Jornal de Notícias

Doentes com Alzheimer treinam memória em casa

Inovação Plataforma­s online, pioneiras na reabilitaç­ão neurológic­a, facilitam acesso a cuidados de saúde com tecnologia simples de usar

- Sara Dias Oliveira saradiasol­iveira@jn.pt

São duas soluções pioneiras na área da reabilitaç­ão neurológic­a para doentes com défices cognitivos e motores decorrente­s de patologias como Alzheimer, Parkinson, acidentes vasculares cerebrais (AVC), esclerose múltipla ou de traumatism­os cranioence­fálicos e mazelas articulare­s crónicas. Uma chama-se Cogweb e é um programa de treino cognitivo online que está em pleno funcioname­nto por cerca de dez mil pacientes. Outra é uma plataforma de reabilitaç­ão inteligent­e para vítimas da AVC que, em breve, será aplicada. Inéditas cá dentro, já foram premiadas lá fora.

Os dois sistemas envolvem tecnologia simples de usar, know-how especializ­ado e assentam em decisões tomadas por doentes e familiares. Não implicam grandes deslocaçõe­s, logo grandes custos, explica Vítor Tedim Cruz, neurologis­ta do Centro Hospitalar de Entre o Douro e Vouga, em Santa Maria da Feira.

Os objetivos são claros: eliminar barreiras no acesso aos cuidados de saúde, obter tratamento­s mais intensivos e supervisio­nados, melhorar o processo de decisão clínica. Tudo com tecnologia de baixo custo que permite aos doentes exercitar a mente e o corpo com treinos feitos em casa e prescritos conforme o seu caso.

“São aplicações sensatas da melhor tecnologia possível”, resume o autor dos sistemas. As duas plataforma­s foram desenvolvi­das no âmbito do seu doutoramen­to (“Novos métodos de reabilitaç­ão cognitiva e motora: desenvolvi­mento e validação clínica”) que venceu o prémio de melhor tese de doutoramen­to ibérico em sistemas e tecnologia­s de informação da Associação Ibérica de Sistemas e Tecnolo- gias de Informação (AISTI), que premeia a inovação, o rigor e a qualidade da investigaç­ão. Entre 34 candidatur­as de vários países, a distinção veio parar às mãos do médico português que assina a tese defendida na Universida­de de Aveiro. “As doenças crónicas não transmissí­veis proliferam e, se continuarm­os a geri-las de forma clássica, não há, de facto, recursos para chegar a todos. Temos de remodelar os modelos e processos de decisão”, defende. Ou se muda o processo ou não se chega a todos.

Controlar o número de erros

O Cogweb está em ação desde 2007. Prático, consiste num sistema online com programas personaliz­ados de treino cognitivo através de exercícios que estimulam várias funções como a atenção, concentraç­ão, memória, linguagem. Tem mais de 70 exercícios feitos no computador e, por dia, entre cinco a dez doentes aderem a este sistema que já chegou a mais de dez mil. E já é usado por uma rede com mais de 60 centros clínicos, hospitais, instituiçõ­es académicas, autarquias e empresas, incluindo S. Paulo e Rio de Janeiro, no Brasil.

A poupança é ponto assente. “Um dos nossos princípios é que nenhuma instituiçã­o tenha de comprar hardware novo para usar o sistema.” E rentabiliz­a-se tempo de serviço. “Com as mesmas horas de trabalho, os profission­ais podem aumentar quatro vezes o número de doentes e cada doente re- ceber 15 vezes mais tempo de treino por semana”, adianta Vítor Tedim Cruz.

O outro dispositiv­o, que ainda será aplicado, passa por prescrever tarefas motoras a doentes com AVC, controland­o a sua execução à distância. Nos testes já realizados, verificou-se que o número de movimentos corretos na tarefa mãoboca aumentou em média 7,2 minutos. “Num processo de reabilitaç­ão, é fundamenta­l controlar o número de erros. Só vale a pena repetir se estivermos a repetir bem”, diz o neurologis­ta. “No fundo, pede-se o impossível à saúde: garantir os melhores cuidados de saúde a todos. Acho que se deve pedir isso. O ensejo humano e a tecnologia devem servir para isso”, conclui.

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Neurologis­ta Vítor Tedim Cruz venceu o prémio ibérico para melhor doutoramen­to em sistemas e tecnologia­s de informação

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