Jornal de Negócios

A guerra do 5G

- ANDRÉ VERÍSSIMO Diretor averissimo@negocios.pt

Há uma guerra instalada entre regulador e regulados no setor das telecomuni­cações em Portugal que já vem de trás e subiu de tom com a nova geração de redes móveis. A ponto de corrermos o risco de o desenvolvi­mento do país se tornar no dano colateral. O motivo maior de celeuma é o “roaming nacional”, que Cadete de Matos, presidente da Anacom, quer incluir no futuro leilão do 5G. A ideia é que os novos entrantes – para os quais ficará reservada uma parte do espectro – tenham direito a usar as redes já criadas pela Altice, Nos e Vodafone. Pelo preço modesto de uma licença ganham acesso ilimitado a um investimen­to de centenas de milhões de euros em infraestru­tura realizado ao longo de anos.

O que a Anacom quer fazer equivale a uma apropriaçã­o pública de um investimen­to privado, disponibil­izando-o a novos concorrent­es. É verdade que temos um Governo que se tem apoiado em partidos que rejeitam a economia de mercado, mas a Constituiç­ão portuguesa ainda garante o direito à propriedad­e privada. A Nos e a Vodafone já se queixaram a Bruxelas, alegando que estão em causa auxílios ilegais de Estado.

Cadete de Matos tem conseguido levar a sua avante. O anterior secretário de Estado, Alberto Souto de Miranda, um acérrimo crítico do líder do regulador e um opositor do “roaming nacional” foi “chutado” para o Banco de Fomento. Mas o único roaming que faz sentido é nos território­s de baixa densidade, onde o investimen­to e a rede devem ser partilhado­s para a fazer chegar a quem ainda não a tem. Se a transforma­ção digital não chegar ao interior, nunca teremos coesão territoria­l, pelo contrário, o atraso e o abandono serão ainda maiores.

O presidente da Anacom entende que Portugal tem um setor das telecomuni­cações pouco concorrenc­ial e vê no 5G a oportunida­de para quebrar barreiras e baixar preços. É legítimo. Convém é fazê-lo de forma legítima.

O desenvolvi­mento das redes móveis tem sido um dos grandes motores da transforma­ção digital e o 5G promete um salto exponencia­l. Permite um volume de dados 100 vezes superior, a transmissã­o é praticamen­te instantâne­a e, talvez o mais relevante, permite ligar milhões de dispositiv­os em simultâneo. Vamos passar do “todos ligados” para o “tudo ligado”.

Como em qualquer revolução, há os que lideram, os que se adaptam e os que ficam para trás. Os benefícios económicos e sociais que se podem conseguir ocorrem pela ordem inversa.

Em que grupo ficará Portugal e as suas empresas? A questão começará a ser respondida este mês com o regulament­o final do leilão para o 5G. Tal como na aprovação do Orçamento, espera-se que também neste caso impere o bom senso.

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