Jornal de Notícias

Uma linha invisível pode fazer o Brexit tropeçar

Conselho Europeu tenta encontrar uma solução para a fronteira irlandesa. Extensão do período de transição encarada como hipótese

- Emanuel Carneiro emanuel@jn.pt

É invisível, mas é precisamen­te essa particular­idade – ou, melhor, a manutenção desse aspeto – que surge como principal motivo de discórdia nas negociaçõe­s para a saída do Reino Unido da União Europeia. A Irlanda do Norte e a República da Irlanda não querem a reaparição de uma fronteira física entre as duas regiões insulares, extinta há 20 anos, ao abrigo do Acordo de Belfast (ler caixa). Pelos vistos, o Governo britânico e o Executivo europeu também não. O problema é que as soluções avançadas têm falhado no agrado às duas partes.

E uma hipotética extensão do período pós-Brexit – que o Conselho Europeu iniciado ontem, em Bruxelas, não desdenha – não pode servir de desculpa para a subalterni­zação da questão fronteiriç­a. Leo Varadkar, primeiro-ministro irlandês, deixou-o bem claro. “Há mérito em discutir a ideia de um período mais longo de transição, mas tal não pode ser uma alternativ­a ao ‘backstop’ da Irlanda.”

Bruxelas e Londres acordaram que o período de transição, durante o qual o Reino Unido continuará a aplicar as regras europeias e a contribuir para o orçamento, mas não participar­á na tomada de decisões, decorrerá até 31 de dezembro de 2020.

PRIORIDADE É “BACKSTOP”

Theresa May, primeira-ministra britânica, não poderia estar mais de acordo com Varadkar. Questionad­a sobre se aceitaria uma extensão do período de transição, como proposto por Michel Barnier, principal negociador comunitári­o, a governante reforçou que a prioridade é solucionar a questão do “backstop”. “Acredito que é possível encontrar uma solução para esse problema e, assim, alcançar um acordo global.”

No entanto, além dos engulhos nas conversaçõ­es com Bruxelas, May enfrenta forte contestaçã­o intramuros. Além da previsível – e cerrada – oposição do Partido Trabalhist­a, de Jeremy Corbyn, e de alguns setores dos colegas conservado­res, a líder do Executivo tem de gerir o desagrado dos norte-irlandeses do Partido Democrátic­o Unionista, que lhe garante a maioria na Câmara dos Comuns. E eleições antecipada­s neste momento são um risco tremendo para a primeira-ministra. Volta-se à questão da fronteira irlandesa...

De qualquer forma, e apesar do otimismo (aparente?) de May, Alemanha e, segundo o jornal inglês “The Guardian”, França estarão a preparar planos de contingênc­ia para um Brexit sem acordo, algo que muitos dos líderes reunidos em Bruxelas consideram já inevitável.

No Parlamento alemão, a chanceler, Angela Merkel, até admitiu acreditar que ainda existe uma possibilid­ade de concluir um bom acordo de saída do Reino Unido da União Europeia, “mas é evidente que um Governo responsáve­l olha para o futuro e prepara todos os cenários, incluindo o de um Brexit desordenad­o”.

MAIS DINHEIRO

O diário britânico aponta que o Executivo francês elaborou um documento que lhe permite introduzir novas medidas legais para evitar ou mitigar as consequênc­ias de uma saída sem acordo. Entre as premissas, inclui-se, por exemplo, a de os cidadãos britânicos virem a precisar de visto para entrar em França.

Alguns diplomatas alertam para um problema adicional de uma eventual extensão do período de transição. O Reino Unido teria de pagar muitos milhões mais à União Europeia e não teria qualquer palavra a dizer sobre a forma como aquele dinheiro seria gasto.

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Theresa May e Jean-Claude Juncker
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