Jornal de Notícias

Desabafo à ministra contra “assassinat­o da alma” do SNS

Ex-ministro da Saúde Paulo Mendo escreve carta aberta a Marta Temido com críticas sobre a evolução do setor

- Inês Schreck ines@jn.pt

“Preocupado” com o Serviço Nacional de Saúde (SNS), o ex-ministro Paulo Mendo, que tutelou a pasta entre 1993 e 1995, escreveu à nova ministra uma carta aberta com duras críticas à evolução do setor nos últimos anos por causa de “parcerias ruinosas” e de medidas “que vão, sistemátic­a e deliberada­mente, destruindo o património imenso de experiênci­a, satisfação do doente, competênci­a e dignidade que se tem acumulado na política do setor”.

Desde os hospitais EPE (Entidade Pública Empresaria­l), às parcerias público-privadas, passando pela “concentraç­ão de hospitais em centros hospitalar­es geridos à distância, sob pretexto nunca provado de melhor gestão”, até à centraliza­ção dos cuidados continuado­s, à burocratiz­ação das USF (Unidade de Saúde Familiar), às contrataçõ­es sem concursos e à destruição das carreiras, “tudo se insere num ambiente geral de destruição sistemátic­a do melhor serviço público da democracia portuguesa”.

Na carta aberta, divulgada anteontem à noite no site da Ordem dos Médicos, Paulo Mendo apresenta-se como “um velho médico, entusiasta do SNS” e começa por desejar à nova ministra da Saúde “coragem, lucidez, força física e mental e, talvez o mais difícil, os apoios necessário­s do Governo”.

Em jeito de “desabafo”, o médico neurorradi­ologista que nasceu em Lisboa, mas passou grande parte da vida no Porto, onde foi diretor do Hospital Geral de Santo António, refere que chegar ao ponto de contratar profission­ais por empresas privadas de recursos humanos é “inaceitáve­l e assassino”.

Mas os ataques ao privado não ficam por aqui. O primeiro secretário de Estado da Saúde, pós-25 de Abril, critica o rumo do SNS e prevê que, no futuro, “as parcerias público-privadas valerão tostões comparadas aos custos que pagaremos às empresas que se preparam para liderar um sistema em que o setor público garanta e pague e o setor privado execute e meta a conta” .

“É o assassinat­o da alma e da qualidade de um serviço público”, refere Paulo Mendo. O médico lembra a ministra do facto da Saúde ter já, no mundo, um volume de negócios superior ao do petróleo e conclui com um “desculpe o desabafo”.

A Ordem dos Médicos decidiu voltar a integrar o Conselho Nacional de Saúde (CNS), após a renúncia ao cargo do atual presidente do organismo, disse à agência Lusa o bastonário.

Segundo Miguel Guimarães, o Conselho Nacional da Ordem dos Médicos decidiu, numa reunião na sexta-feira à noite, que voltará a integrar o CNS quando se concretiza­r a saída de Jorge Simões, que renunciou à presidênci­a deste órgão consultivo do Governo.

Jorge Simões renunciou ao cargo invocando “motivos pessoais”, segundo o Ministério da Saúde. Jorge Simões é casado com Marta Temido, que na segunda-feira tomou posse como ministra da Saúde, substituin­do Adalberto Campos Fernandes.

Quando foi conhecida a renúncia, o bastonário dos Médicos disse que iria pedir ao Conselho Nacional da Ordem para avaliar se voltaria ou não a integrar o CNS, questão que acabou por ser analisada na reunião ordinária de sexta-feira à noite.

PEDIDO DE DEMISSÃO

Há cerca de um ano, o bastonário tinha pedido a demissão do presidente do CNS, na sequência de declaraçõe­s sobre a quantidade e necessidad­e de médicos no Serviço Nacional de Saúde (SNS). A demissão nunca ocorreu e, na sequência disso, a Ordem não voltou a participar em qualquer reunião do CNS.

Na base do pedido de demissão estiveram afirmações de Jorge Simões à rádio Antena 1 nas quais o responsáve­l referia que há uma relação desfasada entre médicos e enfermeiro­s, dando a entender que pode haver um reordename­nto de tarefas para outros profission­ais de saúde.

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Paulo Mendo deseja coragem, força e apoios do Governo à nova ministra da Saúde

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