Andar na nuvem
Era uma vez um reino onde havia uns nobres que nada sabiam nem queriam saber e tinham mesmo raiva a quem sabia. Viviam na nuvem acima dos sacrificados mortais que, coitados, percebiam tudo e pasmavam perante tanta ignorância e falta de memória. Porque nisto do conhecimento e do saber das coisas, a memória tem muita importância para quem quer ou está interessado em aceder aos patamares que permitem iluminar com outra clareza a verdade e o rigor dos factos que fazem a vida. Que, pelos vistos, não era o caso destes nobres.
Contudo, há sempre e cada vez mais a tal “nuvem”, para onde dizem que vai todo o conhecimento cibernético e, pela complexa e difusa constituição deste, se torna progressivamente mais perigosa e esquiva a procura de quem pretende apurar a verdade e o rigor dos factos. Nem todos os comuns mortais do reino têm o privilégio de disfarçar a sua ignorância e falta de conhecimento na dita nuvem toda poderosa e capaz da apagar a memória e diluir responsabilidades, só alguns privilegiados que nela se movimentam com impunidade, rindo mesmo da ingénua expectativa dos que gostavam de ver ser feita justiça célere e eficaz a quem abusa de tanta falta de memória.
Dizem os arautos da notícia e concorda o comum dos mortais que o reino está corrompido e lembram o “Sermão de Sto António aos Peixes” do Padre António Vieira, quando fala do “sal e da terra” para impedir a corrupção, mas lembram também que já vão distantes essas palavras e hoje “a palavra” não tem o mesmo valor, dizem alguns que perdeu qualquer valor.
Mas há sempre quem acredite na capacidade de justeza do vento para limpar a nuvem destas impurezas e falhas de memória que tão perniciosas se tornam à vida do reino, dizem que é “fé republicana” dos que defendem a liberdade e igualdade de direitos para todos e acreditam na justiça como forma de regenerar este fictício reino. Embora os leitores percebam que não é tão fictício, como simula a crónica.