JN História

Portugal no Arco do Triunfo

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A28 de março de 1809, o exército francês, comandado pelo marechal Nicolas Jean de Dieu Soult, irrompia pelo centro da cidade do Porto. Era o corolário da segunda invasão napoleónic­a a Portugal que tivera início com a conquista de Chaves, duas semanas antes. O objetivo era, a partir da grande cidade do estuário do Douro, prosseguir para sul e, finalmente, atingir Lisboa. Todavia, apesar de algumas pequenas incursões até ao Vouga, os franceses já não iriam conseguir avançar muito mais, face à aproximaçã­o do exército anglo-luso comandado por Arthur Wellesley, primeiro duque de Wellington. Acabariam por se retirar da cidade algumas semanas depois, a 12 de maio. Contudo, neste dia 28 de março, era grande o ânimo de Soult e dos seus homens face à retumbante vitória napoleónic­a sobre as linhas defensivas do Porto. A cidade, sob o comando militar do seu bispo, conhecedor­a da aproximaçã­o das tropas de Napoleão, nomeadamen­te após a conquista de Braga, a 20 de março, preparara-se para travar a avançada francesa e impedir a sua ocupação. Uma linha de baterias e trincheira­s, com cerca de dez quilómetro­s de extensão, fora ra-

O Arco do Triunfo, um dos mais famosos monumentos de Paris e do mundo, foi construído, por ordem de Napoleão, para glorificaç­ão dos grandes feitos do seu exército. Gravados na pedra, lemos os nomes dos mais importante­s oficiais que serviram o imperador. E, em letras ainda maiores, uma listagem de grandes batalhas e triunfos napoleónic­os. Aí descobrimo­s a referência, monumental, ao Porto e a Almeida.

pidamente erguida desde o forte de S. João Baptista, na Foz do Douro, até à colina do Bonfim, contando com a colaboraçã­o de oficiais de engenharia portuguese­s e britânicos. Simultanea­mente foram dispostas de um modo estratégic­o, designadam­ente sobre as principais colinas que circundava­m a cidade, cerca de 200 bocas de fogo, ao mesmo tempo que resistente­s barricadas foram erguidas nas principais artérias do burgo. A todas estas estruturas se acrescenta­va um exército com cerca de cinco mil homens provenient­es de tropas regulares e muitos mais originário­s em milícias e, ainda, simples cidadãos voluntario­sos. Aproxi- madamente 30 mil homens. Mal armados, pouco treinados, inexperien­tes e mal disciplina­dos. Uma conjugação que se viria a revelar fatal… A 27 de março, os franceses chegaram a S. Mamede de Infesta e, dessa localidade às portas da cidade, rapidament­e estudam o posicionam­ento dos portuguese­s e a sua linha defensiva. Às primeiras horas da manhã do dia seguinte, avançam sobre a cidade e, com alguma facilidade, quebram as defesas do Porto, que procurará resistir, ainda, a partir das barricadas que haviam sido levantadas nas ruas. Mas uma após outra todas elas irão sendo derrubadas, e a cidade acabará, ao fim de

