Campanha aselha
Amulher que até há pouco tempo foi presidente do PS é candidata à Presidência da República. O anúncio surgiu no momento em que o secretário-geral socialista, e candidato a primeiro-ministro, estava em direto numa televisão. Não haveria pior altura para o fazer. Uma ideia transparece: falta qualquer coisa a este partido, ou é mesmo da sua natureza tais inusitadas situações. Maria de Belém havia garantido só falar do assunto após as eleições legislativas. Ontem surpreendeu, emitiu um comunicado a anunciar oficialmente as suas intenções.
A antiga ministra da Saúde de António Guterres bem pode dizer que a prioridade, de momento, são as legislativas. E só apresentará a candidatura em outubro, após o ato eleitoral. Todavia, a apresentação foi ontem, no mesmo dia em que acompanhou António Costa ao Palácio da Justiça para apresentar a lista de deputados à Assembleia da República. Difícil de perceber.
O poder aglutina e faz unir esforços, estratégias e interesses. É assim que os partidos da coligação se encontram (aparentemente) mais unidos, apesar de todas as divergências e crispações que ao longo dos quatro anos tentaram iludir. Nada é irrevogável entre o PSD de Passos e o PP de Portas. Ao contrário, o PS, um partido que aspira a voltar a governar Portugal, surge hesitante, sem ainda ter limpado os ressentimentos das lutas internas, a praticamente um mês de um ato eleitoral decisivo.
António Costa é acusado de ter uma mensagem política vaga, ambígua, de não apresentar ideias claras sobre o que fará se for eleito primeiro-ministro. Há alguma verdade na apreciação. Mas também alguma injustiça. Qualquer declaração que o líder socialista faça é ofuscada por mais uma “aselhice”, como o próprio ontem classificou o episódio dos cartazes.
Quem acreditava que o partido sairia coeso após o processo de sucessão de António José Seguro estava enganado. Seguro mantém-se em silêncio, recolhido na sua vida familiar a desenrolar-se na pacata cidade das Caldas da Rainha. Mas os seguristas, parece ser evidente, não perdoam a quem lhes barrou o caminho. E tudo fazem para dificultar a vida ao atual secretário-geral, mesmo que isso signifique ficar arredados do poder, pelo menos, mais quatro anos. É a “janela de oportunidade” (metáfora muito em voga entre políticos e comentadores políticos), pois sabem que António Costa não resistirá a uma derrota – seria a o fim da sua carreira política.