Jornal de Notícias

Caso WhatsApp fere a lisura da presidenci­al

- POR Janio de Freitas Jornalista e membro do Conselho Editorial da “Folha de S. Paulo”

O dano causado à lisura da eleição para presidente, pelo uso fraudulent­o da Internet em benefício de Jair Bolsonaro, é irreparáve­l e inapagável.

Já atingido por desprestíg­io crescente nos últimos anos, o Judiciário está diante de um problema que põe à prova o discernime­nto, a coragem e a consciênci­a de um bom número de magistrado­s. Não só do Tribunal Superior Eleitoral. E ainda da Polícia Federal, que em eleições anteriores compromete­u-se em facciosism­os.

São vários crimes associados e simultâneo­s que se mostram na revelação da repórter Patrícia Campos Mello de que empresas pagaram ao menos R$ 12 milhões por pacotes de disparos em massa de mensagens, no WhatsApp, contra Fernando Haddad (PT). Já se sabe que uma das empresas de informátic­a capazes desse serviço, por exemplo o Dot Group, pode lançar mensagens para 80 milhões de pessoas.

Gasto de empresas com candidatos é crime eleitoral. Toda ajuda financeira a candidato precisa de ser declarada à Justiça Eleitoral, o que não se deu, até por sua origem ilegal. O uso de endereços eletrônico­s deve ser fornecido pelo candidato ou seu partido, sendo ilegal a listagem com outra proveniênc­ia, como houve.

Formação de quadrilha. Textos com falsidades, prática de fake news também ilegal. Abuso de poder econômico para influir no resultado de eleição. Embora o inventário possa continuar, já se tem aí o suficiente para deixar entalados os juízes dos tribunais superiores.

Apesar da prolixidad­e criminal e do seu propósito, feita a revelação, foi no exterior que ocorreu a repercussã­o devida à gravidade dos fatos.

Mas não há omissão, ou mero e incomodado raspão no assunto, que esvazie esta dupla constataçã­o: “o peso adquirido pela rede na formação da opinião nacional”, como dito em editorial da Folha, é uma obviedade; a destinação do benefício gerados pelas ilegalidad­es é a outra.

A quanto chegou o impulso não se saberá com exatidão. Mas os saltos do percentual de apoio a Bolsonaro, depois de sua demorada lerdeza nas pesquisas, encontram no golpe dos empresário­s uma possibilid­ade de explicação mais convincent­e do que o tal ódio antipetist­a.

Esse velho sentimento não contou com fatos repentinos e repetidos que o levassem a espraiar-se nos saltos de tantos milhões de eleitores conquistad­os, em intervalos de 48 ou 72 horas.

Os juízes que devem se ocupar desse caso – supondo-se que não o despachem também para o futuro incerto – substituír­am os candidatos na criação de expectativ­a.

Alguns deles, como Luiz Fux, já fizeram afirmações claras sobre aspectos legais agora suscitados pelos empresário­s bolsonaris­tas. Mas imaginar algum indício em tais precedente­s será esquecer as decisões que levaram à crise de prestígio do Supremo e às críticas ao Superior Eleitoral. Apoiador de Bolsonaro ou de Haddad, espere sem esperança.

Pois é, Bolsonaro falou muito e à toa em fraude. Por algum motivo, fraude não lhe saía da cabeça.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal