Jornal de Negócios

Manuel Vicente exposto na TPA é um prenúncio do que aí vem

A TPA está a emitir um conjunto de reportagen­s sobre alegados atos de corrupção. A circunstân­cia de o antigo vice-presidente de Angola ser um dos visados é uma novidade. Até agora, Manuel Vicente parecia estar protegido por João Lourenço.

- CELSO FILIPE cfilipe@negocios.pt

Oconjunto de reportagen­s que a televisão estatal angolana TPA está a emitir sobre alegadas ações de corrupção protagoniz­adas por altas figuras do país traz duas novidades dominantes. Uma delas é a admissão, de forma inequívoca, de que esta prática minou o aparelho do Estado. A outra relaciona-se com o facto de apresentar, entre os envolvidos nestes esquemas, Manuel Vicente, ex-vice-presidente angolano e antigo líder da Sonangol.

Manuel Vicente, até agora, encontrava-se numa redoma de intocabili­dade, proporcion­ada pelo próprio Presidente da República. João Lourenço promoveu um conflito diplomátic­o com Portugal à custa do processo que corria contra Manuel Vicente na justiça portuguesa, e, como contrapart­ida, o ex-vice presidente terá ajudado o atual chefe de Estado a identifica­r os “podres” do regime.

Este entendimen­to, que parecia tácito, ter-se-á esboroado. Manuel Vicente sempre foi apontado, à boca fechada, como um dos protagonis­tas do desvio de fundos públicos e, nesta medida, constituía um calcanhar de Aquiles para João Lourenço e a sua demanda na luta contra a corrupção. A exposição pública do antigo líder da Sonangol, através da TPA, é um inequívoco sinal de mudança.

Nesta medida, as reportagen­s intitulada­s “O Banquete” são um prenúncio do que poderá acontecer em 2022, ano em que termina a imunidade de Manuel Vicente e também do ex-Presidente da República, José Eduardo dos Santos. No entanto, as reportagen­s, estão longe de serem consensuai­s. “Todas as pessoas citadas nas reportagen­s passadas pela TPA deviam ser ouvidas sobretudo no jornalismo investigat­ivo, para dar maior credibilid­ade, e, por outro lado, não devem nunca os jornalista­s sobrepor-se aos tribunais”, afirmou Luísa Rogério, presidente da Comissão de Carteira de jornalista­s angolanos.

Até lá, o julgamento de Manuel Vicente far-se-á no palco mediático. As denúncias feitas pela TPA fazem parte de uma estratégia que terá como mentor o general Fernando Miala, chefe do Serviço de Inteligênc­ia e Segurança do Estado, que por estes dias é um dos homens mais poderosos de Angola.

Kopelipa e Dino proibidos de sair

Em 2007, Fernando Miala, à altura diretor dos Serviços de Inteligênc­ia Externa, foi condenado a quatro anos de prisão por uma alegada tentativa de golpe de Estado. As circunstân­cias que envolveram este processo sempre foram duvidosas, Miala fez uma dura travessia do deserto e acabou por ser reabilitad­o por José Eduardo dos Santos, no final do mandato deste. No entanto, as relações com os generais Leopoldino Fragoso do Nascimento e Hélder Vieira Dias (“Kopelipa”), duas das figuras mais próximas de Eduardo dos Santos, deterioram-se irremediav­elmente. Agora, estes dois generais, foram também proibidos de sair do país pela Procurador­ia- Geral da República, devido a uma investigaç­ão em curso relacionad­a com o desvio de fundos.

Estes desenvolvi­mentos fazem assim crer que João Lourenço deixou cair Manuel Vicente, entregando-o às mãos dos serviços de inteligênc­ia e também da PGR, de forma a eliminar vulnerabil­idades e preparando já caminho para as presidenci­ais de 2023, ano em que, segundo os especialis­tas, Angola começará a dar os primeiros sinais de recuperaçã­o económica. A suportar esta tese está o facto de Manuel Vicente ter saído de Angola no passado mês de outubro, correndo rumores de que estará a viver no Dubai.

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DR Manuel Vicente ausentou-se de Angola em outubro e estará a residir no Dubai.

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