IRENE FLUNSER PIMENTEL Temas e Debates | 664 páginas | 22,10 €
Este estudo de Irene Flunser Pimentel pode ser entendido como sequela da tese de doutoramento da historiadora, dedicada à História da PIDE. A problematização, lida na capa (“Foram julgados os principais agentes da Ditadura portuguesa?”), corresponde a algo que faltava perceber. Como lidou o país com essa facetas tenebrosa do passado opressivo imediatamente anterior? Como se processou a extinção da polícia política? Houve um processo de justiça transicional? E como tem sido a construção da memória desses tempos, factos e pessoas? Com o 25 de Abril, os principais responsáveis do regime, Marcelo Caetano e Américo Tomás, foram poupados à justiça, vendo facilitado o caminho do exílio. O estudo não pára com o fim da Comissão de Extinção da PIDE/DGS, em 1982, acompanhando pontas soltas que ainda ficaram de um processo que, geralmente desaguando em penas leves (a construção de um país novo sobrepunha-se à prioridade da punição), foi um dos dois primeiros processos de justiça de transição (a par da Grécia) após a II Guerra Mundial. Nunca, sublinhe-se, numa lógica de Direitos Humanos, que seria anacrónica. É consabido que a neutralidade portuguesa, na II Guerra Mundial, não era obstáculo ao bom relacionamento entre dois regimes de natureza fascista, o Estado Novo e o nacional-socialismo alemão, além de haver grande permeabilidade de Portugal à propaganda nazi, o que não significava um alinhamento do regime salazarista com a Alemanha. Uma das particularidades do trabalho de Cláudia Ninhos, investigadora do Instituto de História Contemporânea da Universidade Nova de Lisboa, é perceber como era prioritário, para os alemães, com o intuito de estas influenciarem a diplomacia portuguesa, afastando-a do velho aliado britânico. O estudo fala-nos, sobretudo, dessa sedução e dos que se deixaram enfeitiçar pelas frequentes visitas de delegações da Juventude Hitleriana, pela chegada de navios da Kraft Durch Freude (Força pela Alegria), por excursões portuguesas à Alemanha que o Reich queria mostrar, por exposições, iniciativas culturais de todo o género, conferências, intercâmbios académicos, etc. O recurso a documentação alemã inédita ajuda a perceber melhor a realidade da germanofilia em Portugal. “Populismo e utopia no século XXI” é o subtítulo de “Bárbaros e Iluminados”, o novo livro de Jaime Nogueira Pinto. O autor teoriza, com a fundamentação que encontra na História (e na história do pensamento político), o momento de agitação que o mundo vive hoje, com acontecimentos como a eleição de Donald Trump, o Brexit, o desempenho de Marine Le Pen nas presidenciais francesas ou a ascensão, em vários países da UE, de forças nacionalistas, que o autor aponta como antissistema, a questionarem a ordem demo-liberal estabelecida na generalidade do ocidente. Sendo “iluminados” os herdeiros das utopias da razão e “bárbaros” os que se lhes têm vindo a opor (na contracapa do livro resume-se assim: “a crescente rebelião dos povos contra a elite internacional no poder”). Nogueira Pinto, cujo posicionamento sempre foi claramente conservador, escreve em cima dos acontecimentos (ainda vai a tempo de colocar a questão do independentismo catalão no rol dos confrontos entre “iluminados e bárbaros”) para reforçar a ideia de fragilidade da utopia global anunciada pelos homens das luzes, que, sugere, não seriam assim tão iluminados.