A guerra do 5G
Há uma guerra instalada entre regulador e regulados no setor das telecomunicações em Portugal que já vem de trás e subiu de tom com a nova geração de redes móveis. A ponto de corrermos o risco de o desenvolvimento do país se tornar no dano colateral. O motivo maior de celeuma é o “roaming nacional”, que Cadete de Matos, presidente da Anacom, quer incluir no futuro leilão do 5G. A ideia é que os novos entrantes – para os quais ficará reservada uma parte do espectro – tenham direito a usar as redes já criadas pela Altice, Nos e Vodafone. Pelo preço modesto de uma licença ganham acesso ilimitado a um investimento de centenas de milhões de euros em infraestrutura realizado ao longo de anos.
O que a Anacom quer fazer equivale a uma apropriação pública de um investimento privado, disponibilizando-o a novos concorrentes. É verdade que temos um Governo que se tem apoiado em partidos que rejeitam a economia de mercado, mas a Constituição portuguesa ainda garante o direito à propriedade privada. A Nos e a Vodafone já se queixaram a Bruxelas, alegando que estão em causa auxílios ilegais de Estado.
Cadete de Matos tem conseguido levar a sua avante. O anterior secretário de Estado, Alberto Souto de Miranda, um acérrimo crítico do líder do regulador e um opositor do “roaming nacional” foi “chutado” para o Banco de Fomento. Mas o único roaming que faz sentido é nos territórios de baixa densidade, onde o investimento e a rede devem ser partilhados para a fazer chegar a quem ainda não a tem. Se a transformação digital não chegar ao interior, nunca teremos coesão territorial, pelo contrário, o atraso e o abandono serão ainda maiores.
O presidente da Anacom entende que Portugal tem um setor das telecomunicações pouco concorrencial e vê no 5G a oportunidade para quebrar barreiras e baixar preços. É legítimo. Convém é fazê-lo de forma legítima.
O desenvolvimento das redes móveis tem sido um dos grandes motores da transformação digital e o 5G promete um salto exponencial. Permite um volume de dados 100 vezes superior, a transmissão é praticamente instantânea e, talvez o mais relevante, permite ligar milhões de dispositivos em simultâneo. Vamos passar do “todos ligados” para o “tudo ligado”.
Como em qualquer revolução, há os que lideram, os que se adaptam e os que ficam para trás. Os benefícios económicos e sociais que se podem conseguir ocorrem pela ordem inversa.
Em que grupo ficará Portugal e as suas empresas? A questão começará a ser respondida este mês com o regulamento final do leilão para o 5G. Tal como na aprovação do Orçamento, espera-se que também neste caso impere o bom senso.