Evasões

DEIXAR MARCA (E NÃO SER UMA)

- NORTE POR DORA MOTA

Quando as reuniões de trabalho da Evasões se fazem no Porto, habilitamo-nos a um par de coisas. Que nos chegue à Trindade um par de lisboetas augadíssim­os por francesinh­as e que o encantamen­to deles pela cidade nos faça olhá-la com outros olhos. E confirmar a nossa ternura. Quando olhamos todos os dias para as mesmas coisas, habituámo-nos a elas e parece que não as vemos. Esta semana, com o Tiago e o Filipe a fazer-me desfilar à laia de guia pelo Bonjardim abaixo, em busca da francesinh­a que os fez ir embora a planear o regresso, consegui derreter-me outra vez pela minha rua preferida do Porto. O Bonjardim encanta-me por mais do que uma razão, sendo que as pessoas que ali pertencem compõem talvez a mais forte. Nisso, o Bonjardim é uma boa amostra do que teorizo cada vez com mais convicção: o Porto é composto sobretudo pelos portuenses, os nativos e os que aqui passam o dia e contribuem para essa singular orquestra de humanidade. Cada fachada ou cada esquina que apontei aos meus colegas fez-me ocorrer uma história de alguém, ou um dito com graça. Uma cidade, por muito monumental que seja, pouco é sem as paixões, os enganos, as desilusões e as conquistas das pessoas que a fizeram. No Porto, parece-me que a marca humana de tudo é particular­mente intensa. Por isso não se pode narrar o Porto aos forasteiro­s sem lhes contar das suas pessoas. E é também por isso que, não sendo à partida contra o turismo ou contra esse direito de visitar outros lugares e conhecer outros modos de vida, sou contra o turismo que resulta da mercantili­zação da cidade – que deixou de ser a terra dos seus habitantes para ser uma marca. As cidades não devem ser marcas, devem deixar marcas. E os muito lisboetas Tiago e Filipe levaram a sua, nesta que foi uma das muitas vezes que vieram namorar o Porto.

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