CMVM quer melhorar compensação a investidores lesados
A CMVM está a discutir com o Ministério da Justiça a criação de mecanismos de resolução de litígios que permitam que os lesados de práticas ilegais nos mercados financeiros sejam compensados de forma mais célere. O processo vai exigir mudanças legislativas.
AComissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) quer que os lesados das práticas ilegais que sejam cometidas pelos operadores de mercado sejam compensados de forma mais célere. A solução, defende a presidente da entidade reguladora, Gabriela Figueiredo Dias, passa por criar mecanismos de resolução de litígios com as entidades supervisionadas que permitam a “recuperação do dano”. A CMVM já está em discussões com o Ministério da Justiça para avançar com uma solução desta natureza, mas o processo será longo.
Embora não sejam ainda fornecidos detalhes sobre o mecanismo pretendido pela CMVM, este era um dos objetivos que tinham sido traçados para este ano pelo regulador dos mercados: “Reforçar os mecanismos dissuasores de más práticas e a ação sancionatória, incluindo nas matérias referentes a avaliação de idoneidade, assegurando decisões mais tempestivas e eficazes ao nível da supervisão e do contencioso, e uma comunicação mais clara sobre as principais infrações e respetivas sanções, com objetivos de prevenção geral e especial de infrações e da eficácia da ação em benefício do mercado e dos investidores”, pode ler-se na lista de prioridades da CMVM para 2020.
Agora, adianta Gabriela Figueiredo Dias, estão a ser dados novos passos nesse sentido. “Temos a ambição de, progressivamente, implementar mecanismos de resolução de litígios que permitam a recuperação do dano ao investidor lesado. Esta não é uma prática normal em Portugal”, começou por referir sobre este assunto, durante uma audição na comissão parlamentar de orçamento e finanças.
Mas ressalvou: “Estamos longe das práticas europeias nesta matéria. Estamos em conversações com o Ministério da Justiça no sentido de agilizar estes mecanismos, mas é preciso haver alterações profundas à legislação. Contudo, o futuro passa, claramente, por mecanismos que privilegiem, em primeira instância, a reparação do dano ao investidor, como acontece na maioria dos países europeus”.
Esta intenção surge depois de processos como o do Banco Espírito Santo (BES) e o do Banif, que causaram perdas avultadas a milhares de investidores não qualificados, ou, mais recentemente, o da Orey Financial, condenada a uma multa por prestar informações falsas aos clientes.
“Em todos estes processos houve lesados”, admite Gabriela Figueiredo Dias. Todos estes casos são, também, litigiosos, uma vez que os arguidos impugnaram as decisões da CMVM, levando os processos a arrastar-se e, consequentemente, atrasando as compensações devidas aos lesados. É esse adiamento que a CMVM quer evitar. Não foram, contudo, adiantados prazos para o cumprimento desta meta.
Cativações atrasam projetos
Ainda durante a audição, Gabriela Figueiredo Dias admitiu que as cativações orçamentais ao longo deste ano já obrigaram à suspensão de projetos considerados prioritários, incluindo alguns que já tinham sido aprovados para receber fundos europeus.
“Os limites impostos têm colocado entraves, designadamente em projetos cujo cofinanciamento europeu já estava aprovado e que poderão ficar comprometidos com a não aprovação da utilização de reservas de que a CMVM dispõe”, disse, questionada sobre o impacto das cativações sobre a atividade regulatória e de supervisão.
A CMVM já pediu ao Minis
Os limites impostos [cativações] têm colocado entraves, designadamente em projetos cujo cofinanciamento europeu já estava aprovado. “GABRIELA FIGUEIREDO DIAS Presidente da CMVM
“Temos a ambição de implementar mecanismos de resolução de litígios que permitam a recuperação do dano ao investidor lesado. Esta não é uma prática normal em Portugal.
tério das Finanças que estas reservas possam ser utilizadas. “Temos uma situação de algum impasse relativamente a alguns projetos, alguns dos quais de extrema importância”, afirmou.
Entre eles está a criação do balcão único eletrónico, destinado às entidades supervisionadas, que era uma das metas para este ano. Face às restrições orçamentais, a finalização deste projeto está agora prevista para 2021.
No próximo ano, o Governo ficará impedido de impor às entidades reguladoras cativações sobre as suas receitas próprias, depois de o Parlamento ter aprovado uma proposta de alteração do PSD ao Orçamento do Estado para 2021. Esta, considera Gabriela Figueiredo Dias, é uma medida positiva, mas que deveria ser tornada definitiva.
“É relevante o facto de existir uma regra inscrita que impede cativações sobre os reguladores. Só peca por não ser uma norma permanente. Devíamos evoluir para algo que não ficasse à mercê das votações do Orçamento do Estado”, sublinhou.