Jornal de Negócios

Governo deu mais dados a Bruxelas do que aos deputados

Executivo diz à Comissão Europeia que espera baixar mais o défice de 2022.

- MARGARIDA PEIXOTO margaridap­eixoto@negocios.pt

0,13 NOVO BANCO Este é o “impacto líquido”, em percentage­m do PIB, do Novo Banco no défice. O impacto bruto na despesa é de 0,2%.

Em Portugal, foram precisas várias perguntas ao ministro das Finanças para confirmar a informação de que há uma injeção prevista para o Novo Banco com impacto no défice. Mas em Bruxelas bastou abrir o plano orçamental e consultar uma tabela: estavam lá dados que faltavam no documento enviado à AR.

No esboço de Orçamento do Estado para 2021 que o Governo enviou para a Comissão Europeia, o Ministério das Finanças submeteu informação diferente face à que tinha comunicado dias antes à Assembleia da República. A tabela das medidas de política com impactos orçamentai­s entregue em Bruxelas tem mais alíneas – está lá, desde logo, o Novo Banco – e pequenas diferenças nos valores.

Contactada, fonte do Ministério das Finanças disse ao Negócios que na sexta-feira foram enviados tanto à AR, como a Bruxelas, pedidos de correção aos documentos. Em causa está a tabela 13: “Medidas discricion­árias incluídas no projeto de plano orçamental”, que dá conta das iniciativa­s que têm impacto no défice. Tanto na versão para o palco nacional, como na que foi enviada para a Comissão Europeia, esta tabela indica que as medidas prejudicam o saldo orçamental em 0,9% do PIB, uma vez contabiliz­ados os efeitos da despesa, e da receita.

Mas na mudança de destinatár­io, a composição deste saldo altera-se de forma significat­iva: na despesa comunicada a Bruxelas aparecem mais quatro alíneas referentes a 2021, que valem 0,51% do PIB, o equivalent­e a 1.075 milhões de euros. Está aqui preto no branco, por exemplo, o “impacto líquido” da injeção de capital prevista para o Novo Banco: 0,13% do

PIB, 275 milhões de euros.

Também está já registada uma execução de garantias no valor de 126,5 milhões de euros. Aparecem ainda a injeção de capital na TAP, no valor de 0,24% do PIB, e uma decisão judicial da Câmara de Lisboa, que soma 0,08% do PIB.

Além disso, as poupanças prometidas à Comissão com o exercício de revisão da despesa valem 0,06% do PIB, enquanto na tabela para Portugal estas poupanças valem 0,05% do PIB. No relatório do Orçamento do Estado, esta medida está identifica­da como tendo um impacto de 135,3 milhões de euros, o que correspond­e a 0,06% do PIB nominal com que o Governo está a trabalhar.

Já do lado da receita surgem dois efeitos que também não estavam previstos na tabela submetida ao Parlamento e que compensam o acréscimo da despesa: são elas a recuperaçã­o da garantia do BPP, no valor de 0,03% do PIB, e o recebiment­o das margens pré-pagas do Fundo Europeu de Estabiliza­ção Financeira (FEEF), com impacto de 0,52% do PIB. Somados, estes efeitos acrescem 0,53% à receita, compensand­o o saldo para 0,88%, ou, arredondad­o à primeira casa decimal como aparece na tabela para o público nacional, 0,9% do PIB.

Gralhas e opacidades

Desde que o OE 2021 foi entregue na Assembleia da República, a 12 de outubro, que se sucedem episódios de gralhas e correções de números, ou acrescento­s de informação. O dia da entrega ficou marcado pelos 470 milhões de euros de despesa que “não eram” para injetar no Novo Banco, assegurou então o Governo, mas sim para a CP. O dia seguinte destacou-se pela conferênci­a de imprensa em que o ministro das Finanças reconheceu que, afinal, sempre existem 470 milhões de euros para injetar na instituiçã­o financeira.

A 14 de outubro somou-se outro caso: a Direção- Geral do Orçamento publicou um esclarecim­ento e um mapa adicional no seu site. “Clarifica-se que os Mapas da Lei do OE 2021 contêm a mesma informação dos Mapas da Lei do OE de anos anteriores”, sentiu necessidad­e de afirmar. “São apresentad­os de forma dis

tinta em cumpriment­o da nova Lei do Enquadrame­nto Orçamental (LEO) na redação atual dada pela Lei n.º 41/2020, de 18 de agosto”, frisou.

Ou seja, a mudança que o Governo promoveu na LEO alterou a forma como a informação é disponibil­izada. Para Gonçalo Velho, presidente do Sindicato Nacional do Ensino Superior, mudou para pior. “Torna o OE bastante mais opaco”, diz ao Negócios. E dá um exemplo que esteve na base da necessidad­e da DGO de publicar o tal novo mapa: a informação inicialmen­te disponibil­izada agregava as receitas dos serviços e fundos autónomos com as receitas dos serviços integrados, dividindo apenas por programas.

Na prática, não se conseguia perceber que verbas provinham do Orçamento do subsetor Estado e que montantes diziam respeito a receitas próprias, ou a fundos comunitári­os, explica o professor. “O ensino superior é apenas um exemplo. Acontece em todos os outros serviços e fundos autónomos”, frisa Gonçalo Velho. “Se tínhamos a desagregaç­ão dos mapas, porque estamos a agregar?”, questiona, “Geralmente quando se agrega é porque se quer esconder alguma coisa”, critica.

Com o novo mapa, o problema fica ligeiramen­te menor, mas não está totalmente resolvido. Embora já esteja discrimina­da qual é a receita que provém de transferên­cias dentro das administra­ções públicas, estes valores não estão consolidad­os, pelo que não estão anulados os “fluxos intrasetor­iais e intersetor­iais de juros, subsídios, transferên­cias correntes e de capital, ativos e passivos no âmbito da Administra­ção Central”, entre outros, nota a própria DGO. 

“Geralmente quando se agrega [informação] quer-se esconder alguma coisa. GONÇALO VELHO Presidente do Sindicato Nacional do Ensino Superior

 ??  ?? João Leão, ministro das Finanças, viu-se forçado a reconhecer em conferênci­a de imprensa que o Novo Banco terá im
João Leão, ministro das Finanças, viu-se forçado a reconhecer em conferênci­a de imprensa que o Novo Banco terá im
 ?? João Cortesão ?? m pacto no défice.
João Cortesão m pacto no défice.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal