Um orçamento inócuo
OOrçamento do Estado para 2019 (OE 2019) não merece elogio ou crítica. Para quem esperava que o OE 2019 levasse o país à bancarrota será excessivo prevê-la. Para quem esperava uma recompensa financeira significativa pelo bom comportamento durante três anos poderá ficar desiludido. E para quem acredita que o bom desempenho económico dos últimos três anos resulta da qualidade da ação governativa pode continuar a acreditar. O OE 2019 alimenta as esperanças e as desilusões de quase todos permitindo-lhes manter as suas crenças sobre a governação.
Um orçamento por duodécimos não seria muito diferente do apresentado nos seus mapas financeiros e nas suas consequências económicas agregadas.
Os dois números mais impressivos previstos para 2019 são a dívida pública em percentagem do PIB, 118,5% e o défice orçamental de 0,2%. Note-se que um orçamento pior do que o atual poderia ter uma dívida de 120% e um défice público de 1%, e um melhor poderia ter uma dívida de 117% e um ligeiro excedente orçamental.
Qualquer destes resultados no fi- nal de 2019 seria bom em si mesmo e inesperado para a maioria dos observadores no final de 2015 quando o atual Governo tomou posse. Uma descida do peso da dívida pública no PIB de cerca de 10 pontos percentuais em quatro anos era apresentada como impossível, pela maioria dos analistas. Os bons resultados são uma agradável surpresa para o próprio Governo. E também para os portugueses, a Comissão Europeia, o FMI e os mercados financeiros.
É certo que há uma discrepância difícil de compreender sobre o valor das medidas de consolidação orçamental no próximo ano. Um agravamento de cerca de 0,1 pontos do PIB no relatório do orçamento, mas que na proposta em inglês apresentada em Bruxelas se transforma numa melhoria do saldo orçamental de cerca de 0,4 pontos percentuais do PIB potencial. Há poucas medidas com significado.
Numa primeira leitura rápida dos documentos do OE 2019, o maior agravamento da despesa, em termos líquidos, resulta do descongelamento das carreiras na função pública que custará 274 milhões de euros. Em rigor esta não é uma medida do OE 2019, apenas uma pressão orçamental resultante das decisões de 2018. A receita adicional com os dividendos do Banco de Portugal e da Caixa Geral de Depósitos, que se perspetivam ser 326 milhões de euros, também não deve ser vista como medida.
As várias medidas na área das pensões, para várias classes de pensionistas, são volumosas em conjunto, cerca de 380 milhões de euros, e provavelmente maiores do que o que recomenda a prudência, mas estão dentro da esfera normal de autonomia de um Governo com um défice orçamental já inferior a 1%.
Os observadores vêm nesta visão demograficamente segmentada da política orçamental, com verbas significativas para funcionários pú- blicos, pensionistas, e medidas pontuais para os jovens e estudantes, ainda que pouco volumosas, como os passes nos transportes ou a redução do limite máximo das propinas universitárias, como uma tentativa de condicionar os eleitores. Talvez o Governo venha a ser bem-sucedido neste desiderato. Mas quem desconfia da atual forma de governar poderá ler negativamente a proposta de permuta ostensiva com os eleitores potenciais. O efeito desta, alegada, tática é assim incerto.
O cenário macroeconómico do OE 2019 tem vindo a ser criticado por ser demasiado otimista ao antecipar um crescimento do PIB de 2,2% em 2019, contrastado, por exemplo, com a previsão mais recente do FMI de apenas 1,8%. O nosso núcleo, o Católica Lisbon Forecasting Lab, chega porém a um ponto central de previsão do crescimento do produto até um pouco maior do que o do Governo, 2,3%. As previsões das várias entidades são porém mais próximas do que parecem já que intervalos de previsão razoáveis para acomodar a incerteza incluirão certamente o ponto central de todas.
A principal diferença entre entidades parece resultar dos diversos métodos de cálculo do crescimento potencial da economia, sendo o valor de 2,0%, apresentado pelo Governo para o próximo ano, consistente com os nossos próprios cálculos, mas certamente mais elevado do que as demais instituições nacionais e internacionais. E todas antecipam, felizmente, a manutenção da balança corrente e de capital com o exterior em território marginalmente positivo.
O OE 2019 é consistente com a opção por uma certa inação, ou mesmo tempo perdido, usada pelo Governo em toda a legislatura. O que sugere que o ajustamento estrutural feito até 2015 terá sido suficiente para estabilizar financeiramente a economia portuguesa. Embora as reformas efetuadas sejam insuficientes para criar os ganhos de produtividade necessários à melhoria sustentada dos rendimentos dos portugueses.
O OE 2019 é inócuo e penso que pouco se perderia se houvesse eleições antecipadas em breve e fôssemos governados por duodécimos durante alguns meses com políticas invariantes. Estamos incomparavelmente melhor do que em 2011.
O OE 2019 é consistente com a opção por uma certa inação, ou mesmo tempo perdido, usada pelo Governo em toda a legislatura.
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