Caixa negra revela falhas graves de comunicação
Registos da Proteção Civil confirmam que posto de comando esteve incontactável Gafe de Passos Coelho abre guerra política
Populações cercadas pelo fogo, bombeiros sem combustível a precisar de ajuda e o comando operacional do incêndio de Pedrógão incontactável. O presidente da Autoridade Nacional da Proteção Civil (ANPC) enviou ontem ao primeiro-ministro a cronologia das ações que ficaram registadas no Sistema de Apoio à Decisão Operacional (SADO) – uma espécie de “caixa negra” da Proteção Civil – durante o combate às chamas que mataram 64 pessoas. Há pelo menos dez momentos em que os contactos falharam.
No documento, assinado por Joaquim Leitão, são transcritos os passos seguidos nos primeiros dois dias do fogo, sendo que há espaços de horas sem registo de quaisquer comunicações ou decisões tomadas. A “cronologia” arranca às 19.45 horas de sábado, dia 17 – no final da tarde em que as chamas deflagraram e em que terão começado os problemas no Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal (SIRESP).
Foi recebida uma comunicação do 112 a dar conta de que três pessoas, naturais da zona do Porto, se encontravam numa casa abandonada na aldeia de Casalinho, em Pedrógão. Pediram ajuda por estarem cercadas por chamas e sem conseguir escapar. No entanto, e de acordo com o que ficou registado no SADO, a informação não
IGAI tem agora 30 dias para apresentar conclusões à ministra
foi repassada. “Tentámos contacto com o posto de comando e com o 2.º CODIS [comandante operacional distrital] sem sucesso”, lêse na transcrição. O documento mostra igualmente como até a rede ROB, usada pelos bombeiros e que permitiu colmatar as falhas do SIRESP, também falhou ao segundo dia.
Ministra pede estudo e auditoria
A ministra da Administração Interna exigiu, ao início da noite de ontem, “respostas rigorosas” da Secretaria-Geral da Administração Interna, gestora do SIRESP, ao “cumprimento das obrigações legal e contratualmente estabelecidas”. Para isso, ordenou uma investigação à Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI). O objetivo é averiguar se todas as regras foram cumpridas no que diz respeito à “manutenção e fiscalização” da rede. As conclusões terão de ser conhecidas em 30 dias.
Depois de o primeiro-ministro, António Costa, ter pedido à ministra, na última sexta-feira, um “cabal esclarecimento” às falhas na rede de comunicações no incêndio, Constança Urbano de Sousa decidiu ainda pedir ao Instituto de Telecomunicações um “estudo independente” sobre o funcionamento do SIRESP – em “geral” e em “situações de acidente grave ou catástrofe”. Ontem, Costa disse que “nada poderá ficar por esclarecer”, estando ainda a aguardar as respostas pedidas pela ministra à empresa SIRESP.