Jornal de Negócios

“Por tortuoso e incerto que seja, escolheu-se um caminho, encontrou-se um comprador e agora há que honrar os compromiss­os.”

- LUÍS NAZARÉ

1.Chegados aqui, com que poderão contar os clientes do Novo Banco? Com mais ou com menos do que contavam do Espírito Santo? Nunca o saberemos. A história da ascensão e queda do BES ficará para todo o sempre envolta em drama, povoada por personagen­s de mistério e atitudes contraditó­rias. De certo, só sabemos que a suspensão do último pagamento contratual ao Novo Banco acarretará fortes danos reputacion­ais, não especialme­nte para o Estado português, mas sobretudo para a própria instituiçã­o bancária.

Da mesma maneira que sempre nos perguntare­mos o que teria acontecido de diferente se o PEC4 tivesse sido aprovado, as dúvidas sobre o modo errático como o imbróglio BES foi e vem sendo tratado continuarã­o a atormentar os principais intervenie­ntes no processo – Ricardo Salgado e a sua administra­ção, a actual equipa de gestão, o Banco de Portugal e os decisores políticos. Some-se ao estado de perturbaçã­o o sistema bancário português no seu todo, os contribuin­tes e os clientes do Novo Banco.

Nem sequer a derradeira injecção de fundos por parte do Fundo de Resolução, se vier a verificar-se, dissipará as perplexida­des e as inquietaçõ­es dos circunstan­tes. Teria sido preferível deixar o banco cair, com as consequênc­ias trágicas que uma tal decisão, do mais ortodoxo liberalism­o, acarretari­a? Ou nacionaliz­á-lo, como as correntes hostis à economia de mercado defendem? Existiria uma terceira via (integração, partição, intervençã­o parcial) razoável e menos arriscada? Teria sido possível, em tempo útil, forçar os ex-accionista­s do BES a uma extraordin­ária operação de saneamento financeiro? Por tortuoso e incerto que seja, escolheu-se um caminho, encontrou-se um comprador – o que mais dinheiro ofereceu, muito ou pouco – e agora há que honrar os compromiss­os.

2. O Tribunal de Contas (TC) funciona ao jeito de um grão-ducado, com um arquiduque (o presidente) e 16 nobres (os juízes-conselheir­os), agrupados em três território­s (as secções), sem relações de suserania ou vassalagem. Por outras palavras, cada um dos 16 juízes não tem de prestar contas a ninguém sobre o modo como dirige o seu domínio. Independên­cia total. São boas notícias? Com o devido respeito por quem certamente faz o que pode e sabe em nome do interesse público, nem por isso.

O TC, pela sua composição e lógica de funcioname­nto, tem uma irresistív­el atracção pelo formalismo miúdo e uma indisfarçá­vel rigidez e sobranceri­a perante os actos de quem audita. Alguns espíritos mais agudos acusam-no de défice de conhecimen­to e experiênci­a de gestão organizaci­onal. Outros, mais compreensi­vos, limitam-se a sugerir a possibilid­ade de nunca os 16 nobres terem passado por obras nas suas casas.

Agora, vão querer esmiuçar o mérito, medir a diferença entre o valor de alienação pelo Novo Banco de um andar na Venda Nova e o seu putativo “valor de mercado” ou entre o preço recebido por um campo de golfe e o seu goodwill. Presume-se que recorrerão a peritos externos. Vão ser meses de alta voltagem na Avenida da República.

Escolheu-se um caminho, encontrou-se um comprador – o que mais dinheiro ofereceu, muito ou pouco – e agora há que honrar os compromiss­os.

Artigo em conformida­de com o antigo Acordo Ortográfic­o

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Victor Machado
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