A festa atlântica de Dino D’Santiago
“Mundu Nôbu” é África contemporânea e digital, espalhada pelo globo
O terceiro álbum por conta própria de Dino D’Santiago tem funaná, morna, batuku, quizomba, mas nenhum destes idiomas com fundações em África adquire a primazia em “Mundu Nôbu”. São, antes, parceiros de viagem, peças de um admirável ciclo de dez canções registado em três continentes e cinco locais (Santiago de Cabo Verde, Lisboa, Berlim, Londres, Nova Iorque), com coprodução executiva de Dino D’Santiago e Kalaf Epalanga e produção do britânico Seiji.
Há coros saídos da mesma árvore do gospel e uma profusão de outras vozes a cruzar os céus logo desde a abertura com o tema-título, a par de um crescendo orquestral. A produção de “Mundu Nôbu” é subtil mas tem um corpo definitivamente eletrónico, muitas vezes evocando um ambiente de EDM a que foi removido o colete de compressão rítmico. Em “Nova Lisboa”, esse efeito de anulação parece estender-se ao tropical house.
À exceção da última faixa, a mais atarefada “Fidju Poilon”, as canções deste álbum só perturbam o silêncio no momento e sob as formas estritamente necessárias, um exercício de depuração e transparência fascinante, num tempo em que a tentação da algazarra é enorme. Um método excepcionalmente bem concretizado em “Sô Bô”, pedaço de soul etérea a pairar em tapete digital.
Alojada a meio do alinhamento e certamente de propósito, “Africa di Nôs” soa ao epicentro da narrativa de “Mundu Nôbu”. É um canto que parece dorido e espiritual, rodeado de sonoplastia agreste, metálica, e pousado na ondulação de um Atlântico negro – não sendo alucinação imaginar, neste contexto, a influência das teorias em redor da escravatura, migração e diáspora expostas pelo escritor Paul Gilroy em “The Black Atlantic: Modernity and Double Consciousness”.
Candidato seríssimo a melhor álbum nacional de 2018, “Mundu Nôbu” é apresentado no sábado, dia 27, no Hard Club, no Porto, integrado na noite Enchufada na Zona (com extensão ao clube Maus Hábitos). Além de Dino D’Santiago, haverá concertos e DJ sets de Branko, iZem, PEDRO, Rastronaut e Progressivu.
Dino D’Santiago
MUNDU NÔBU 2018