E do mar nasceu… a revolução
Cinema Curtas Vila do Conde arranca hoje. São nove dias de festival com 241 filmes para ver
Arranca hoje, e com um aceno especial à pequenada, o Curtas Vila do Conde. Às 17 horas, passa “À procura de Dory”. À noite, às 21 horas, “Diamond Island”, de Davy Chou, que em 2014 ganhou o Grande Prémio do Curtas. Durante nove dias, o festival celebra o cinema. Há 241 filmes de 46 países para ver. As competições – nacional, internacional, experimental, “Take One!” e curtinhas – são o prato principal. Depois, há sete filmes-concerto (o dos ingleses “Tindersticks”, na quarta-feira, está esgotado), duas exposições, 14 conversas, debates e confe- rências. São esperadas 23 mil pessoas.
Amanhã, “E do mar nasceu” (17 horas) é um dos pontos altos e a ligação à terra, numa parceria entre o Curtas e a Bind’Ó Peixe-Associação Cultural. Uma curta documental quase desconhecida, de 1977, filmada na maior comunidade piscatória do país, que, a pulso, tentava fazer a revolução de Abril.
“Era uma vida muito dura. Ia para a praia vender peixe com os meus três filhos pequeninos dentro do carrinho de mão”, explica Carolina Nunes, que, na curta de Ricardo Costa, representa a típica família da pescaria. Sónia Nunes, a filha, está lá com três aninhos, a adivinhar a queda para o cinema. Ela que, já adulta e peixeira por vocação, haveria de protagonizar o filme de João Canijo “É o amor” (2013).
A Revolução dos Cravos chegava por esses dias às Caxinas. É essa a história da curta de Ricardo Costa. Ali, volvidos três anos sobre Abril, a comunidade piscatória tentava a sua “revolução”: nasciam cooperativas de pesca, a desafiar a tradicional repartição de lucros entre mestre e camaradas; surgia a A artista Martinha Maia venceu o desafio lançado pelo Teatro Carlos Alberto, de intervenção artística na fachada do edifico. No total, foram 36 as propostas analisadas pelo júri e pelo público. A implementação decorre em agosto e será revelada em setembro. Associação Pró-Progresso das Caxinas, Poça da Barca e Lugares Anexos, a lutar pelo desenvolvimento e a ameaçar reclamar a autonomia, depois de décadas de isolamento, quase renegada pelo poder político.
“Não éramos doutorados, nem políticos. Éramos gente do povo, que queria lutar pela nossa terra. Servi a minha terra e não estou arrependido”, conta António Ramos, o presidente da dita associação. Dizia-se à boca cheia, em Matosinhos e Aveiro, “que Cristo não havia passado nas Caxinas”. Ali viviam à época 15 mil pessoas, mais gente do que na própria cidade de Vila do Conde. Não havia ruas pavimentadas, nem saneamento, nem escolas, nem polícia, nem sequer cemitério. Em nove anos, entre 1976 e 1985, as Caxinas ganharam “e muito”: um cemitério, uma nova igreja, ruas pavimentadas, escolas, luz elétrica, saneamento… Não vingaram as cooperativas de peixe, nem vingou a associação, mas as Caxinas ganharam o respeito que exigiam. Amanhã, a curta passa numa sessão especial, seguida de debate com alguns dos protagonistas ainda vivos.