DO CAMPO DO FORNO À “SALA DE VISITAS” DA CIDADE
Muitos antes de Viana, até aí designada como “do Minho” ou “da Foz do Minho”, se ver denominada como “do Castelo” – facto que ocorre com a sua elevação a cidade em 1848 –, já a sua praça principal era a da República. Não tinha obviamente nessa altura tal designação, que só veio a adquirir após a queda da monarquia, em 1910. Durante muito tempo, foi a Praça da Rainha e anteriormente o Campo do Forno. Certo é que, desde os inícios do século XVI e até hoje, este é o coração de Viana. Aqui afluíam as principais artérias que rumavam para o burgo. À sua volta, fixaram-se desde cedo os Paços do Concelho,ho, a Misericórdia e muitas das principais lojas e estabelecimentos comerciais da povoação. Escritórios, bancos, gabinetes de médicos, tabacarias, cafés, esplanadas… Esta era, continua a ser, a sala de visitas da grande cidade do Alto Minho. Um lugar, vvivo, de Memória.
Terra de mareantes, marinheiros e homens do comércio marítimo, envolvendo aqui não só a burguesia mas também alguma aristocracia, Viana da Foz do Lima está profundamente associada ao processo da expansão marítima portuguesa dos séculos XV e XVI. Não admira por isso que o povoado tenha conhecido nessa época um significativo crescimento demográfico e uma consequente expansão do tecido da povoação, obrigando a algumas e profundas reformas urbanísticas. É nesse contexto que, a partir dos inícios de Quatrocentos, tem lugar a construção de uma nova e mais ampla igreja matriz na velha praça onde, até aí, reunia o Conselho que, por tal motivo, teve que encontrar outro espaço. Que, contudo, não se localizou a muitas dezenas de metros de distância. O local escolhido foi o Campo do Forno. Um espaço até aí periférico mas que, fruto do desenvolvimento e prosperidade do burgo, rapidamente foi por ele absorvido. Aliás, e no espaço de pouco mais de um século, converteu-se mesmo no mais relevante centro da vida política, comercial e de representação social da povoação.
Foi logo nos primeiros anos da centúria seguinte – a de XVI – que, por ordem do rei D. Manuel I, foi erguido nesta praça aquele que, até aos nossos dias, é o imóvel que a domina: os Paços do Concelho. Um edifício gótico e robusto, com algumas semelhanças a outras construções camarárias concebidas nessa altura, nomeadamente na Alemanha. Dotado de dois pisos, o superior abrigava a sala das sessões camarárias que funcionava igualmente como tribunal. No térreo, sob as arcadas, realizava-se o mercado da farinha e do pão que, em 1526, sabemos ter sido guarnecido de bancas e assentos para os vendedores. A vocação comercial da praça era assim sublinhada e jamais deixaria de a caracterizar, ao mesmo tempo que concorria para que este se tornasse igualmente no local favorecido e favorito de encontro dos vianenses.
Pouco antes, em 1521, fora criada a Misericórdia de Viana que, também ela, escolherá este como um espaço provilegia-
do. Aqui arrancará, pouco depois, a edificação da sua igreja e, alguns anos depois, o hospital e a Casa da Misericórdia – a “Casa das Varandas” –, rapidamente tornada uma das referências e ex-líbris da povoação (ver caixa). O templo, contíguo, foi remodelado de um modo significativo nos inícios do século XVIII e é um belo e pedagógico exemplo do que foi o barroco português, já que nos permite observar em simultâneo e num discurso harmonioso uma grande e diversificada riqueza decorativa, que conjuga a talha dourada com revestimentos em azulejo e pintura de frescos no teto.
Mas, e regressando ao exterior e à praça, um outro elemento arquitetónico emblemático, que a domina desde meados do século XVI e merecedor da nossa atenção, é o seu monumental chafariz. Para lá da importância artística, ele relembra também que a sua existência foi crucial para que este espaço se tenha convertido numa das referências do burgo, uma vez que durante séculos foi o principal ponto de abastecimento de água potável à população.