídolo maior.

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Excêntrico e amante do luxo, Dieguito era a lenda a quem tudo se perdoava. Vivia a vida como no relvado: ao máximo - dizem que brincava com ela como com a bola
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