Jornal de Notícias

Sentam-se à máquina e vestem crianças pobres

Mosteirô tornou-se um centro de costura para ajudar quem nunca estreou uma peça de roupa, pelo Mundo fora. E assim regressam as antigas modistas

- Catarina Silva locais@jn.pt

Foram modistas noutros tempos, algumas até já tinham as máquinas de costura encostadas. Limparam-lhes o pó e carregaram-nas para o salão paroquial de Mosteirô, na Feira, para costurar um dia inteiro, sem parar, vestidos e calções para crianças carenciada­s. Este é um dos 20 ateliês solidários em Portugal do projeto “Dress a girl around the World”. Em Mosteirô, chega a reunir 70 mulheres. Só neste sábado costuraram 93 vestidos e 269 calções.

Rosa Santos tem 63 anos e foi costureira a vida toda. Hoje, já só faz bainhas, fechos e pequenos consertos e foi uma das primeiras pessoas que Virgínia Familiar, responsáve­l por trazer o projeto para Mosteirô, contactou quando quis criar ali um dos ateliês que há no país.

“Tomei conhecimen­to do projeto quando estive a trabalhar em Palmela. E percebi que podia resultar em Mosteirô, porque há muitas antigas modistas cá”, explica Virgínia, que nunca imaginou as proporções que o projeto ia ganhar. Um ano depois, junta desde costureira­s mais velhas às mais jovens, de todo o lado, e até quem não sabe costurar está convidado: há tecidos para cortar, vestidos para engomar, elásticos para meter.

DUAS VANTAGENS

Encontram-se algumas vezes por ano e Virgínia explica o objetivo: “Levar roupa a crianças carenciada­s que nunca puderam estrear uma peça e retirar da solidão uma geração em que todas as mulheres costuravam para voltarem a coser”.

Os vestidos e calções chegam a crianças de todo o Mundo, incluindo Portugal, pelas mãos de organizaçõ­es não-governamen­tais parceiras. Vão para instituiçõ­es, orfanatos, escolas, a maioria de Angola e Moçambique. Rosa já teve oportunida­de de ver uma criança com o seu vestido em fotografia­s. “Ver o sorriso delas é uma sensação maravilhos­a”, refere.

Alice Maceda tem 82 anos e passa o dia agarrada ao ferro de engomar, porque não sabe costurar. “Estou sozinha em casa e já não me lembrava de estar com tanta gente”, diz. Foi a todos os eventos, ao contrário de Sandra Andrade, 37 anos, que estava lá pela primeira vez: “Não sei costurar e já aprendi a utilizar uma tesoura de cortar pontas e um passador de fitas”.

UM HOMEM AFINADOR

Uma das voluntária­s até leva máquinas de costura para quem não tem. Às vezes, recebem voluntário­s homens, como um afinador de máquinas de costura.

Não aceitam donativos em dinheiro, só em metros de elástico, tecidos, tesouras e tudo o que tenha a ver com costura. Recentemen­te, receberam 100 quilos de material. A nível nacional, o projeto que chegou em 2016 já entregou 17 mil vestidos e sete mil calções a crianças de 21 países. “Era a filha mais velha e a minha mãe pôs-me na costura. Aqui costuramos o dia inteiro e é um gosto ver as crianças com a roupinha” “Levamos roupa a crianças que nunca estrearam peças e retiramos da solidão uma geração que sempre costurou”

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Dezenas de voluntária­s asseguram as diversas etapas da arte de costurar
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Responsáve­l
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