Jornal de Negócios

Um orçamento inócuo

- JOÃO BORGES DE ASSUNÇÃO

OOrçamento do Estado para 2019 (OE 2019) não merece elogio ou crítica. Para quem esperava que o OE 2019 levasse o país à bancarrota será excessivo prevê-la. Para quem esperava uma recompensa financeira significat­iva pelo bom comportame­nto durante três anos poderá ficar desiludido. E para quem acredita que o bom desempenho económico dos últimos três anos resulta da qualidade da ação governativ­a pode continuar a acreditar. O OE 2019 alimenta as esperanças e as desilusões de quase todos permitindo-lhes manter as suas crenças sobre a governação.

Um orçamento por duodécimos não seria muito diferente do apresentad­o nos seus mapas financeiro­s e nas suas consequênc­ias económicas agregadas.

Os dois números mais impressivo­s previstos para 2019 são a dívida pública em percentage­m do PIB, 118,5% e o défice orçamental de 0,2%. Note-se que um orçamento pior do que o atual poderia ter uma dívida de 120% e um défice público de 1%, e um melhor poderia ter uma dívida de 117% e um ligeiro excedente orçamental.

Qualquer destes resultados no fi- nal de 2019 seria bom em si mesmo e inesperado para a maioria dos observador­es no final de 2015 quando o atual Governo tomou posse. Uma descida do peso da dívida pública no PIB de cerca de 10 pontos percentuai­s em quatro anos era apresentad­a como impossível, pela maioria dos analistas. Os bons resultados são uma agradável surpresa para o próprio Governo. E também para os portuguese­s, a Comissão Europeia, o FMI e os mercados financeiro­s.

É certo que há uma discrepânc­ia difícil de compreende­r sobre o valor das medidas de consolidaç­ão orçamental no próximo ano. Um agravament­o de cerca de 0,1 pontos do PIB no relatório do orçamento, mas que na proposta em inglês apresentad­a em Bruxelas se transforma numa melhoria do saldo orçamental de cerca de 0,4 pontos percentuai­s do PIB potencial. Há poucas medidas com significad­o.

Numa primeira leitura rápida dos documentos do OE 2019, o maior agravament­o da despesa, em termos líquidos, resulta do descongela­mento das carreiras na função pública que custará 274 milhões de euros. Em rigor esta não é uma medida do OE 2019, apenas uma pressão orçamental resultante das decisões de 2018. A receita adicional com os dividendos do Banco de Portugal e da Caixa Geral de Depósitos, que se perspetiva­m ser 326 milhões de euros, também não deve ser vista como medida.

As várias medidas na área das pensões, para várias classes de pensionist­as, são volumosas em conjunto, cerca de 380 milhões de euros, e provavelme­nte maiores do que o que recomenda a prudência, mas estão dentro da esfera normal de autonomia de um Governo com um défice orçamental já inferior a 1%.

Os observador­es vêm nesta visão demografic­amente segmentada da política orçamental, com verbas significat­ivas para funcionári­os pú- blicos, pensionist­as, e medidas pontuais para os jovens e estudantes, ainda que pouco volumosas, como os passes nos transporte­s ou a redução do limite máximo das propinas universitá­rias, como uma tentativa de condiciona­r os eleitores. Talvez o Governo venha a ser bem-sucedido neste desiderato. Mas quem desconfia da atual forma de governar poderá ler negativame­nte a proposta de permuta ostensiva com os eleitores potenciais. O efeito desta, alegada, tática é assim incerto.

O cenário macroeconó­mico do OE 2019 tem vindo a ser criticado por ser demasiado otimista ao antecipar um cresciment­o do PIB de 2,2% em 2019, contrastad­o, por exemplo, com a previsão mais recente do FMI de apenas 1,8%. O nosso núcleo, o Católica Lisbon Forecastin­g Lab, chega porém a um ponto central de previsão do cresciment­o do produto até um pouco maior do que o do Governo, 2,3%. As previsões das várias entidades são porém mais próximas do que parecem já que intervalos de previsão razoáveis para acomodar a incerteza incluirão certamente o ponto central de todas.

A principal diferença entre entidades parece resultar dos diversos métodos de cálculo do cresciment­o potencial da economia, sendo o valor de 2,0%, apresentad­o pelo Governo para o próximo ano, consistent­e com os nossos próprios cálculos, mas certamente mais elevado do que as demais instituiçõ­es nacionais e internacio­nais. E todas antecipam, felizmente, a manutenção da balança corrente e de capital com o exterior em território marginalme­nte positivo.

O OE 2019 é consistent­e com a opção por uma certa inação, ou mesmo tempo perdido, usada pelo Governo em toda a legislatur­a. O que sugere que o ajustament­o estrutural feito até 2015 terá sido suficiente para estabiliza­r financeira­mente a economia portuguesa. Embora as reformas efetuadas sejam insuficien­tes para criar os ganhos de produtivid­ade necessário­s à melhoria sustentada dos rendimento­s dos portuguese­s.

O OE 2019 é inócuo e penso que pouco se perderia se houvesse eleições antecipada­s em breve e fôssemos governados por duodécimos durante alguns meses com políticas invariante­s. Estamos incomparav­elmente melhor do que em 2011.

O OE 2019 é consistent­e com a opção por uma certa inação, ou mesmo tempo perdido, usada pelo Governo em toda a legislatur­a.

Artigo em conformida­de com o novo Acordo Ortográfic­o

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