CASTELO BRANCO
Há planícies douradas povoadas por oliveiras e pastos fartos onde o gado se demora, mas também encantadores jardins urbanos e museus que guardam arte e história. A proximidade entre campo e cidade é a desculpa ideal para um passeio por uma região onde não
Roteiro pela Beira Baixa autêntica com o azeite, o queijo e as artes a servirem de guia.
Quem entra pelos portões da HERDADE DA URGUEIRA, na aldeia fronteiriça de Perais, tem a ilusão de avistar uma ilha banhada pelo Tejo onde repousa um conjunto de casinhas brancas com rebordo amarelo. Em redor, o amarelo rasteiro da paisagem é tingido aqui e ali pelo verde das oliveiras que se estendem no terreno daquele que é «um dos primeiros empreendimentos de olivoturismo do país», assegura Carlos Lourenço, proprietário. A herdade fica no concelho de Vila Velha de Ródão, onde a produção de azeite é uma tradição secular, e tem sete apartamentos temáticos que percorrem as diversas fases da olivicultura.
Cada casinha foi batizada e decorada consoante cada etapa ou objeto utilizado no processo artesanal de cultivo da azeitona. Tudo começa na Poda, limpeza das oliveiras que abre caminho à sua floração, a chamada Oliva. Após o amadurecimento do fruto, segue-se a apanha da azeitona que cai no Panal, pano comprido de lona, linho ou serapilheira colocado sob a oliveira. A Joeira corresponde à separação da folha e da azeitona que antecede o transporte para a Tulha, estrutura onde fica antes ir para o Lagar para moagem. Finalmente, o azeite é guardado no Coiro, pote onde fica até ser vendido.
É precisamente a casa com o nome da fase final do processo que se destaca entre as várias tipologias disponíveis. O Coiro é o maior dos apartamentos e tem três quartos com camas duplas, sala, cozinha, casa de banho em suíte e outra comum. Além de ser um
espaço amplo e confortável, ideal para famílias, oferece vista privilegiada para a área envolvente. Salta à vista a roda de uma carroça que pende do teto, aludindo ao transporte do azeite, e os coiros que adornam a sala.
PROXIMIDADE COM A NATUREZA
Na Urgueira, o tempo parece abrandar e o alvoroço da cidade é uma imagem distante. O cenário convida à imersão na natureza sem pressas nem planos, mas não falta o que fazer para quem procura dias preenchidos. A extensão do terreno e a abundância de linhas de água possibilitam uma variedade de atividades, como passeios a cavalo, em BTT, de barco, gaivota ou canoa, bem como caça e pesca. A piscina embutida no terraço é ideal para um mergulho de sonho – haja calor. Sobressai a vista panorâmica sobre o lago e a paleta de amarelo e verde que se estende planície fora até Espanha, cuja fronteira fica a quatro quilómetros.
A «aproximação das pessoas à natureza» através do «contacto com a fauna e a flora» é a grande missão de Carlos Lourenço. Além de promover o olivoturismo, a propriedade serve o fabrico de queijo de marca própria. São duas mil ovelhas leiteiras que se alimentam dos pastos da exploração e que perfazem os «quarenta por cento de leite de produção própria laborado na queijaria» da família.
O queijo Lourenço faz parte da montra da PORTUGAL BY BEIRA BAIXA, marca que reúne uma série de produtos e produtores locais com o objetivo de alcançar o mercado internacional. Além dos queijos, estão disponíveis para venda enchidos, mel, compotas, licores e frutos secos e que, para já, podem ser adquiridos exclusivamente através do website.
OBSERVAÇÃO DE AVES NO TEJO
Os hóspedes podem acompanhar de perto as rotinas dos animais da herdade e, inclusive, assistir ao parto das ovelhas. O dia começa bem cedo na Urgueira e parte do rebanho regala-se com a abundância do pasto, procurando refugiar-se do Sol debaixo dos sobreiros.
NA HERDADE DA URGUEIRA FAZEM-SE PASSEIOS A CAVALO, DE BARCO OU BTT. E TAMBÉM HÁ UMA PISCINA PARA USAR.
AS PORTAS DE RÓDÃO SÃO UM PONTO OBRIGATÓRIO PARA A OBSERVAÇÃO DE AVES E TÊM A MAIOR COMUNIDADE DE GRIFOS DO PAÍS.
As restantes aguardam nos estábulos pela extração do leite que será enviado para a QUEIJARIA LOURENÇO & FILHOS, na zona industrial de Vila Velha de Ródão.
O leite é acondicionado e refrigerado nos tanques e depois segue pela tubagem, onde vai ser aquecido e coalhado. Na sala da mexedora, são cortados quatro queijos de cada vez que, após prensados, são desenformados. Passam, então, pela lavagem e revisão e, finalmente, repousam em salas preparadas para o efeito. Há uma divisão onde o queijo picante curado fica sob palha de centeio durante seis meses. As visitas à fábrica são gratuitas, mas requerem reserva prévia.
