“Em 2021 a política orçamental é neutra”
A ação específica do Governo não está a piorar a situação das finanças públicas de médio prazo, garante o coordenador da UTAO.
Este OE é expansionista ou neutral?
Há ferramentas técnicas para avaliar se uma política orçamental é contracionista, expansionista, contracíclica ou pró-cíclica e não creio que muitos pronunciamentos públicos sobre esta matéria tivessem sustentação técnica. O que demonstramos no nosso relatório é que a política orçamental em 2020 é contracíclica, porque o saldo primário estrutural vai baixar quando a economia entrou numa recessão. E em 2021 a política orçamental é neutra.
Isso significa que o orçamento não está a dar um grande suporte à economia?
Significa que se excluirmos o efeito da conjuntura económica das contas, se retirarmos as operações não recorrentes, verificamos que o saldo primário estrutural praticamente não varia.
Mas quer dizer que o governo não está, pela sua ação específica, a injetar grande suporte na economia neste momento em que vimos de uma recessão fortíssima. Estou a interpretar bem?
Está. O Governo tem limitações. Temos dezenas de décadas de acumulação de dívida pública. Isso condiciona fortemente a capacidade de fazer diferente. Dito isto, é evidente que há um volume muito apreciável de milhares de milhões de euros de medidas específicas para minimizar os impactos negativos da pandemia na economia e na saúde pública. As duas coisas são verdade. O que digo é que a situação intertemporal das finanças públicas não melhora nem piora em 2021, fica na mesma. E na mesma significa que vamos ter um saldo primário estrutural de -0,8% do PIB potencial e se contarmos com os juros de -3,4%. E o saldo estrutural desde 2014 é sempre negativo e nem sempre tem melhorado. Temos uma situação das finanças públicas muito frágil em termos estruturais.
Mas também não defende que o governo devesse fazer uma política orçamental restritiva?
Não, e é por isso que considero que a meta nominal de -4,3% do PIB parece equilibrada.
O PSD diz que o OE dá tudo a todos. Pela sua resposta percebo que considera que não seria possível dar mais do que dá pela situação estrutural das finanças. Haveria onde cortar despesa?
Este nível é equilibrado. Claro que não há ciência exata para nos dizer qual é o número certo. Mais dois ou três pontos percentuais para cima ou para baixo, o país aguentaria. Temos uma situação muito grave do ponto de vista social, mas não podemos olhar apenas para 2021, temos de olhar para os anos seguintes e para a geração dos nossos filhos. Lançar dívida pesada para as próximas décadas é um bocadinho empurrar com a barriga. Não podemos perder de vista a equidade intergeracional. É muito difícil fazer um orçamento e é seguramente impossível contentar todos.
“O Governo tem limitações. Temos dezenas de décadas de acumulação de dívida pública.”
“A dívida condiciona fortemente a capacidade de fazer diferente.”