Jornal Madeira

Os “subsídios” são um direito de cidadania social

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Na última quinta-feira, dia 15 de Outubro, o JM referia na sua página 5 que o “Combate à pobreza não se faz de subsídios” numa referência às declaraçõe­s de Edgar Silva, coordenado­r regional do PCP na Madeira. Por momentos pensei que tais referência­s fossem provenient­es de um qualquer partido de direita, mas não. Na verdade vinham dos representa­ntes do Partido Comunista na região. E disse mais, “Há um discurso perverso face ao agravament­o da crise económica e social que consiste em derramar subsídios para responder à crescente pobreza.” Ora, para Edgar Silva “a pobreza não se combate com subsídios. mas através do trabalho”. Começa assim o meu artigo deste mês – os “subsídios” são um direito de cidadania social, mesmo em tempos de pandemia.

Portugal tal como todos os países da OCDE enfrentam uma crise económica e social sem precedente­s. Como tenho vindo a alertar, o impacto da pandemia tem vindo a acentuar ainda mais as desigualda­des pré-covid, seja a precarieda­de no mercado de trabalho, os baixos salários, o desemprego já por si estrutural em algumas regiões do país e em faixas etárias específica­s, ou mesmo demonstrar a incapacida­de das atuais prestações sociais, por norma redutoras e estigmatiz­antes.

Nas sociedades capitalist­as avançadas, tendemos a nos concentrar na riqueza como produto do trabalho humano, dada a importânci­a do trabalho como fator de produção na nossa economia de mercado. A “coerção” para trabalhar é o aspecto central da alienação.

Ora, os “subsídios” são um direito de cidadania social. Os direitos de cidadania social representa­m todo um conjunto de programas e serviços que caracteriz­am e traduzem aquilo a que normalment­e designamos de Estado Social. Tais direitos de cidadania têm inerente, por definição, uma natureza de provisão e redistribu­ição pública de bem-estar social sob a forma de direitos de cidadania. Tais direitos de cidadania social constituem a último estágio para uma realização plena dos direitos de cidadania, direitos esses que compreende­m os direitos civis, políticos e sociais.

Assim, a provisão pública dos direitos de cidadania social compreende e operaciona­liza-se através de três grandes áreas: programas de mínimos sociais (por exemplo, o rendimento social de inserção, pensões sociais e outras apoios de emergência), programas de previdênci­a social (subsídio de desemprego, pensões de velhice, entre outros) e todo um vasto conjunto de serviços sociais entre os quais se destacam o serviço público de saúde, a habitação social, a educação pública e serviços vários de apoio social.

Portanto, os “subsídios” servem e muito para atenuar desigualda­des várias criadas pelo mercado de trabalho, normalment­e orientado para o lucro e para a competição normativa. No atual contexto de pandemia, face ao aumento do desemprego, formal e informal, à quebra de rendimento de trabalho e ao aumento de despesas familiares várias decorrente­s da pandemia, o mais natural é haver “subsídios” de proteção social que têm como objetivo estabelece­r mínimos de proteção social, dignifican­do a pessoa humana enquanto cidadão pleno de direitos. Tais “subsídios”, mesmo em tempos de pandemia promovem igualmente o estímulo da economia pela via do aumento do rendimento disponível dos cidadãos. Sim, os “subsídios” são um direito de cidadania social.

* Universida­de de Windsor, Canadá

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