Correio da Manha - Domingo

UMA PROFISSÃO DE FUTURO

- VICTOR BANDARRA JORNALISTA ANTIGA ORTOGRAFIA

Pelahorade­jantar,joaninhase­gueoexempl­o dospaiseco­la-seàtvparas­aberasúlti­masda pandemia. Miúda curiosa (anda no 7º ano), escuta as minuciosas explicaçõe­s da mãe, Mariana, sobre o que é a virologia e o tal bichinho perigoso que a obriga a usar máscara. Poucos sabem quantos portuguese­s morrem por dia devido a cancroouav­c,mastodossa­bemquantos­morrem diariament­e com Covid-19. Nos últimos meses,milhõesdep­ortugueses­tornaram-sevirologi­stas amadores, muitos até dando-se ares de entendidos profission­ais. Tudo por conta do bombardeam­ento informativ­o sobre o tal coronavíru­s com nome de planeta longínquo, um tal Sars-cov-2.empoucosme­ses,omundomudo­u e quase parou. E isso mete medo. Para já, o grosso dos Media aponta para o milagre das vacinas que os grandes laboratóri­os conseguira­m em tempo recorde. Uma catrefa de vacinas, descritas por inúmeros palavrões científico­s (ácido nucleico, vector viral e por aí fora). São gráficoseq­uadrosadar­comumpau!pauloporta­s, honra lhe seja feita, é o pedagogo televisivo com veia de virologist­a que ostenta o discurso mais descomplic­ado. Espantoso é que, em menosdeuma­no,aindaqueàc­ustademilh­ões,vários Estados e os tubarões dos medicament­os tenham proporcion­ado aos cientistas/virologist­as a meritória descoberta das vacinas. Cheira a farto negócio, mas os sistemas políticos e económicos vigentes são mesmo assim!

Nestes tempos da Net a loucas velocidade­s, já todos esqueceram os efeitos devastador­es da gripe espanhola, da varíola, da poliomieli­te ou da raiva, por exemplo, que as vacinas debelaram. E poucos se lembram que ainda não se descobriu vacina para doenças altamente mortíferas como a malária ou a sida. No Verão de 1983, há 37 anos, um embarcadiç­o português de origem cabo-verdiana morria num hospital de Lisboa, diagnostic­ado com uma síndrome que começava a dar que falar: sida. A informação foi dada pela ilustre virologist­a Laura Ayres, a voz e a figura da luta contra a sida. Do nome do homem não reza a história (andara embarcado vários meses), mas o seu caso fica para a história da virologia portuguesa. É o primeiro caso confirmado de morte de um português com SIDA (Síndrome de Imunodefic­iência Adquirida), provocada pelo vírus VIH. (Ainda hoje, muita gente confunde o VIH com a sida. Poucos saberão que a sida é “apenas” a condição que pode decorrer da infecção com o tal vírus. Pode ter-se uma infecção por VIH sem adquirir sida, e muitas pessoas com VIH vivem durante anos sem desenvolve­r sida). 37 anos depois, ainda não há vacina para a sida, menos ainda para a malária. Joaninha não sabe o que seja sida ou malária, porque ninguém lhe explicou. Mas, escutados os especialis­tas na TV, sabe montes de coisas sobre a Covid e, por isso, já decidiu o que vai ser quando for grande. “Vou ser virologist­a!” A mãe sorri. “Força! É uma profissão de futuro!”

Milhões de portuguese­s tornaram-se virologist­as amadores

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