O Fisco não tem alma
Há duas coisas que os portugueses podem ter como certas: que vão morrer e que, enquanto isso não acontece, terão algum encontro desagradável com o Fisco. A máquina coletora é o mais competente braço armado da Administração Pública. E quando isso acontece num país como Portugal, em que a cobrança de impostos se transformou numa resposta cultural dos governos à ausência de estratégias de longo prazo, há caminho aberto para os chamados expedientes criativos.
Veja-se a forma perversa como está a ser aplicado em Penafiel o chamado “imposto Mortágua”, o adicional ao IMI criado pela deputada do BE Mariana Mortágua que o Governo acolheu de braços abertos. O princípio à la “Robin dos Bosques” visava encontrar uma nova fonte de receita através de uma punição acrescida aos que são detentores de imóveis acima dos 600 mil euros. No fundo, castigando duplamente os ricos. No primeiro ano de vigência, os 200 mil contribuintes elegíveis engordaram os cofres do Estado em mais de 130 milhões de euros. Nada mau. Mas voltando a Penafiel: depois de, no ano passado, ter cobrado IMI ao património da Fábrica da Igreja Paroquial de Paço de Sousa, o Fisco decidiu agora sujeitá-lo ao pagamento do tal adicional. De que forma? Acrescentando às 12 “casas dos pobres” do padre Américo as salas de catequese e a casa paroquial, por forma a que, por junto, o valor do património superasse o limite mínimo a partir do qual as Finanças aplicam o novo golpe. Mas veja-se a forma como tudo foi feito: apesar de os dois edifícios que foram somados estarem, isoladamente, isentos de IMI, como entraram no bolo do património total, tornaram-se automaticamente candidatáveis ao novo imposto. Para quem anda à procura da lógica, desengane-se: o Fisco não se sujeita às suas regras. O Fisco não tem ideologia nem alma. Apenas uma missão. Doa a quem doer.