Jornal de Notícias

Trabalho digno

- POR Ana Paula Laborinho Professora universitá­ria

2013 e 2014, a Organizaçã­o Internacio­nal do Trabalho (OIT) publicou vários estudos sobre os países europeus mais afetados pela crise internacio­nal, centrando a atenção na queda drástica do número e qualidade de postos de trabalho. Passados cinco anos, a OIT analisou a resposta à crise em Portugal, destacando a recuperaçã­o do mercado de trabalho, a diminuição das taxas de desemprego e o retorno à negociação coletiva. O relatório apresentad­o esta semana destaca os múltiplos fatores que impulsiona­ram estes resultados: desde a política monetária do BCE e o forte cresciment­o das economias dos parceiros comerciais, a fatores internos como a dinâmica das empresas exportador­as, a reestrutur­ação do setor público ou o rápido progresso dos níveis de escolarida­de e formação.

Existe um impacto positivo do emprego nas contas públicas, com menos subsídios de desemprego e mais contribuiç­ões para a Segurança Social. Também o aumento do salário mínimo tem servido para contrariar a ideia de uma competitiv­idade baseada em salários baixos, apostando-se na qualificaç­ão das pessoas.

Mas, como sublinha a OIT, Portugal não pode dormir à sombra dos louros conquistad­os: desemprega­dos de longa duração e jovens mantêm a dificuldad­e em aceder ao mercado de trabalho e o número de trabalhado­res precários é muito elevado. Além disso, continuamo­s a privilegia­r o trabalho intensivo em vez de um desempenho por objetivos: é ainda bem visto passar muitas horas no local de trabalho mesmo com baixa produtivid­ade. Basta o exemEm plo das empresas mais competitiv­as para confirmar que temos de investir em trabalho de qualidade, estruturad­o em resultados e capaz de conciliar vida profission­al e pessoal.

Arrastamos uma pesada herança de estereótip­os sobre trabalho e família. Nem há 50 anos, o livro da 1.a classe desenhava este quadro: “A única tristeza da nossa casa é que o meu pai não esteja sempre connosco, pois que trabalha todo o dia, longe de nós, para nos sustentar”. A família pobre, humilde, esforçada, o pai chega cansado da longa jornada, a mãe prepara o jantar.

O modelo social mudou e cada vez mais as famílias partilham responsabi­lidades, mas falta muito caminho para um trabalho digno, com trabalhado­res mais qualificad­os, menos precarieda­de e melhores salários. A trajetória de Portugal tem mostrado que existem alternativ­as para as crises, desde que as pessoas sejam colocadas em primeiro lugar.

Desemprega­dos de longa duração e jovens mantêm a dificuldad­e em aceder ao mercado de trabalho e o número de trabalhado­res precários é muito elevado

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