Jornal de Negócios

“Há uma resistênci­a do Estado ou das pessoas que lá trabalham”

O promotor Álvaro Covões tem procurado dinamizar equipament­os públicos com projectos culturais. Sem sucesso: “É o normal. Morre nos corredores.” O Estado tem funcionado como uma barreira a quem quer inovar, defende. Também a nível fiscal.

- WILSON LEDO

Quando anunciamos o preço dos bilhetes, estamos a mentir. Devíamos dizer o preço sem IVA.

ÁLVARO COVÕES

Director da Everything is New

“OEstado tem milhares de metros quadrados a apodrecer e não deixa entrar lá ninguém.” Quem o diz é Álvaro Covões, director da promotora de eventos Everything is New, que tem tentado contrariar este “imobilismo” ao longo dos anos. O seu radar tem andado pela zona da Ajuda, em Lisboa. Primeiro com planos para uma exposição das jóias reais portuguesa­s no Palácio Nacional. Depois, enquanto presidente da Associação do Turismo Militar Português, com um projecto artístico para o Quartel da Ajuda. Neste último, contribuin­do para a preservaçã­o do património militar, o empresário gostaria de criar um “cluster de cultura”: com salas para ensino de música, ateliês de artes plásticas e ensaios de teatro, sem esquecer projectos de inovação. Dos diferentes ministério­s, a resposta foi sempre igual: silêncio. “É o normal. Morre nos corredores.” “Há uma resistênci­a do Estado ou das pessoas que trabalham no Estado, que se acham donos de bens que são dos portuguese­s. Isto não tem que ver com partidos políticos, tem que ver com a máquina do Estado”. Para Covões, os privados assumem o risco financeiro. E o Estado deveria surgir como “elemento facilitado­r” para gerar riqueza. “No dia em que o Estado perceber isso, talvez possamos ser um país de primeiro mundo a nível económico.” Um dos primeiros passos podia ser dado nos impostos sobre a cultura. Do país vizinho, Espanha, refere exemplos de eventos que, não sendo financiado­s à cabeça, vêem o valor do IVA devolvido por causa do seu impacto na economia. O fundador da Everything is Newsugere ainda outra solução: baixar o IVA dos espectácul­os de 13% para 6%. “Não faz sentido o IVAnão ser à taxa reduzida [6%]. Estamos numa luta, na Associação de Promotores de Espectácul­os, Festivais e Eventos (APEFE, fundada este ano), para provar a inconstitu­cionalidad­e do IVA da cultura sem ser à taxa reduzida”. “Quando anunciamos o preço dos bilhetes, estamos a mentir. Devíamos dizer o preço sem IVA, porque é esse que entra na nossa contabilid­ade.” Falando em ingressos, os preços para o próximo Nos Alive subiram. Para quê? Um reforço do orçamento do festival. “Aumentámos um pouco o preço dos bilhetes e subimos o orçamento para 8,5 milhões”, mais um milhão do que em 2016. “O nos- so objectivo é o cartaz. E, para isso, é preciso investir. Acho que justificou o aumento do investimen­to porque vendemos tudo rapidament­e.” Atrês meses de as portas abrirem, os bilhetes já tinham esgotado. O “mito urbano” de que os ingressos nunca esgotam desfez-se pelo segundo ano consecutiv­o. Pelo Passeio Marítimo de Algés, entre 6 e 8 de Julho, vão passar 165 mil pessoas. Além de serem “o primeiro patrocinad­or” do festival, são uma “alavanca” na economia local. Um estudo universitá­rio mediu este impacto: 55 milhões de euros. “Quando falamos de 55 milhões na economia local não estamos a falar de cinco tostões. É estranho como o Estado penaliza quem faz isso, ainda a cobrar um imposto.” O desalento de Álvaro Covões é forte na hora de reconhecer que a importânci­a dos festivais de Verão no turismo ainda “não está reconhecid­a”. O promotor lamenta que o Estado continue a considerar “alguns eventos fundamenta­is para o desenvolvi­mento para o país”, como o Web Summit ou a Volvo Ocean Race, quando a estratégia para o turismo deve passar pela diversific­ação de conteúdos. “Temos uma indústria que foi capaz de responder desde o primeiro minuto. Se não houvesse turismo, nem sei se estávamos com a troika. Se calhar estávamos na bancarrota.”

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Bruno Simão Álvaro Covões, fundador da promotora Everything is New, reforçou o orçamento do Nos Alive em um milhão de euros, para os 8,5 milhões.

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