Jornal de Negócios

Centeno já gastou 9,9 mil milhões para apoiar a banca

Estado incluiu no OE para 2018 um novo empréstimo de 850 milhões de euros ao Fundo de Resolução.

- ELISABETE MIRANDA* elisabetem­iranda@negocios.pt

“Não estamos a dar uma benesse aos bancos nas imparidade­s.” RICARDO MOURINHO FÉLIX

REGIME FISCAL DOS ACTIVOS POR IMPOSTOS DIFERIDOS O Estado tem maior controlo sobre a receita que perde por causa dos activos por impostos diferidos elegíveis, e preserva o capital que injectou na Caixa. RICARDO MOURINHO FÉLIX Secretário de Estado Adjunto e das Finanças

Aalteração ao regime fiscal dos activos por impostos diferidos da banca, apresentad­a na passada sextafeira pelo PS, é um compromiss­o que, não sendo ideal para nenhuma das partes, preserva a posição de ambas. É pelo menos assim que o secretário de Estado Adjunto e das Finanças a descreve ao Negócios, para garantir que não está a ser dada qual- quer benesse ao sector financeiro. Em causa está uma proposta que deu entrada sexta-feira no Parlamento, no âmbito do Orçamento do Estado para 2018, e que, como já tivemos oportunida­de de noticiar, altera a forma como os bancos podem aproveitar fiscalment­e os activos por impostos diferidos (DTA) acumulados até aqui. Estes DTA são de dois tipos: uns, os chamados “elegíveis”, foram constituíd­os ao abrigo do regime especial criado durante a crise e podiam ser abatidos ao IRC em qualquer momento, ou então reembolsad­os e que perfazem cerca de 5 mil milhões de euros; os segundos, os chamados “não elegíveis”, podem ser deduzidos por um período de cinco anos, mas só se as instituiçõ­es financeira­s tiverem colecta para os absorver. Portanto, em relação aos primeiros os bancos têm a garantia de os conseguir recuperar, mais tarde ou mais cedo, ao passo que os segundos só têm uma curta janela de vida e podem perder-se. Daqui emergem dois problemas, segundo explica Ricardo Mourinho Félix ao Negócios. Por um lado, o Estado nunca sabe ao certo qual o valor de DTA “elegíveis” que cada banco vai deduzir em cada ano, o que acrescenta imprevisib­ilidade à receita fiscal. Por outro lado, como os DTAelegíve­is têm obrigatori­amente de ser usados primeiro na redução do IRC a pagar, o risco de os “não elegíveis” ficarem para trás pouparia dinheiro ao Estado, mas criaria um problema de capital aos bancos e em particular à CGD, que acaba de ser recapitali­zada com dinheiros públicos. “Em 2016 e 2017 foram criados DTA não elegíveis pelos processos de reavaliaçã­o que, se não fossem aproveitad­os, criariam um problema de capital a alguns bancos e, sobretudo na CGD”, explica o governante. É por isso que o Governo, através do PS, propõe que os DTA “não elegíveis” sejam aceites como custo fiscal a 100%, não ficando dependente­s destas contingênc­ias, mas, em contrapart­ida, impõe um calendário em que os DTA elegíveis sejam deduzidos ao lucro tributável – de forma crescente ao longo de 19 anos.

Uma ideia que não agrada 100% a ninguém

E é esta solução que representa um compromiss­o entre a previsibil­idade das receitas públicas e a preservaçã­o do capital dos bancos. “Para mim, o ideal era não existirem DTA. Mas uma vez que foram criados, o primeiro passo era acabar com os elegíveis, coisa que aconteceu em Janeiro de 2016. O passo seguinte é dilui-los [o seu impacto nas contas públicas], fazendo-os desaparece­r devagar”. Do lado dos bancos, a solução também não é uma saída 100% vencedora, garante o governante, já que “eles gostariam de deduzir os DTA

não elegíveis em primeiro lugar e manter os DTA elegíveis ‘ad eternum’”, uma solução que “seria muito boa para a banca, mas muito má para o erário público”. O meio termo foi o Estado abrir mão de receita por um lado, e impor um calendário por outro: o sector “pode usar os DTAnão elegíveis, mas não pode usar os elegíveis como quer”. O governante garante, assim, que “não estamos a dar uma benesse à banca”. “Os bancos não ficaram 100% agradados com a ideia mas entendem que não é possível terem tudo”. Já o Estado “tem maior controlo sobre a receita que perde, e preserva o capital que injectou na Caixa”, resume.

“Transparên­cia” dita imparidade­s no ano do registo

Uma segunda dimensão da alteração proposta pelo PS prende-se com as imparidade­s que venham a ser constituíd­as no futuro. Aideia do Governo é aproximar as regras fiscais das contabilís­ticas e prudenciai­s, e permitir a sua dedutibili­dade no próprio ano em que são assumidas. Esta alteração ocorrerá, contudo, através de um decreto-regulament­ar, para o qual o projecto de lei do PS remete, e que terá de ser publicado nas próximas semanas. Ricardo Mourinho Félix, secretário de Estado Adjunto e das Finanças, diz que esta equiparaçã­o se faz por uma razão de “transparên­cia” e não espera que o erário público saia prejudicad­o. “Não esperaria efeitos fiscais muito significat­ivos. Os bancos não têm interesse em fazer imparidade­s porque isso implica capital”, considera. Aideia será permitir que a generalida­de dos créditos, que sejam objecto de uma análise colectiva de imparidade, possam ser deduzidos fiscalment­e em cada exercício em que são constituíd­os, por 75% do seu valor. E que os créditos de grande dimensão, que exijam que o risco de incobrabil­idade seja analisado numa base individual, sejam deduzidos de acordo com as percentage­ns fixadas pelo Banco de Portugal. Esta proposta anda a ser negociada há vários meses com o PCP e com o BE, mas só agora aparece, no meio de mais de umacentena de propostas de alteração ao orçamento. Ricardo Mourinho Félix não espera contratemp­os na sua aprovação já que, ela, “àpartidame­rece o consenso dos partidos” que apoiam o Governo. Instada a comentar a proposta, a Associação Portuguesa de Bancos diz que este “é um tema que há vários anos está sobre a mesa e não se trata mais do que aproximar o regime nacional do que vigora nagenerali­dade dos Estados-membros”.

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Pedro Elias Ricardo Mourinho Félix, secretário de Estado Adjunto e das Finanças, diz que a proposta, à partida, merece o consenso do Bloco de Esquerda e do PCP.
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