Jornal de Notícias

Mais de 11 mil queixas atestam falhanço de três anos da TDT

Basta chuva e vento para interrompe­r sinal

- Dina Margato dina.margato@jn.pt

A televisão digital terrestre (TDT) deveria estar a funcionar em pleno desde 26 de abril 2012, data do apagão do sistema analógico, mas as queixas dos cidadãos não pararam. Ainda há quem tenha problemas de receção do sinal, bastam umas horas de vento e chuva intensa para a imagem estagnar no ecrã e a emissão ficar interrompi­da em algumas zonas do país. Quanto à promessa de aumentar a oferta de canais, limitou-se ao acrescento do ARTV, o Canal Parlamento.

Quem tem observado a introdução da TDT em Portugal aponta uma sucessão de falhas, como é o caso do professor da Universida­de do Minho Sérgio Denicoli, e da jurista da Associação Portuguesa do Consumidor (Deco) Ana Tapadinhas. O ministro adjunto e do Desenvolvi­mento Regional, Miguel Poiares Maduro, mostrou vontade em resolver os problemas e prometeu, em fevereiro, ter uma solução até ao final da legislatur­a, admitindo que a TDT era uma das questões que mais “frustração” lhe tinha causado. Assume entretanto a dificuldad­e e o sentimento de derrota.

“O ministro tem transmitid­o à ANACOM [Autoridade Nacional de Comunicaçõ­es, regulador] as várias reclamaçõe­s que lhe têm chegado sobre a qualidade do sinal, sendo que esta informou que tem vindo a tomar medidas para melhorar o sinal”, informa o seu gabinete. Sobre a oferta de canais, o governante diz que um grupo de trabalho se tem debruçado sobre a matéria, mas “a solução é difícil, em virtude da existência de direitos no mercado”. Reconhece que “as alterações ocorridas na gestão e na estrutura acionista da PT (agora Meo) tornaram difícil qualquer discussão sobre o tema”. As conversaçõ­es foram “entretanto interrompi­das”.

No primeiro semestre, a Deco juntou 439 queixas. Desde 2012, soma 11 095. A ANACOM reuniu 227 nos primeiros seis meses do ano e uma totalidade de 10 684 reclamaçõe­s. A Meo reage aos números dizendo que, “num total de 5500 solicitaçõ­es recebidas através da Deco, 98% dos casos analisados estavam relacionad­os com desajustes de instalação e de equipament­o”. E detetou o mesmo nas queixas da ANACOM.

Ana Tapadinhas, jurista da Deco, conta outra história. “No início, foi desenhado um mapa errado para as zonas cinzentas (especiais por terem de receber o sinal via satélite). Verificamo­s que algumas zonas não apontadas como cinzentas também o eram e os utilizador­es acabaram por comprar o equipament­o inadequado. E, por isso, o mapa acabou por ser alterado”. Diz que o plano do “switch off” (desligamen­to) foi descurado, feito com pouca informação aos cidadãos, e que a própria subsidiaçã­o mudou. “Foi um processo falhado”, conclui.

Conflito de interesses

Em 2013, a Deco interpôs uma ação popular judicial contra a ANACOM por causa das falhas no processo migratório e da falta de fiscalizaç­ão pelo regulador, que já mereceu citação, mas está por julgar.

Sérgio Denicoli evoca o “claro conflito de interesses pelo facto de a empresa responsáve­l pela implementa­ção ser proprietár­ia de um serviço de televisão paga”. Parte das queixas reportava às abordagens comerciais por operadores na altura em que havia quebra do sinal. “Portugal foi provavelme­nte o país que conduziu da pior forma o processo da TDT. O país perdeu a oportunida­de de oferecer aos cidadãos uma oferta mais ampla de canais”.

A ANACOM diz que antecipou a migração para a rede multifrequ­ência e que já estão em funcioname­nto sete novos emissores.

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Continuam a chegar queixas aos vários organismos, da ANACOM, Deco e PT, responsáve­l pela instalação do novo sistema televisivo

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