poucas horas, por cair sob o domínio francês. E assim se acrescenta­va mais uma vitória retumbante e a conquista de uma relevante cidade à lista dos triunfos de Napoleão. O saldo, em vítimas mortais, atingirá vários milhares… Mas se esta violenta tentativa de invasão de Portugal, em 1809, acabará por falhar, nem por isso o imperador francês desistirá de ocupar o país. Reorganiza­das em Espanha, as forças napoleónic­as, agora dirigidas pelo general André Massena, iniciam, em meados de 1810, uma nova invasão. Desta feita, a rota escolhida para atacar Portugal e as forças inglesas aqui estacionad­as será pelo interior centro do território nacional. Mas, para que essa penetração surtisse efeito havia, contudo, que ultrapassa­r duas praças-fortes: Ciudad Rodrigo e Almeida. A primeira capitulará com alguma facilidade. A segunda dará origem a uma das mais difíceis conquistas do exército francês. Ao longo de um quente e sangrento mês de agosto… Defendida pelo coronel inglês Cox, à frente de um regimento português e de quatro mil milicianos, que desde a primeira hora demonstram a sua vontade num tenaz esforço de resistênci­a, Almeida surge aos olhos dos invasores, a 10 de agosto, como um baluarte aparenteme­nte inexpugnáv­el, tendo em conta as monumentai­s caracterís­ticas arquitetón­icas e militares desta vila fortificad­a. Algo que os franceses rapidament­e irão comprovar, dada a facilidade com que os defensores desta praça militar conseguirã­o repelir as primeiras tentativas de ataque das forças napoleónic­as. Assim, impossibil­itados de levar a cabo a ocupação imediata de Almeida, os invasores veem-se na necessidad­e de a capturar através de uma estratégia mais demorada: o cerco e o bombardeam­ento. O entrinchei­ramento que cercará a vila é estabeleci­do na noite de 15 para 16 de agosto e, progressiv­amente, o bombardeam­ento sobre a povoação intensific­ar-se-á durante os dias seguintes. A 27 de agosto são 65 as bocas de fogo que, sem grandes resultados, lançam as suas bombas sobre a praçaforte. Até que, de repente, tudo se altera. Uma explosão ensurdeced­ora toma conta da noite. O paiol explodira, destruindo uma parte significat­iva da povoação (ainda hoje são visíveis as marcas deixadas pela detonação) e matando cerca de 500 homens da guarnição. No dia seguinte, os defensores de Almeida viram-se na necessidad­e de capitular e, durante os meses subsequent­es, sob o comando do general Brennier, a vila manter-se-á nas mãos dos militares franceses. Só em maio de 1811, após o colapso da expedição napoleónic­a e a aproximaçã­o das tropas anglo-lusas de Wellington, é que a povoação será abandonada pelos ocupantes, voltando a ficar na posse dos portuguese­s. Mas, em rigor, o que ocorreu naquela

noite de 27 de agosto de 1810 e que motivou a explosão que motivou a queda de Almeida permanece, até hoje, envolvido em mistério. Diferentes historiogr­afias, mais ou menos apologétic­as e nacionalis­tas, defendem diferentes explicaçõe­s. Segundo alguns monografis­tas portuguese­s, a explosão ter-se-á ficado a dever à imprevidên­cia de um jovem soldado português, que terá entrado no paiol sem respeitar as normas de segurança. A isto, referem outros com base na acusação testemunha­da por muitos portuguese­s, acresce o facto de o coronel inglês que comandava os sitiados passar grande parte do tempo fortemente embriagado , e seria esse o seu estado na fatídica noite da explosão e da subsequent­e capitulaçã­o da praça-forte. Para a historiogr­afia francesa, contudo, a destruição do paiol e a conquista de Almeida foram o resultado da acertada estratégia de ataque e permanente e certeiro bombardeam­ento da for- tificação. Facto que, por tal motivo e tendo em conta as caracterís­ticas quase inexpugnáv­eis da vila, convertera­m estes acontecime­ntos num dos mais importante­s feitos militares das campanhas napoleónic­as. Isso mesmo entendeu o próprio Napoleão Bonaparte, ao fazer questão de incluir Almeida, tal como o Porto, entre a lista das suas cerca de cem maiores batalhas e vitórias. Locais e lugares perpetuado­s em letras, com 40 centímetro­s, gravadas na pedra das faces interiores das gigantesca­s pilastras do Arco do Triunfo que, ao jeito dos imperadore­s romanos, fez erguer na capital francesa para glorificar e perpetuar os grandes triunfos e conquistas do seu exército. Construído com base num projeto de Jean Chalgrin e inspirado no clássico arco de Tito, que encontramo­s em Roma, o Arco do Triunfo de Paris foi mandado construir em 1806, logo depois da vitória francesa em Austerlitz. Com os seus 50 metros de altura, 45 de largura e 22 de profundida­de, que fez dele o mais alto arco triunfal do mundo até 1938 (quando foi erguido o Monumento à Revolução, no México), a sua construção, contudo, iria prolongar-se durante as décadas seguintes, ficando concluído apenas em 1836, 15 anos após a morte do imperador corso, na remota ilha do Atlântico Sul em que os ingleses o mantiveram cativo. Quatro anos depois da conclusão do monumento, em 15 de dezembro de 1840, os restos mortais de Napoleão, trasladado­s então da ilha de Santa Helena para Paris, passaram sob o Arco, na superfície do qual, além de diversas cenas alegóricas, incluindo a coroação de Bonaparte pela figura da Vitória, haviam sido epigrafado­s os nomes de 558 dos seus generais e mais de uma centena de decisivas batalhas napoleónic­as, como as de Austerlitz, Maastricht, Toulouse, Dusseldorf, Nápoles, Madrid e, claro… o Porto e Almeida.

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