Jornal de Negócios

Incêndios: “Não me parece que deva actuar, mas estarei atento”

O Provedor de Justiça considera que o trabalho que está a ser feito pelo Parlamento e pelo Governo não justifica que ele próprio intervenha no cado do incêndio de Pedrógão Grande. Mas avisa que se manterá atento.

- FILOMENA LANÇA filomenala­nca@negocios.pt ROSÁRIO LIRA, ANTENA 1 MIGUEL BALTAZAR Fotografia

Um sentimento de “dor profunda” por “ainda não termos, pelo menos minimament­e resolvido este problema”, lamenta José de Faria Costa, a propósito dos incêndios que mais uma vez assolaram o país, este ano com consequênc­ias particular­mente trágicas pelo elevado número de vítimas.

Face à situação que se registou agora, nos incêndios em Pedrógão Grande, pondera vir a abrir um procedimen­to de iniciativa própria?

Neste momento ainda estou debaixo de uma situação de estupor. Estou ainda tocado profundame­nte, chocado com aquilo que se passou em Pedrógão. Racionalme­nte tento fazer um esforço enorme de compreensã­o. Mas antes disso, lamento profundame­nte todas as vidas perdidas e todos os bens perdidos. E também aqui o meu sentimento é um sentimento de alguma dor profunda de nós ainda não termos, pelo menos minimament­e, resolvido este problema.

O que acaba de dizer justifica uma iniciativa nesse sentido, ou não?

Não necessaria­mente porque se – e penso que as coisas se encaminham nesse sentido – eu vir que a administra­ção, o Parlamento, estão empenhados na descoberta das causas de tudo o que aconteceu, não me parece que o provedor deva actuar. Se vejo que todas as instâncias do poder, nomeadamen­te a partir do Parlamento, a partir do próprio Governo, estão empenhadas na desco- berta das causas, eu enquanto Provedor tenho que considerar que estão a ser reunidas todas as condições para que a verdade seja descoberta.

E isso está a acontecer neste momento?

Tenho informação que qualquer uma das senhoras tem….

Mas daquilo que lhe é possível constatar?

Daquilo que me é possível perceber vejo que da parte do Parlamento há claramente uma vontade de criar uma comissão, por parte da administra­ção a mesma coisa. Agora isso não nos impede de enquanto cidadãos e isso é um direito fundamenta­l de cidadania de estarmos

atentos para que isso efectivame­nte aconteça. E eu estarei atento.

Neste momento há uma situação que envolve os magistrado­s e o Ministério da Justiça em relação ao estatuto e há possibilid­ade de uma greve de juízes em Agosto que poderá prejudicar as eleições autárquica­s. Gostaríamo­s de saber a sua opinião sobre esta eventual greve dos magistrado­s.

O provedor não deve nem pode intrometer-se na luta político-partidária. Tem sido essa sempre a grande força do Provedor – o Provedor exerce um magistério moral, ético-moral sobre a sociedade e não pode nem deve intrometer-se na luta político-partidária.

Porque na verdade o que está aqui em causa é o facto de

uma greve poder interferir no processo das eleições autárquica­s. No bom funcioname­nto das instituiçõ­es.

Em relação ao bom funcioname­nto das instituiçõ­es evidenteme­nte o Provedor estará atento, mas julgo que muito antes de mim outros órgãos de soberania estão muito mais atentos e devem estar muito mais vigies do que o próprio Provedor. Porque evidenteme­nte isso é um problema central da própria democracia.

Voltando ao início da nossa conversa, ocorre-me perguntar se o Provedor de alguma forma deverá pronunciar-se sobre matéria sensível, mais exactament­e sobre eutanásia?

Esse é um outro problema. Ou seja, se o Provedor deve participar de uma forma activa na produção legislativ­a. Isso tem duas vertentes. Por um lado, deve auxiliar na medida do possível o melhoramen­to das leis, e isso é bom, mas tem o reverso da medalha. É que se o Provedor fica tão engajado à produção legislativ­a mais tarde vai ter alguma dificuldad­e em manter a independên­cia e em manter a distância. Portanto, é sempre uma decisão muito, muito muito complexa. Isto é, na verdade o Provedor deve ser pró-activo e deve estar a acompanhar o sentido da sociedade.

Mas pode defender ou apoiar um referendo, ou tomar alguma posição sobre um referendo, que já é uma situação diferente?

Não. Na minha óptica não. O Provedor não deve, não deve tomar posição sobre isso, porque essa é uma discussão político-partidária. A existência ou não de um referendo é uma discussão político-partidária e aí o Provedor não deve tomar posição.

“Se o Provedor fica engajado à produção legislativ­a, mais tarde vai ter dificuldad­e em manter a independên­cia.”

“O Provedor exerce um magistério ético-moral sobre a sociedade.”

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Miguel Baltazar

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