Jornal de Notícias

Adolescent­e foi raptada na Nigéria e obrigada a prostituir-se no Porto

Rede vendeu jovem a mulher que a ameaçava com maldições

- Alexandre Panda alexandre.panda@jn.pt

Tinha 16 anos quando, a caminho da escola, em Benin City, na Nigéria, foi raptada por uma rede que viria a colocá-la na prostituiç­ão nas ruas do Porto, de onde foi resgatada. Antes, passou pelo inferno. No deserto líbio, onde foi violada várias vezes, numa ilha da Sicília e ainda em Roma, Itália, onde foi drogada. O Serviço de Estrangeir­os e Fronteiras (SEF) acabaria por prender a mulher que a obrigava a prostituir-se no Porto, mas o tribunal libertou-a (ver caixa) e ela fugiu continuand­o em parte incerta. O Ministério Público acusou-a, agora, de tráfico de pessoas.

A jovem tem hoje 19 anos e ainda vive em Portugal, onde, durante dez dias, teve de prostituir-se por conta de uma mulher, também nigeriana, a quem entregava todo o dinheiro que ganhava. Antes de ser resgatada, nos dias que passou em cativeiro, escondida numa cave, foi despojada de cerca de 1500 euros. Era ameaçada com rituais mágicos (vudu) e maldições, envolvendo fígado cru, álcool e rezas.

Foi a 11 de fevereiro de 2016 que a jovem foi raptada por um grupo de indivíduos de origem africana, mas que falavam inglês. Ficou sem documentos e bens. Da zona de Benin City foi levada para outra região da Nigéria e dali seguiu para a Líbia, com outras 20 mulheres, com idades entre 16 e 30 anos. Naquele país foi violada várias vezes e sempre mantida em cativeiro até ser colocada num barco que a levou até perto da Sicília, Itália, onde foi resgatada por uma embarcação da Marinha italiana. As autoridade­s recolheram-lhe as impressões digitais e fotografar­am-na, para que ficasse registada. Foi então coloca- da num campo de refugiados, onde lhe deram documentos e um telemóvel.

Mas o seu tormento estava longe de ter terminado. Num dia em que tinha sido autorizada a sair do campo foi abordada, junto à estação de caminhos de ferro local por dois homens que, muito provavelme­nte, a vigiavam. Forçada a entrar num comboio, ainda tentou pedir ajuda a passageiro­s, mas sem sucesso. Não sabia para onde ia e insistia com os raptores que queria voltar ao campo de refugiados. Prometeram que a levariam para lá, mas só depois de ir a Roma, onde era suposto arranjarem-lhe documentos para poder viver na Europa.

DROGADA PARA APANHAR VOO

Afinal, acabaria sequestrad­a num apartament­o da capital italiana, onde foi drogada, levada para outro comboio e depois para um aeroporto. Na alfândega, um dos raptores exibiu os documentos originais da menor, os mesmos que lhe tinham sido roubados na Nigéria. Dali, voou, sempre tonta e desorienta­da devida à droga, até ao Porto. Estávamos em outubro de 2016.

Foi numa estação de metro da cidade que a vítima foi entregue à mulher. Levou-a para uma casa, onde ficaria em cativeiro e onde, para a amedrontar, a sujeitaram a rituais de “vudu”. Para que a maldição não recaísse sobre si, tinha de entregar o dinheiro que recebia à arguida e chamar-lhe “Mamá”.

Se fosse apanhada a prostituir-se na rua deveria dizer à Polícia que o fazia por passar fome e que tinha mais de 18 anos. Acabou por ser detetada por uma patrulha da PSP, que a entregou ao SEF. A investigaç­ão desvendou todo o circuito de tráfico de pessoas. Hoje, a jovem está numa instituiçã­o, sob proteção.

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