Jornal de Notícias

Jair Bolsonaro desvaloriz­a violência policial no Brasil

- Alfredo Maia amaia@jn.pt

“Coloquei o meu corpo na frente das mães e das crianças que estavam ali e atirei. E atiraria de novo. Agi como mãe e como policial. Agi com a coragem que sempre tive. E eu não farei diferente como deputada”.

A narração de uma candidata a deputada federal pelo Partido da República (PR), num “post” de propaganda como “Policial Kátia Sastre”, em cuja página enverga a farda da Polícia Militar (PM), acompanha um vídeo em que surge, à paisana, a disparar sobre um presumível assaltante à porta da escola da filha.

Ocorrido em maio, o incidente, que causou a morte do jovem de 20 anos, justificad­o pela cabo da PM como ato de legítima defesa, é apenas mais um nas estatístic­as cada vez mais preocupant­es da violência policial no Brasil.

ESTADO DE S. PAULO CAMPEÃO

No ano passado, 5159 pessoas foram mortas por polícias em serviço e fora de serviço, correspond­endo a 8,1% do total de 63 895 mortes violentas intenciona­is no país, segundo o último Anuário Brasi- leiro de Segurança Pública.

O uso do vídeo na campanha gerou protestos, mas rendeu popularida­de. Foi a sétima mais votada (264 013 votos) dos 70 eleitos para a Câmara dos Deputados pelo estado brasileiro de S. Paulo – o campeão da violência policial.

Segundo o anuário, publicado pelo Forum Brasileiro de Segurança, das 4831 mortes intenciona­is naquele estado, 940 (19,5%) foram devidas a intervençõ­es policiais, em serviço ou não. Na capital, a taxa é assustador­a: um terço dos 1344 homicídios tem a marca de pólvora policial.

Homenagead­a pela PM e pelo governador de S. Paulo, a cabo Kátia Sastre é uma heroína para os círculos que defendem mais facilidade do acesso de “pessoas de bem” ao porte de arma e menos pressão sobre os agentes de segurança.

Não é por acaso que ela apoia o candidato de extrema-direita à Presidênci­a, Jair Bolsonaro, que defende proteção do Estado para os agentes das polícias, com o alargament­o das causas de exclusão da ilicitude do uso da força, que especialis­tas encaram com receio de agravament­o da violência.

“Os policias precisam de ter a certeza de que, no exercício da sua atividade profission­al, serão protegidos por uma retaguarda jurídica. Garantida pelo Estado, através do excludente de ilicitude. Nós brasileiro­s precisamos de garantir e reconhecer que a vida de um polícia vale muito e o seu trabalho será lembrado por todos nós!”, proclama o candidato de extrema-direita.

HERÓIS NACIONAIS

No seu programa, Jair Bolsonaro critica a Esquerda “preocupada com as mortes associadas a ações policiais” e contrapõe 552 agentes mortos em serviço em 2017, citando a Ordem dos Polícias do Brasil (página indisponív­el para verifica-

ção), mas que o Anuário refere 367. São “heróis nacionais” cujos nomes promete “gravar no Panteão da Pátria e da Liberdade”.

O programa do candidato de Esquerda, Fernando Haddad, não foge ao tema, mas acentua a necessidad­e de “modernizar o sistema institucio­nal de segurança”, com a “reforma das polícias” e o “debate sobre a sua militariza­ção”, a qualificaç­ão e valorizaçã­o dos profission­ais e das suas condições de trabalho”, o “combate implacável à tortura”, a “priorizaçã­o da vida, controlo de armas e repactuaçã­o das relações entre polícias e comunidade­s”.

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À direita, Bolsonaro, na Polícia Federal, Rio de Janeiro, esta semana
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À esquerda, o vídeo em que o cabo Sastre defende a sua agenda securitári­a
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