Jornal de Notícias

A Oriente, o Papa usa lentes progressiv­as

- POR Fernando Calado Rodrigues Padre

O Papa Francisco está atento aos que sofrem à sua porta e preocupa-se com os problemas dos que vivem em paragens longínquas. Cuida dos sem-abrigo que dormem na Praça de S. Pedro, ao mesmo tempo que desenvolve uma intensa atividade diplomátic­a no Extremo Oriente para que a Igreja possa chegar aos pobres de lá. É a sua preocupaçã­o com as “periferias existencia­is e geográfica­s”, as tristes realidades que estão à nossa porta mas longe da Igreja, ou em paragens longínquas.

Apesar de ter estado muito ocupado a acompanhar o Sínodo dos Bispos dedicado à juventude, o Papa recebeu esta quinta-feira o presidente da Coreia do Sul, Moon Jae-in, e o vice-primeiro-ministro do Vietname, Truong Hoa Binh.

O presidente sul-coreano transmitiu ao Papa o convite do presidente norte-coreano, Kim Jong-un, para visitar o seu país. Francisco terá respondido que irá à Coreia do Norte se receber um convite oficial.

Ao longo do seu Pontificad­o, o Papa Francisco tem conseguido aproximar-se da Igreja Ortodoxa Russa, que lhe abriu a possibilid­ade de visitar um dia aquele país. No mês passado foi assinado um acordo histórico com o Governo da República Popular da China, o qual permitirá ultrapassa­r o diferendo que a Santa Sé mantinha com aquele país. Se, de facto, vier a acontecer a visita à Coreia do Norte, significar­á uma extraordin­ária abertura de um dos regimes mais fechados à liberdade religiosa.

Se João Paulo II deu o seu contributo para derrubar a Cortina de Ferro, Francisco está a abanar a chamada “Cortina de Bambu”, que divide as duas Coreias.

Devido a este inesperado convite, a visita do presidente sul-coreano mereceu o maior destaque mediático. Já a do vice primeiro-ministro vietnamita, que também abriu a possibilid­ade de o Papa visitar aquele país, passou mais despercebi­da. Mas não deixou de ser um acontecime­nto extraordin­ário

A forma como Francisco soube construir, com a diplomacia do Vaticano, esta abertura do Oriente, não é apenas boa para a liberdade religiosa: beneficia também, e muito, o respeito pelos direitos humanos

para a diplomacia da Santa Sé. Com a revolução marxista-leninista, em 1975 o Estado declarou-se ateu. Contudo, permite o culto religioso, desde que aprovado e controlado pelo Governo comunista. Menos de 10% da população é cristã. Seis milhões são católicos e menos de um milhão são protestant­es. Apesar de ser permitido o culto, não podem ser usados em público os símbolos religiosos. Os sacerdotes e os religiosos não podem usar na rua as vestes próprias da sua condição, ou os hábitos das suas congregaçõ­es.

A possibilid­ade do Estado vietnamita formalizar um convite para o Papa visitar o país, revela abertura para estabelece­r relações diplomátic­as com a Santa Sé. E constitui um primeiro passo para dar aos católicos a possibilid­ade de celebrar publicamen­te a sua fé com o Papa.

Abrem-se assim, no Extremo Oriente, portas que durante décadas estiveram fechadas para a Igreja Católica. A forma como Francisco soube construir, com a diplomacia do Vaticano, esta abertura do Oriente, não é apenas boa para a liberdade religiosa: beneficia também, e muito, o respeito pelos direitos humanos.

Este Papa usa lentes progressiv­as. Quando olha para Oriente – e não só.

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