“A resposta não está nos livros nem sequer na Constituição mas no contributo empenhado que devemos dar.”
Perante a galopante subida dos casos detetados de covid-19, o discurso oficial mudou de tom e a oposição lá se vai agarrando ao que pode. Paira no ar uma sensação que é um misto de desespero e impotência. Desespero porque já ninguém sabe verdadeiramente que medidas tomar. Impotência porque a situação começa a estar fora de controlo.
O crescimento do número de casos é alarmante e bem podem dizer que já era esperado. Ainda o tempo da gripe não chegou e já superámos todas as cifras negras. O que será dentro de poucas semanas quando o início de uma normal constipação dará origem a todo um processo de verificação clínica sobre o estado real do paciente. Claro que o SNS (Serviço Nacional de Saúde) já está a rebentar pelas costuras e todos têm consciência da incapacidade de responder às necessidades das populações. Aqui deveriam entrar os decisores políticos. Para fazer escolhas e correr riscos.
António Costa diz, embora poucos acreditem, que não gosta de parecer autoritário, mas que a pandemia tem de ser dominada. Tem razão. A saúde pública tem de ser preservada nem que seja necessário recorrer a medidas que garantam a ordem e previnam comportamentos impróprios. Tudo o que contribua para mais rapidamente detetar um foco de infeção deve ser aproveitado. A aplicação StayAway Covid é apenas isso. Mas logo surgem vozes de alarme declarando não estarem salvaguardados os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos. A questão constitucional é irrelevante? Claro que não. Mas a reação à sugestão de reforçar a utilização desta rede de prevenção antes de a tornar quase obrigatória é desproporcionada e revela, por parte de alguns setores, um óbvio oportunismo político carregado de demagogia.
Todos os dias surgem mais casos e morrem pessoas. Cada um destes dias é mais um que atira a retoma das nossas vidas normais para mais longe. Conjugados criam o ambiente perfeito para a descrença e para o descalabro não apenas dos sistemas de proteção que construímos, mas também do modelo económico em que vivemos. Perante tudo isto o que é que vemos acontecer? Em vez de contributos para uma melhor organização dos meios de combate, como por exemplo fizeram os bastonários da Ordem dos Médicos, chamando a atenção para a imprescindibilidade de recorrer com urgência a todos os recursos disponíveis incluindo os privados – que só a miopia do olho esquerdo impede o Governo de avançar – eis que a prioridade de alguns se virou para a fiscalização da constitucionalidade de uma medida excecional que não pode ser desenquadrada do contexto de alarme social em que estamos a cair.
Tempos excecionais exigem medidas de exceção. A bem ou a mal. Com maior ou menor compreensão por parte dos cidadãos. Está em causa a autoridade do Estado e o exercício do poder em nome de um bem maior. Não está em causa a liberdade de cada um.
Está em jogo a sobrevivência de todos. A irresponsabilidade de quem não percebe onde estamos e para onde caminhamos a passos muito rápidos encontra apenas paralelo na cegueira dos que ainda persistem na desvalorização dos efeitos pessoais, sociais e económicos desta desgraça que se abateu sobre nós. Estamos definitivamente em guerra. Contra a doença, contra o medo que ela gera, contra os efeitos que provoca nas nossas vidas. A resposta não está nos livros nem sequer na Constituição. Está nas ações concretas de todos os dias e no contributo empenhado que devemos dar para, pelo menos, não atrapalhar ainda mais a vida dos nossos semelhantes. É tempo de respeitar as decisões de quem tem legitimidade para as tomar. Ou dentro de alguns meses ainda haverá quem queira discutir a constitucionalidade da distribuição generalizada da vacina. Será que estas mentes iluminadas não percebem que o ridículo em que entraram pode mesmo matar?
É tempo de respeitar as decisões de quem tem legitimidade para as tomar.