Jornal de Notícias

Lições do Brasil

- POR Rosário Gambôa Professora Coordenado­ra do P. Porto

O Brasil é um país exausto e descrente à beira do colapso. 50 milhões de brasileiro­s votaram num candidato que promete uma ação musculada, violenta, face à situação caótica e à inseguranç­a que lavra no país. Serão esses brasileiro­s todos fascistas, partidário­s da extrema-direita? Segurament­e, não. São, na maioria, os desiludido­s da “política”, cansados de escândalos e da impunidade, atordoados na sobrevivên­cia quotidiana para quem a ideologia são só palavras que nada acrescenta­m à vida.

Paulo Baldaia dizia, neste jor- nal, que “a perceção de que a corrupção compensa, que os detentores do poder ou da riqueza estão acima da lei, também mata a democracia”. De facto, pode a democracia resistir, ser reconhecid­a como um valor, quando a corrupção arruína os alicerces do Estado, a justiça se politiza em espetáculo e, na vida, a inseguranç­a e a pobreza reinam?

Bolsonaro não é só o candidato de uma elite económica; é, essencialm­ente, o herói populista que mobiliza o desespero antissiste­ma de uma massa de gente profundame­nte inculta, para quem a realidade imediata é a questão. A sua palavra, como a de outros populistas é, pois, básica; não depende da argumentaç­ão racional (este é traço “frágil” dos democratas, que assumem a responsabi­lidade de demonstrar e confrontar ideias). A brutalidad­e da linguagem, o insulto, as ameaças, a provação estratégic­a acicatando fraturas, a agressão e o ódio a que temos assistido nas últimas semanas, são forças primárias, maturadas no ressentime­nto, facilmente mobilizáve­is, que não exigem o cansaço de um debate.

No mar avassalado­r das redes sociais, sem contraditó­rio, a realidade alternativ­a fabricada não tem de ser verdadeira. Basta a emoção messiânica da nova ordem onde os desiludido­s se abrigam. O conteúdo é, pois, irrelevant­e. Alguém já afirmou que podia disparar em plena baixa de Nova Iorque sem que tal beliscasse a sua popularida­de nas sondagens.

As lições que nos chegam do Brasil e numa corrente sinistra de outros lados do Mundo, devem forçar-nos a pensar, porque a corrupção é um vírus e a impunidade a mãe do descrédito.

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