Estado condenado por falha na comunicação do teste do pezinho
Menina ficou com 78% de incapacidade. Administração Regional de Saúde recorre de indemnização de 90 mil euros e culpa CTT
O Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Penafiel condenou a Administração Regional de Saúde do Norte (ARSN) e o Instituto Nacional de Saúde Ricardo Jorge a pagar 90 mil euros a uma criança e aos pais, por terem falhado na comunicação do resultado, positivo, do “teste do pezinho” aquando do nascimento. Por causa disso, a menina vai sofrer toda a vida: tem atraso no crescimento, vê e ouve mal. Quando atingir a maioridade o seu estado será reavaliado para determinar nova indemnização, por danos biológicos, patrimoniais e não patrimoniais.
O teste foi feito num centro de saúde, que o enviou, por correio normal, ao Instituto Ricardo Jorge, que alega nunca o ter recebido. Extraviou-se. Do alegado descaminho postal, resultou o desconhecimento de que Maria, hoje com 11 anos, sofria de hipotiroidismo congénito, doença curável se fosse tratada nos primeiros dias de vida – o que não aconteceu.
Caso com onze anos O caso remonta a 21 de dezembro de 2005, quando Maria nasceu no Hospital Padre Américo (Penafiel). Seis dias depois, os pais, do Marco de Canaveses, levaram-na a fazer o diagnóstico precoce (“teste do pezinho”) à extensão de saúde de Recezinhos. Ali, após colheita de sangue, foi-lhes dado um código para consultar a página na Internet do Programa Nacional do Diagnóstico Precoce (www.diagnosticoprecoce.pt), onde são divulgados os resultados negativos.
E foi-lhes assegurado que, se o resultado fosse positivo, seriam imediatamente avisados, por telefone, pelo Departamento de Genética Médica do Instituto Ricardo Jorge, ao qual cabe a análise e a obrigação de contacto imediato com os pais do bebé, para que iniciem logo um tratamento que corrige a anomalia detetada, mesmo antes de aparecerem os seus sintomas. A condição para o êxito da terapêutica é ter início entre o 10.º e o 16.º dia de vida do bebé.
Segundo os registos do centro de saúde, o teste teria sido enviado por correio a 28 de dezembro. Depois disso, ninguém contactou os pais que, face à ausência de notícias, se convenceram de que a menina era saudável. Infelizmente, o que se seguiu desmentiu-lhes tragicamente a convicção. Cedo a bebé começou a ter problemas: enorme dificuldade em mamar, o que se refletia de forma clara e negativa no seu desenvolvimento.
Os sinais eram tão evidentes que, na primeira ida ao médico, ele perguntou aos pais se a bebé tinha feito o “teste do pezinho”. Responderam afirmativamente, contando o que lhes disseram no centro de saúde: que a ausência de notícias significava que não havia anomalia grave. O clínico, que conhecia os procedimentos do Plano Nacional do Diagnóstico Precoce, afastou então essa eventualidade.
Internada com urgência Como a bebé, com três meses, não melhorava, o médico ordenou o internamento urgente no Hospital S. João, no Porto, a 28 de março de 2006, com “dismorfia” (deformação), associada a “dificuldade em mamar, regurgitação fácil e má evolução ponderal”.
A bebé definhava. Colocaramlhe uma sonda para se alimentar e foi sujeita a oxigenoterapia. Feitas análises, detetaram-lhe hipotiroidismo congénito. Iniciaram o tratamento, mas era tarde de mais. A menina precisará de viver medicada e da ajuda de terceiros para combater os défices psicomotores.