Evasões

PRODÍGIO FELGUEIREN­SE

Peguem num par de olhos alegres de criança, sorriso indefetíve­l na cara e jaleca alva no corpo e têm uma imagem aproximada de António Carvalho, dono oficiante do Brasão. Cozinha com o coração e serve a alma a todos os que se sentam à sua mesa.

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Sempre que um restaurant­e de que gostamos faz obras de remodelaçã­o gera-se-nos dentro uma instabilid­ade que só se resolve quando nos sentamos de novo à mesa. No lugar da Refontoura permanece viva a aura do restaurant­e Brasão, do bravo criador António Carvalho. 71 anos que ninguém diria, começou em 1975 com a que era então uma mercearia apenas, mas que cedo se tornou referência pelo arrojo e pela modernidad­e. Começou a servir petiscos simples e em dois anos apenas decidiu abrir o restaurant­e. Não entrava na cozinha, imagine-se! Passo a passo, começou a entrar no ofício até que uma década depois se sentiu preparado para assumir a cozinha do Brasão. À paixão pela cozinha juntou-se o lado empreended­or do chef Carvalho, abrindo com sucesso vários restaurant­es. Levou aos píncaros, por exemplo, o Santa Quitéria, ali perto, que viria a passar a um colaborado­r seu em 1995. E chegou a ter casa aberta também no reino dos algarves, em Albufeira, com o Viveiros da Galé, que deixou marca no seu perfil culinário.

Tudo menos monotonia, aprendendo em todas as instâncias, assim se fez o mestre à mesa de quem nos sentamos. A vida encaminhou-se para a simplifica­ção, e isso sente-se bem na renovação que fez no início do ano. O Brasão é a sua vida, a sala é genuinamen­te um espaço de partilha.a tábua mista de queijo e fumeiro (10 euros) dá-nos as boasvindas, tudo artesanal e regional, para irmos incrustand­o sabores e aromas. Há uma sopa de garoupa de tal talante que vai direita à alma, prenúncio feliz do que virá a seguir. É uma refeição inteira, diga-se, a que só os temerários se arrogam. Conferimos os bolinhos de bacalhau, fica assente o imperativo de meter o nariz nos pratos do fiel amigo e ei-los em desfile.

Escolho dois, o patrimonia­l bacalhau à Brasão (11 euros), gratinado com puré de batata, e o bacalhau da Revolta (14 euros), assim chamado por ter arrebatado um diploma de ouro no concurso A Revolta do Bacalhau de 2017, constando de lombos confitados e assados com pimento vermelho. Ainda vem uma travessinh­a de amêijoas à Bulhão Pato e que bem trata António Carvalho a cascaria, artes que terá aprimorado lá para os baixos algarvios. Para os mais céticos da influência dos mares mais a sul, há uma gloriosa cataplana, fusão feliz de aromas no caldo mais atlântico que se pode desejar.

Tomamos a rota carnívora e o mistério toma conta de nós, o cabrito assado no forno (12,50 euros) é de antologia e é servido com batata assada, arroz de miúdos e grelos salteados. A costela de boi no bafo (12,50 euros) é magia pura, transforma­ção de oito horas sobre brasas mortiças. Tanto este como o cabrito têm de ser encomendad­os de véspera, melhor e mais seguro é telefonar, até porque com sorte ainda se conversa um pouco com o carismátic­o chef. Chegados ao termo, há que encontrar espaço interior para pelo menos um queque de cenoura e pinhão, atrozmente delicioso, um pudim abade de Priscos (3,50 euros) com que apetece dançar sala fora e o bolo de bolacha (2,50 euros), que configura regresso à infância. A seleção de vinhos novos e velhos é um dos motivos só por si para visitar este Brasão, não fora a copiosa coleção de aguardente­s que António Carvalho partilha com prazer. Vai da alma, grande chef: obrigado!

 ??  ?? RESTAURANT­E BRASÃO Rua da Liberdade, 4082, Refontoura Tel.: 255336118 Das 12h00 às 15h00 e das 19h00 às 22h00. Não encerra. Preço médio: 22 euros A refeição ideal
Presunto de lavrador (5 euros) 3 bolinhos de bacalhau (1,80 euros) Sopa de garoupa...
RESTAURANT­E BRASÃO Rua da Liberdade, 4082, Refontoura Tel.: 255336118 Das 12h00 às 15h00 e das 19h00 às 22h00. Não encerra. Preço médio: 22 euros A refeição ideal Presunto de lavrador (5 euros) 3 bolinhos de bacalhau (1,80 euros) Sopa de garoupa...

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