Mesmo que a Caixa vá ao défice Portugal não será castigado
INE deve divulgar hoje se, afinal, o défice de 2017 superou os 3%.
Na sexta-feira, o Eurostat ainda estava em debate com o INE sobre o impacto da CGD no défice.
OInstituto Nacional de Estatística (INE) poderá revelar esta segunda-feira que o défice de 2017, afinal, superou os 3% do PIB. Este é o limite imposto pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento, uma espécie de bíblia das finanças públicas da União Europeia. Mas, desta vez, o mais provável é que ninguém dê muita importância ao caso. Porquê? Em Dezembro do ano passado, o INE estabeleceu como prazo limite Março de 2018 para se pronunciar sobre o impacto no défice da recapitalização pública da Caixa Geral de Depósitos. Em causa estão 3.944 milhões de euros injectados pelo Estado na Caixa, o equivalente a 2% do PIB, assumindo a última estimativa do INE para a produção de riqueza no ano passado. Ora, o prazo termina hoje: o INE vai enviar para o Eurostat, e tornar pública, a primeira notificação ao abrigo do Procedimento por Défice Excessivo (PDE) referente a 2017. Neste documento, deverá constar a decisão sobre se os tais 2% de dinheiro público injectado na CGD afectam o défice do ano passado ou se, pelo contrário, são entendidos como um investimento, um acréscimo de valor, sem impacto na despesa pública. Tudo indica que a operação deva ser registada no défice – Paulo Trigo Pereira, deputado pelo PS, já o afirmou e este tem sido o entendimento do Eurostat, contra a opinião das autoridades nacionais. Mas até ao dia do anúncio tudo pode acontecer. “As discussões bilaterais com as autoridades estatísticas portuguesas sobre este assunto estão em curso”, respondeu o Eurostat ao Negócios, na sexta-feira passada. E somou: “Não há um calendário fixo para a publicação do nosso parecer”. É que depois de o INE se pronunciar, será a vez da autoridade estatística da União Europeia.
O que dizem as regras?
Dizem que, neste caso, se Portugal furar o limite dos 3% não tem importância. O impacto de um défice novamente em torno dos 3% será desvalorizado para efeitos do PDE. No ano passado, Portugal saiu do braço correctivo do Pacto de Estabilidade e Crescimento, libertando-se de uma monitorização mais estreita por parte da Comissão Europeia e da obrigatoriedade de todos os anos baixar o défice para uma determinada meta, sob pena de ser sujeito a sanções. No braço preventivo, onde está agora, Portugal passa a ter de olhar sobretudo para o saldo estrutural, que é uma outra forma de calcular o défice: neste conceito, o saldo orçamental é expurgado dos efeitos do ciclo económico e das medidas de impacto temporário, e é medido face ao PIB potencial. O impacto da recapitalização da CGD não conta para este rácio. Mais: também não conta para voltar a entrar no PDE. A orientação consta do Vade Mecum sobre o Pacto de Estabilidade e Crescimento: os países com dívida pública acima do limite dos 60% do PIB deverão ser sujeitos à abertura de um novo PDE, “a menos que o valor da transferência de capital seja limitado, de forma a que o défice nominal se mantenha perto da referência de 3%, e temporário”. Nestes casos, “a recomendação de PDE deverá con- siderar que tais operações são normalmente de natureza temporária”, conclui o documento. Parece ser o caso de Portugal: é verdade que a dívida pública supera os 60% do PIB (é mais do dobro), mas a trajectória do défice tem sido de descida; no horizonte de projecção Bruxelas prevê que o défice continue abaixo de 3%; o impacto da CGD deixa o valor em 3% ou apenas ligeiramente acima; e este é um efeito de natureza temporária. Aliás, este mesmo entendimen- to teve a Comissão Europeia quando, mesmo sabendo da ocorrência da recapitalização, decidiu recomendar o encerramento do PDE no ano passado. Em 2015, com o Banif, o caso foi diferente. Nessa altura foi determinante a inscrição do impacto da resolução do banco no défice porque Portugal estava no PDE. E nesse caso, mesmo sendo uma medida de estabilização do sistema financeiro, pontual, as regras não permitem que o país saia do procedimento.