A poucos quilómetros fica o porto do Tejo, cais fluvial de onde partem os barcos que fazem passeios até às PORTAS DE RODÃO. O Monumento Natural deve o seu nome ao afunilamento do vale onde o rio Tejo corre por entre dois rochedos que se assemelham a duas portas, uma a norte, em Ródão, e outra a sul, em Nisa. Mesmo antes do arranque do passeio, paira no ar o silêncio, interrompido apenas pela oscilação dos barcos na água e pelas aves que sobrevoam as escarpas. A embarcação é aberta a toda a volta, permitindo vista completa para o deslumbrante cenário onde o Tejo dá ideia de estar imóvel, um espelho dos planaltos que o enquadram.
No decorrer do percurso, pode-se avistar, no alto de um penedo, a torre de menagem do Castelo de Ródão, também conhecido como castelo do rei Vamba. As Portas de Ródão são, também, um ponto obrigatório para observação de pássaros e tem a maior comunidade de grifos do país. Além das aves que ali nidificam, pode observar-se tartarugas no limite da margem.
Terminado o passeio, o restaurante VILA PORTUGUESA, situado em frente ao cais, afigura-se como ideal para recarregar energias. Tem decoração simples, ambiente familiar e oferece uma vista para o magnífico porto do Tejo. Destacam-se, entre os pratos da casa, a bochecha de porco preto tenrinha, a pescada com espargos e puré de brócolos, a tigelada da Beira, sobremesa esponjosa e doce indicada para quem aprecia o gosto forte da canela.
Em cerca de 20 minutos, estamos em Castelo Branco, cidade de aparência jovial que
guarda as raízes no seu centro histórico. É preciso penetrar nas ruas estreitas para descobrir as casas brancas de listra amarela e portas baixinhas, e as pracetas rodeadas de edifícios antigos. A Praça de Camões é o derradeiro ponto de encontro, reunindo pedaços de história como o Arquivo Distrital, a Casa do Arco do Bispo e o CENTRO DE INTERPRETAÇÃO DO
BORDADO de Castelo Branco. Abriu em julho do ano passado, na antiga biblioteca, e inclui um núcleo museológico que conduz o visitante por uma viagem no tempo às origens deste ex-líbris da cidade. ARTE DENTRO E FORA DE PAREDES Além de mostrar a produção artesanal do bordado, o centro acolhe a Oficina-escola de Bordado de Castelo Branco, onde se pode assistir ao trabalho de bordadeiras locais. Munidas com dedal, fios de várias cores e muita concentração, debruçam-se sobre os panos de linho para adorná-los com motivos em seda. Há ainda uma loja onde se pode comprar panos, crachás e marcadores de livros.
A um passo dali, no cimo de uma rua apertada e inclinada, fica o MUSEU CARGALEIRO, constituído por dois edifícios contíguos, um palacete do século XVIII e uma construção do século XXI de linhas retas e pormenores espelhados. Aqui está todo o acervo da Fundação Manuel Cargaleiro, criada pelo pintor e ceramista nascido em Vila Velha de Ródão. A obra, que abrange azulejaria, tapeçaria ou serigrafia, destaca as cores vivas, as formas geométricas, as figuras naturais e as palavras. Além das diversas linguagens artísticas de Cargaleiro, o museu alberga o trabalho de nomes como Picasso, Zao Wou-ki e Claire Debril, cujas obras o pintor colecionou através de compra ou permuta. Há ainda um busto de Cargaleiro assinado por Lagoa Henriques, autor da estátua de Pessoa no Chiado.
Na capital de distrito, a arte não se limita às quatro paredes. Prova disso é o JARDIM DO PAÇO EPISCOPAL, exemplo notável do barroco português. Encomendado pelo bispo D. João de Mendonça no século XVIII, o jardim é retangular e tem vários balcões e varandas e cinco lagos com rebordos trabalhados. A inspiração bíblica está em cada canto, nomeadamente nas estátuas de granito, conotadas com a vida e a morte, o paraíso e o inferno. A história está presente na escadaria onde se encontram as figuras de granito dos reis de Portugal.
Ao final do dia, o destino é a Herdade do Regato. Ou, mais especificamente, O LAGAR, cuja estrutura foi preservada, tal como os utensílios usados na produção de azeite, e é hoje restaurante, a servir pratos tradicionais confecionados em forno a lenha, como o creme de cenoura com pão frito ou o bacalhau com broa. O azeite é o fio condutor da refeição, mas é também a força de uma região que pegou os amarelos e verdes da terra, apurando aroma e sabor para fazer deles seu cartão-de-visita, dentro e fora da mesa.
O ACERVO DA FUNDAÇÃO MANUEL CARGALEIRO, CRIADA PELO PRÓPRIO ARTISTA, PODE SER VISITADO NO MUSEU CARGALEIRO, EM CASTELO BRANCO.